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A Fundação SOS Mata Atlântica é uma entidade privada, sem vínculos partidários ou religiosos e sem ns lucrativos, que tem como missão promover a conservação da diversidade biológica e cultural do Bioma Mata Atlântica e ecossistemas sob sua in�uência, estimulando ações para o desenvolvimento sustentável, bem como promover a educação e o conhecimento sobre a Mata Atlântica, mobilizando, capacitando e estimulando o exercício da cidadania socioambiental.

Fundada em setembro de 1986, a SOS Mata Atlântica possui um corpo de prossionais trabalhando em projetos de educação ambiental e mobilização, recursos hídricos, monitoramento da cobertura �orestal da Mata Atlântica por imagens de satélite, produção e plantio de mudas de espécies nativas, políticas públicas, aprimoramento da legislação ambiental, denúncia contra agressões ao meio ambiente, apoio à criação e gestão de unidades de conservação públicas e privadas, entre outros.

Para o desenvolvimento do seu Programa de Ação, a SOS Mata Atlântica é sustentada pela contribuição de cerca de 350 mil membros liados e por apoios, parcerias e patrocínios de empresas privadas, órgãos governamentais, instituições de ensino e pesquisa, entidades e agências nacionais e internacionais. Tem como órgão deliberativo o Conselho Administrativo e possui também um Conselho Consultivo, um Conselho Fiscal e um Conselho Colaborador, todos estes formados por representantes de segmentos signicativos da sociedade.

FUNDAÇÃO SOS MATA ATLÂNTICAAvenida Paulista, 2073, Conjunto NacionalTorre Horsa 1 – 13o andar, cj 138001311-300 – São Paulo, SP.Email: [email protected] www.sosma.org.br/blog www.twitter.com/sosma www.facebook.com/SOSMataAtlantica

CONSELHO ADMINISTRATIVOPresidente Roberto Luiz Leme KlabinVice-Presidente Pedro Luiz Barreiros Passos

Bianka Van Hoegaerden, Clarice Herzog, Clayton Ferreira Lino, Gustavo Martinelli, José Olympio da Veiga Pereira, José Renato Nalini, Morris Safdie, Patrícia Palumbo, Paulo Nogueira-Neto, Pedro Leitão Filho, Plinio Bocchino, Roberto Oliveira de Lima e Sonia Racy.

PRESIDENTERoberto Luiz Leme Klabin

DIRETORIASGestão do Conhecimento Marcia HirotaPolíticas Públicas Mario Cesar MantovaniAdministrativa/Financeira Olavo Garrido

GERÊNCIAComunicação Afra Balazina

DEPARTAMENTOSDocumentação Andrea Godoy HerreraEventos Joice VeigaFinanceiro Luciana MikamiLoja Virtual Jorge YagimaTecnologia da Informação Kleber Santana

PROGRAMASMobilização e Voluntariado Beloyanis MonteiroPrograma Costa Atlântica Camila K. TakahashiProjeto Itinerante Romilda RoncattiRede das Águas Maria Luiza RibeiroRestauração Florestal Ludmila P. de Siqueira, Rafael B. Fernandes e Aretha MedinaRPPN Mata Atlântica Mariana Machado

CAPTAÇÃO DE RECURSOSAdauto Basílio e Thiago Massagardi

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Andrea VialliCOORDENAÇÃO DA SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA

Marcia Hirota

COORDENAÇÃO EDITORIALMaura Campanili

São Paulo, dezembro de 2012.

SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICAvolume 2

O azul daMata Atlântica

Programas para conservação do mar e da costa brasileira

Com ensaio fotográ�co de

Luciano Candisani

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Ficha catalográca: Andrea Godoy Herrera CRB 8/6589

Vialli, AndreaV653a

O azul da Mata Atlântica: programas para conservação do mar e da costa brasileira / Andrea Vialli; ilustrações de Graziella Mattar; ensaio fotográco de Luciano Candisani. -- São Paulo : Fundação SOS Mata Atlântica, 2012.

176 p. : il., fotos; 14 x 19,4cm. ISBN 978-85-98946-11-5

1. Zona costeira - Brasil 2. Terceiro setor I. Vialli, Andrea II. Candisani, Luciano III. Título

© Série SOS Mata Atlântica – Volume 2O azul da Mata AtlânticaProgramas para conservação do mar e da costa brasileira

Coordenação da Série SOS Mata AtlânticaMarcia Hirota

Coordenação editorialMaura Campanili

Reportagem e textoAndrea Vialli

ColaboraçãoAdauto Basílio, Afra Balazina, Andrea Herrera, Camila Keiko Takahashi, Fabio dos Santos Motta, Leandra Gonçalves, Marcos Rosa, Olavo Garrido, Roberto Klabin e Viviane Mazin.

Fotos cedidas por:Adriana de Oliveira, Alberto Alves Campos, André Dias, Andrea Godoy Herrera, Antonio Henrique, APA Guapimirim, Carlos Eduardo Leite Ferreira, Carlos Maia, Cesar Musso, Clayton Lino, Fausto Pires de Campos, Hudson T. Pinheiro, Instituto Vidamar, Joel Creed, Lemuel Santos Rex, Léo Francine, Mario Haberfeld, Nílber Gonçalves da Silva, Pró-Mar, Projeto Tamar, R. J. V. Alves, Thiago J. F. Costa, www.cagarras.com.br.

MapasArcPlan

Pesquisa e seleção de fotosAndrea Godoy Herrera

Projeto grá�co e diagramaçãoAna Cristina Silveira / AnaCê Design

IlustraçõesGraziella Mattar

CapaAna Cristina Silveira com ilustração de Graziella Mattar

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Sumário

Fundo Pró-Unidades de Conservação Marinhas 753

O desa�o de proteger o mar 151

116ENSAIO FOTOGRÁFICO

Atol das Rocas: onde tudo começou 994

O Programa Costa Atlântica: hora de agir 292

Mar a vista! 1575

7Apresentação

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Praia de Guaratuba, Bertioga (SP). © Fabio Colombini

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7SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

O Brasil nasceu na costa. Com 8.500 quilômetros de litoral, o processo de ocupação e coloni-zação do país se deu à beira-mar, e prossegue

hoje. Os municípios da zona costeira abrigam 26,9% da população brasileira, o equivalente a 50,7 milhões de pessoas. E é nas proximidades do mar que mais de 133 milhões de brasileiros 1 vivem, trabalham, descansam, se alimentam e se divertem.

Mas é também perto do mar que as grandes pres-sões sobre os ecossistemas marinhos se revelam. O des-carte indiscriminado de lixo e esgoto, a especulação imobiliária que avança sobre as áreas de restinga e man-guezais, o turismo desordenado, a pesca predatória que ameaça espécies de peixes e crustáceos são alguns dos fatores de pressão e tensão que todos os dias se impõem à sobrevivência do mar. Resiliente, a vida marinha se re-nova, mas não basta deixá-la à própria sorte. Os mesmos engenhos e conhecimento humano que ameaçam os ma-res também podem ser usados para fins de conservação. E há, no Brasil, muita gente trabalhando em prol do mar.

Essa publicação vai contar histórias de gente que se dedica a cuidar do mar. E como a sociedade, organiza-da em parcerias, pode se mobilizar para proteger nossas zonas Costeira e Marinha, fragilizadas pelas incontáveis pressões a que são diariamente submetidas.

A Fundação SOS Mata Atlântica é parte desse mo-vimento. Aos 26 anos, a organização já coleciona histó-rias bem sucedidas de mobilização em prol do litoral e dos ambientes costeiros no Brasil – afinal, seu escopo de

Apresentação

1. Cerca de 70% da população brasileira vive na faixa situada a até 200 km do litoral, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

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8 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

atuação é o bioma que abrange boa parte do litoral do Brasil e por esse motivo é chamada de Mata Atlântica.

Nos últimos anos, a SOS Mata Atlântica se enga-jou em uma inteligente articulação para apoiar pesqui-sas, manter e fortalecer UCs 2 na costa brasileira. Um esforço que reúne pessoas, organizações e movimentos socioambientais, cientistas, governo e iniciativa privada para proteger nossa costa, os ecossistemas marinhos e as comunidades que vivem nessas regiões. O Programa Costa Atlântica 3 , criado em 2006, é um exemplo des-sa articulação. As principais atividades do programa são fortalecimento do Snuc 4 e da gestão integrada desses ecossistemas, com a participação da sociedade civil or-ganizada e de parceiros locais. Outra vertente é o apoio a projetos de conservação, atividades, pesquisas e diagnós-ticos; formação e treinamento de pessoas e promoção de campanhas de mobilização e divulgação.

Desde o início das atividades do Programa Costa Atlântica, foram mobilizados milhões de reais 5 em re-cursos para apoiar projetos e fortalecer a gestão das UCs. Mecanismos financeiros arrojados, como fundos patrimo-niais ou de perpetuidade (endowment fund), dão longevi-dade e sustentabilidade às doações efetuadas por pessoas físicas e empresas. Ao mesmo tempo, a parceria e o apoio a entidades governamentais como o ICMBio 6 ajudam a definir áreas prioritárias para a atuação dos programas. Uma dessas experiências, apresentada neste livro, é o caso da Reserva Biológica do Atol das Rocas, modelo que já inspirou iniciativas semelhantes em novas UCs marinhas.

Mas é preciso fazer mais pelo mar. E é essa a es-tratégia de atuação que vai permear o trabalho da SOS Mata Atlântica nos próximos anos. Nas palavras de Ro-berto Klabin, um dos fundadores e atual presidente da Fundação, a sociedade vive de costas para o mar, sem saber sua importância e sem ter conhecimento de sua riqueza e abundância de vida. Há uma visão utilitária sobre o mar, que precisa urgentemente ser revista. O mar não é apenas o local de lazer de muitas famílias e onde

2. Unidades de conservação.

3. Desde 2006, o Programa Costa Atlântica é uma das frentes de atuação da SOS Mata Atlântica e contribui com o desenvolvimento sustentável e a manutenção do equilíbrio ambiental das zonas Costeira e Marinha sob influência do bioma, incluindo também a conservação dos patrimônios naturais, biológicos, históricos e culturais existentes nessas regiões.

4. Sistema Nacional de Unidades de Conservação: Lei Federal no 9.985, de 2000.

5. Ver O Programa Costa Atlântica, pág. 29.

6. Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade.

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9SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

pescamos nosso peixe, tampouco um depositário do lixo e esgoto produzidos por nosso atual estilo de vida.

Garantir a proteção do mar é um desafio interna-cional. Esse foi um dos pontos de forte discussão durante a Rio+20, a Conferência das Nações Unidas para o De-senvolvimento Sustentável, realizada em junho de 2012. A expectativa era que no encontro, que reuniu mais de 100 chefes de Estado e de governo e 50 mil visitantes no Rio de Janeiro, fossem criadas as bases para um acordo inter-nacional com o objetivo de garantir a implementação de uma rede de áreas protegidas em águas internacionais. A expectativa em torno das discussões era tão forte que a imprensa chegou a noticiar que a Rio+20 tinha grandes chances de ficar conhecida como a “Cúpula dos Mares” – um paralelo interessante com a Rio-92, que ficou mun-dialmente conhecida como a “Cúpula da Terra”.

Infelizmente, as expectativas em relação à proteção dos oceanos não se concretizaram na Rio+20. O texto final da conferência, “O Futuro Que Queremos”, endossado pelos 193 países-membros da ONU, resultou enfraquecido de propostas concretas no que tange à proteção interna-cional dos oceanos. A decisão sobre a criação de uma rede de proteção das águas internacionais foi adiada para 2015 e a governança dessa questão ficará a cargo da Assembleia Geral da ONU. “O documento final da Rio+20 trouxe o reconhecimento da importância da questão, mas deixou de lado o plano de ação. A esperança acabou morrendo na praia”, destaca Leandra Gonçalves, ex-coordenadora, atual consultora do Programa Costa Atlântica.

Para justificar a falta de ação concreta dos países em relação à proteção dos oceanos, os países utilizam como desculpa a crise financeira internacional. Entre-tanto, um estudo publicado pelo Banco Mundial e pela FAO (órgão da ONU para a agricultura e alimentação), em 2008, demonstrou que as perdas ocasionadas pela so-brepesca chegam a US$ 50 bilhões por ano. Segundo o mesmo relatório, a melhoria na governança dos oceanos poderia amortizar uma parte considerável dessas perdas

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10 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

econômicas, gerar empregos e assegurar a continuidade dos serviços ambientais prestados pelos oceanos, como a produção do oxigênio que nos mantém vivos.

O Brasil, signatário da Convenção da ONU sobre o Direito do Mar, de 1982 – que construiu o arcabouço jurídico que regula as atividades no mar no âmbito do território dos países – notoriamente apoiou a proposta de criar essa rede para a conservação dos mares, mas al-guns países se opuseram à ideia, como Japão, Venezuela, Canadá e Estados Unidos. Interesses econômicos e geo-políticos de segmentos econômicos poderosos, como as indústrias da pesca, da exploração de petróleo e gás e da produção de fertilizantes, atuaram nos bastidores para evitar a adoção de ações concretas para a proteção dos oceanos no médio prazo.

Mas se ainda não foi possível garantir a proteção total do mar internacional, nos resta continuar cuidando do pedaço que nos cabe e fortalecer a rede de proteção marinha no Brasil. E há muito a avançar: embora na di-plomacia internacional o país adote posturas arrojadas e conservacionistas (como na questão da caça à baleia, abo-lida definitivamente nos mares brasileiros em 1985), no cenário doméstico há uma série de lições de casa a serem feitas. O país possui uma política de incentivo à produção pesqueira, mas tem falhado na criação de novas unidades de conservação e não tem uma política nacional dos oce-anos. E ajudar a construir essa política será um dos prin-cipais desafios da SOS Mata Atlântica e do movimento ambientalista brasileiro para os próximos anos.

Neste sentido, além das atividades em curso, a SOS Mata Atlântica, em conjunto com várias entidades e mo-vimentos socioambientais, empresas, governo, especialis-tas e parlamentares (especialmente do Grupo de Traba-lho da Zona Costeira e Ecossistemas Marinhos da Frente Parlamentar Ambientalista), vêm empreendendo esfor-ços para contribuir com o país nos diálogos e acordos e buscando promover a criação de mais subsídios para a definição de prioridades e estratégias futuras.

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Peixes-frade (Pomacanthus paru), no Atol das Rocas. © Luciano Candisani

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12 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

Os trabalhos incluem a geração e sistematização de dados, criação de marcos regulatórios e proposições legislativas, e a realização de campanhas e ampla divul-gação, com vistas a promover a melhoria na qualidade de vida das pessoas e comunidades que vivem nesta região e especialmente da pesca, do extrativismo marinho e ou-tras atividades socioeconômicas e culturais associadas à conservação e ao uso sustentável dos recursos naturais nos ecossistemas costeiros e marinhos do Brasil.

Teia da vida

Há mais de 3,5 bilhões de anos o mar e seus ecos-sistemas asseguram a continuidade da vida na Terra. As primeiras formas de vida se desenvolveram nos domínios dos oceanos: de vírus e bactérias microscópicas a recifes de corais repletos de peixes, invertebrados e plantas. E é essa teia que supre também nossas necessidades de alimento, la-zer, transporte, oxigênio, água. O gigantesco reino global dos oceanos – 1,3 bilhão de km³ – continua sendo, apesar das ameaças, o grande laboratório dos principais ciclos geoquímicos – como os do carbono, do nitrogênio e do fósforo – responsável pela manutenção das características que configuram a biosfera, como o clima e a temperatura.

Entre os recursos e processos prestados de graça à Humanidade pelos ecossistemas marinhos estão a produ-ção do oxigênio, fundamental para a vida humana e de um sem número de espécies, e a absorção do carbono da atmos-fera – e nunca antes produzimos tanto carbono: chegamos a 381 partes por milhão 7 , resultado do modelo de desen-volvimento que o mundo experimentou a partir da Revolu-ção Industrial, intensivo na queima de combustíveis fósseis, como o petróleo e o carvão. Sem o precioso papel dos oce-anos, a humanidade já estaria frita: os oceanos já absorve-ram 80% do calor adicionado pelo aquecimento global ao sistema climático do planeta. Além disso, os manguezais e estuários que fazem parte das zonas costeiras representam uma poderosa retaguarda frente às ameaças de eventos cli-

7. Partes por milhão, ou ppm, é a unidade empregada para medir a concentração de dióxido de carbono, ou CO2, na atmosfera. A atual concentração de CO2 é a maior dos últimos 650 mil anos.

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13SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

máticos extremos, como maremotos e furacões, cada vez mais comuns em um cenário de alterações climáticas.

Essas áreas são também os berçários para a maior parte de espécies de peixes e crustáceos que alimentam as populações humanas. A biodiversidade marinha 8 su-pre 20% da proteína animal consumida por 1,5 bilhão de pessoas em todo o mundo e 15% de outros 4,5 bilhões. Continuará suprindo? A exploração predatória das espé-cies já dizimou uma parcela significativa dos estoques de peixes comerciais nos últimos 50 anos em todo o mundo: 52% estão plenamente explorados e 25% foram utiliza-dos além de sua capacidade de regeneração. Os recifes de corais, morada e fonte de alimento para tantas espécies, também estão sob a ameaça de iminente destruição: 24% estão sob o risco iminente de colapso, agravado novamen-te pelas mudanças climáticas e acidificação dos oceanos.

A importância econômica do mar vai além da pro-visão de alimentos para grande parte da população. Os oceanos são a principal via de transporte para o comér-cio mundial e abrigam grandes reservas de petróleo e minerais. Isso sem falar que são fonte de turismo, lazer e diversão para 1,2 bilhão de pessoas em todo o mundo que residem a até 100 km da costa.

Está na hora de lançarmos um novo olhar sobre o mar.

8. Artigo “Pesquisa no Oceano: Desafios e Oportunidades”, publicado na revista Scientific American Brasil.

Tartaruga-verde (Chelonia mydas) no Atol das Rocas.

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Pesquisador soltando tubarão-limão (Negaprion brevirostris), no Atol das Rocas.© Luciano Candisani

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15SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

Para entendermos a importância do mar para a vida brasileira é preciso voltar no tempo e na história. O oceano desempenhou papel fundamental na his-

tória do Brasil, desde que a frota do navegador português Pedro Álvares Cabral aportou em nosso litoral, em 1500. Na ocasião, numerosas etnias indígenas, especialmente o grupo dos guaranis, habitavam as regiões costeiras e sobreviviam da caça, pesca e cultivo de alimentos como mandioca e milho.

O processo de colonização do Brasil foi consequê n-cia do já consolidado projeto de expansão marítima em-preendido por Portugal. Ao chegar ao Brasil, os portu-gueses notaram a abundância de riquezas naturais, mas durante três décadas a única atividade econômica reali-zada pelos colonizadores era a exploração do pau-brasil 1 nas regiões litorâneas. A partir de 1530, foi introduzida a cultura da cana-de-açúcar e os engenhos, cujo produ-to principal, o açúcar, se tornaria a base do incipiente comércio exterior brasileiro. Estava, assim, plantada a semente do processo predatório dos recursos naturais em que nossa economia se baseou, desde os primórdios do Brasil Colônia. Do corte do pau-brasil ao desmatamento da vegetação costeira para o plantio da cana-de-açúcar e, posteriormente, da cultura do café, o Brasil começou a se desenvolver em detrimento de um dos seus principais biomas, a Mata Atlântica.

Nos séculos seguintes, o processo de ocupação se estendeu rumo ao interior do país, especialmente nos sé-

O desafio de proteger o mar

1

1 Árvore que batizou o País, o pau-brasil (Caesalpinia echinata) é uma espécie nativa da Mata Atlântica e foi quase dizimada durante o Brasil Colonial – sua exploração remonta a 1501. Sua madeira em tom avermelhado era muito apreciada pelos europeus, bem como sua resina, que era utilizada na indústria têxtil. Hoje, o pau-brasil figura entre as espécies consideradas vulneráveis pelo Ibama. A União Internacional para Conservação da Natureza (UICN) também considera o pau-brasil uma espécie em perigo de extinção.

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16 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

culos XVII e XVIII, com a descoberta das riquezas mine-rais, como o ouro de Minas Gerais. O avanço em direção ao interior – que colocou os bandeirantes como novos protagonistas do processo de ocupação do Brasil – não eliminou, no entanto, a importância estratégica da zona costeira. Pelo contrário: o litoral passou a abrigar intensa atividade portuária para escoar as riquezas para o con-tinente europeu. Determinante no acesso dos produtos brasileiros aos mercados europeus, a navegação pelo Atlântico viveu momento de grande expansão e hoje, decorridos mais de três séculos, o mar ainda exerce o pa-pel de permitir o transporte das commodities e outros produtos brasileiros rumo aos mercados internacionais. A ocupação da costa brasileira também se justificou sob o argumento da defesa, já que outros povos de origem europeia, como franceses, ingleses e holandeses, estavam igualmente interessados na abundância dos recursos na-turais do Brasil.

Um litoral diverso – e biodiverso

Os primeiros vilarejos se converteram em cidades e posteriormente em metrópoles. O Brasil cresceu, sua vocação de viver à beira-mar acompanhou o ritmo e hoje a faixa litorânea abriga nada menos do que 50,7 milhões de habitantes, o equivalente a 26,6% de sua população 2 . E o mar continua a ser fornecedor de ali-mento, de trabalho, de lazer e divertimento para grande parcela da população.

Do peixe que chega à mesa das famílias ao combus-tível do dia a dia, o mar é fundamental para a economia brasileira. Mais de 95% do comércio exterior praticado pelo Brasil é realizado por via marítima. O mesmo vale para riquezas minerais: o país prospecta no mar mais de 85% do seu petróleo e gás natural. O extenso litoral, com 7.416 quilômetros de costa, é um dos principais atrati-vos turísticos e ajuda o país a atrair um número cada vez maior de visitantes 3 .

2 Total de habitantes que moram em municípios da zona costeira, segundo o Atlas Geográfico das Zonas Costeiras e Oceânicas do Brasil, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 2011.

3 No período de janeiro a novembro de 2011, o Brasil registrou 72 milhões de desembarques domésticos e 8,26 milhões de desembarques internacionais. O número representa um recorde histórico, segundo o Ministério do Turismo.

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17SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

E não é para menos. Quem se dispuser a conhecer o extenso litoral brasileiro vai se deparar com um verdadeiro mosaico de ecossistemas, que abrange 17 estados, 463 mu-nicípios, climas diversos – que vão do equatorial do Nor-te ao temperado do Sul – e uma infinidade de paisagens. Há praias, campos de dunas e falésias, restingas, costões, manguezais, baías e estuários, recifes e corais. O litoral, como zona de transição entre mar e terra, esteve sujeito aos efeitos da atividade marinha ao longo da história da Terra. São contornos que levaram no mínimo 20 milhões de anos para serem formados e resultam em condições mais que ideais para acolher uma rica biodiversidade.

A riqueza biológica dos ecossistemas costeiros faz com que essas áreas sejam verdadeiros berçários naturais para uma infinidade de espécies, tanto as nativas desses ambientes – 50% das espécies de corais e 20% das es-pécies de peixes encontradas ali são endêmicas da costa brasileira – quanto aquelas que vivem no oceano aberto. Em uma área relativamente pequena de recifes de corais – o equivalente a 0,5% do total mundial – as taxas de es-pécies observadas são superiores às do Caribe. Há ainda os animais que migram para as regiões costeiras duran-te seu período reprodutivo. A fauna e a flora associadas aos ecossistemas costeiros significam importante fonte de alimento, especialmente proteína, para as populações humanas – peixes, moluscos, crustáceos – que são igual-mente fonte de renda para um grande contingente de fa-mílias. A diversidade de paisagens muda conforme o cli-ma e a região do Brasil. O litoral do Norte e do Nordeste concentra grande quantidade de manguezais, restingas e estuários, bem como praias arenosas e formação de du-nas, entrecortadas por falésias esculpidas pela ação do tempo, que causaram a erosão dos tabuleiros de areia do período Terciário 4 . À medida que se desce em direção ao Sudeste, a paisagem muda: o litoral, mais recortado, abriga estuários, lagunas, costas rochosas e mais praias arenosas. E no temperado litoral Sul do país, costas bai-xas, dunas e restingas dominam o cenário.

4 Período compreendido entre 65 milhões e 1,8 milhão de anos na história terrestre, quando surgem os primeiros ancestrais do homem.

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18 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

Sobre esse vasto território, restando hoje menos de 5% de sua cobertura original na zona costeira brasileira, a Mata Atlântica segue como fragilizada testemunha do processo histórico de ocupação do litoral, do século XVI em diante. Calcula-se que, em 1500, a Mata Atlântica chegou a ocupar uma área de 1.360.000 km², aproxima-damente 15% do território brasileiro. Mas os problemas se sucederam desde que a primeira leva de imigrantes por-tugueses abriu clarões na mata para extração de madeiras nobres e para o plantio da cana-de-açúcar. Nos dias atu-ais, além da Mata Atlântica não cobrir mais que 7,9% do território brasileiro, problemas como a poluição, o lixo, a especulação imobiliária que avança sobre faixas de areia e áreas de restingas e manguezais, o turismo predatório, o precário saneamento básico, a pesca sem controle e os riscos da exploração de petróleo, além do impacto das espécies invasoras, são apenas alguns dos desafios para a integridade e proteção da biodiversidade do mar e dos ambientes costeiros. Junte-se a isso o agravante de que os ambientes marinhos no Brasil são ainda pouco conheci-dos e, como consequência, pouco valorizados.

Há muito trabalho a ser feito nessa direção.

A ameaça da sobrepesca

Um exemplo que ilustra bem o impacto negativo que a ação do homem causa sobre os ecossistemas ma-rinhos é a sobrepesca – que é a captura de peixes, crus-táceos e outros animais acima da capacidade de reposi-ção das populações. Os oceanos, antes tidos como fonte inesgotável de alimento, têm mostrado suas limitações: estudos recentes apontam que uma parcela significati-va dos estoques de peixes comerciais foi dizimada nos últimos 50 anos: 52% dos estoques estão plenamente explotados 5 e 25% sobre-explorados, ou seja, explo-rados além de sua capacidade de regeneração. No caso dos recifes de corais, que fornecem abrigo e alimento para um sem número de espécies de peixes, crustáceos

5 Termo utilizado para exploração econômica de recursos naturais.

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19SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

e moluscos, o colapso já atinge 25% dessas formações em todo o globo.

No Brasil, não faltam casos de superexplotação de espécies marinhas. As estatísticas pesqueiras no Brasil mostram uma situação ora de declínio, ora de colapso sucessivo dos estoques de diversas espécies. Que o digam a popular sardinha (Sardinella brasiliensis) no Sudeste do país, a lagosta (Panulirus spp.) e o pargo (Lutjanus purpúreos) na região Nordeste – espécies já pescadas à exaustão. A lista da fauna marinha brasileira ameaçada de extinção já chega a 83 espécies (veja quadro), sendo que a sobre-exploração já atinge 24 espécies de peixes, 11 de invertebrados e 8 de tubarões.

Isso se reflete nas oscilações da produção pesquei-ra nacional. O saldo da balança comercial pesqueira (que abrange importação e exportação de peixes, moluscos, crustáceos e outros invertebrados aquáticos) em 2010 foi dez vezes menor do que em 2006 e se tornou negativo desde então 6 . A aquicultura, que é o cultivo de organismos ma-rinhos, também vem registrando retração 7 : caiu de 101,6 mil toneladas em 2003 para 78,3 mil toneladas em 2009. Já a produção nacional da pesca extrativa marinha foi de 484,6 mil toneladas em 2003, subindo gradativamente a cada ano até atingir 585,7 mil toneladas em 2009 – o que não significa que os oceanos estão se recuperando, pelo contrário. A produção pesqueira vem se mantendo nesses patamares graças à adoção de novas técnicas de extrati-vismo e o redirecionamento da captura para espécies que até então não eram visadas comercialmente. No Banco de Abrolhos, litoral sul da Bahia, por exemplo, os budiões (da família Scaridae), peixes que não eram capturados há uma década, hoje são um dos principais alvos de pescado-res e surgem nas peixarias e supermercados como “filé de badejo”. O badejo original, a propósito, faz parte de um grupo de espécies carnívoras já praticamente exaurido.

Outro imenso problema para a biodiversidade ma-rinha no Brasil é a concorrência com as espécies invasoras, ou exóticas (que não são naturais de determinada região).

6 Segundo o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), em 2006, o saldo da balança comercial pesqueira ficou negativo em US$ 75,2 milhões. Essa diferença foi aumentando com o passar dos anos até se tornar dez vezes maior em 2010 (menos US$ 757,2 milhões), quando as exportações somaram US$ 199,4 milhões e as importações totalizaram US$ 956,5 milhões.

7 Segundo o Ministério da Pesca e Aquicultura.

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20 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

Fauna marinha brasileira ameaçada de extinção

Fontes: 1) Machado et al. (2005). Lista da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção. Fundação Biodiversitas; 2) Instrução Normativa no 3, de 27 de maio de 2003; 3) Instrução Normativa no 5,de 21 de maio de 2004; 4) Instrução Normativa no 52, de 8 de novembro de 2005

Espécies sobre-explotadas ou ameaçadas de sobre-explotação

TÁXON/CATEGORIA DE AMEAÇA

VULNERÁVEL EM PERIGOCRITICAMENTE

EM PERIGOTOTAL

INVERTEBRADOS 24 7 2 33

PEIXES ÓSSEOS 7 0 0 7

TUBARÕES E RAIAS 5 5 2 12

RÉPTEIS 2 2 1 5

MAMÍFEROS 3 3 2 8

AVES 12 3 3 18

TOTAL 53 20 10 83

Invertebrados

Peixes ósseos

Tubarões

11

24

8

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21SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

Segundo o MMA 8 , o Brasil tem mais de 50 espécies in-vasoras marinhas. Os estados que apresentavam maiores variedades de espécies marinhas exóticas em 2009 eram o Rio de Janeiro (36 espécies identificadas) e São Paulo (33). Elas vêm em cascos de navio, na água de lastro das em-barcações, ou são introduzidas no ambiente de maneira acidental. Mas causam estrago: sem predadores, são res-ponsáveis por desequilíbrios ecológicos nos lugares onde se instalam, pois podem levar espécies nativas à extinção. Um exemplo é o coral-sol (Tubastraea spp.), nativo do Caribe e introduzido no Brasil na década de 1980 por plataformas de petróleo e gás. A espécie, embora faça a alegria de mergulhadores devido à beleza de seus tentácu-los amarelos, se reproduz em tempo recorde e mata corais que são nativos da fauna marinha brasileira. Outra espé-cie invasora bastante disseminada é o mexilhão dourado (Limnoperna fortunei), molusco nativo do sul da Ásia. Introduzido no Brasil no final dos anos 1990 pela água de lastro de navios mercantes, a espécie entrou pela bacia do rio da Prata e infestou ecossistemas de água doce.

8 Ministério do Meio Ambiente.

Coral-sol (Tubastrea spp.): espécie invasora

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22 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

O compromisso de proteger

A área marinha brasileira total é de 3.555.796 km², o que corresponde às águas jurisdicionais brasileiras – mar territorial, zona contígua e ZEE 9 . No entanto, o total de áreas com proteção integral e uso sustentável 10 dos recursos naturais é de apenas 55.716 km², divididas em 102 unidades de conservação, o que é equivalente a 1,57%. Ou seja, o Brasil protege menos de 2% de suas áreas marinhas.

Esse quadro terá de mudar: o Brasil assumiu um compromisso internacional de aumentar suas áreas de proteção à biodiversidade, tanto em terra quanto no mar. Em outubro de 2010, ao final da 10ª CDB 11 , convocada pela ONU 12 e com a presença de 193 países, o Brasil se comprometeu com as metas globais para a redução da perda da biodiversidade.

Nesse encontro, a porcentagem dos territórios a serem conservados foi ampliada para o período de 2011 a 2020. Os países que assinaram a convenção terão de ampliar a proteção das áreas terrestres dos atuais 10% para 17% até 2020. No caso dos ecossistemas marinhos, as áreas protegidas em todo o mundo deverão passar de 1% para 10%. Metas ambiciosas, até mesmo para um país que tem feito a lição de casa quando o assunto é criar unidades de conservação 13 .

O desafio é grande: o Ministério do Meio Ambiente aponta que mais de 90% das áreas prioritárias para con-servação de peixes, quelônios e bentos (organismo que vivem nos substratos aquáticos) no Brasil encontram-se fora de áreas abrangidas por unidades de conservação oficiais. Toda a costa do estado do Rio Grande do Sul e a parte mais ao sul de Santa Catarina, caracterizada por longas linhas de praias e restingas, relativamente pouco impactadas pela ação humana, estão classificadas como de alta importância biológica e são áreas prioritárias para conservação. Quanto aos recifes de corais, a região Nordeste é a que apresenta maior área prioritária para conservação, ainda segundo o MMA.

9 Zona Econômica Exclusiva: até 200 milhas náuticas da costa.

10 Ver mapa, pág. 23.

11 Convenção sobre Diversidade Biológica.

12 Organização das Nações Unidas.

13 Hoje, o Brasil tem aproximadamente 16,7% de seu território continental em UCs, média superior à do restante do mundo, onde apenas 12,8% estão sob a proteção legal. O esforço de se criar novas áreas protegidas se concentrou na última década: entre 2003 e 2008, o país criou 703.864 km² de parques e reservas ambientais. Um salto, mas é preciso ampliar a proteção aos ecossistemas marinhos para garantir continuidade aos avanços.

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23SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

Unidades de Conservação Marinhas no Brasil

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24 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

Plano de ação: SOS Mata Atlântica em campo

É indissociável a simbiose entre a Mata Atlântica, o principal bioma costeiro que ocorre no Brasil, e o pró-prio mar. Não poderia, portanto, ser diferente a relação entre a Fundação SOS Mata Atlântica com as regiões litorâneas e o oceano. A luta e a militância pela preser-vação da Serra do Mar e da Jureia, no litoral paulista, que começou na década de 1970, foram o embrião da organização como a conhecemos hoje. Um dos últimos recantos de natureza intocada no industrializado Estado de São Paulo, a região foi alvo, no início da década de 1980, da cobiça do governo militar – o plano era cons-truir, pasmem, duas usinas nucleares na região.

Um ainda incipiente movimento ambientalista (que contava com nomes como o empresário Roberto Klabin, os jornalistas Randau Marques e Rodrigo Lara Mesqui-ta – que depois viria a se tornar presidente da SOS Mata Atlântica –, o então vereador em Itanhaém Ernesto Zwarg, o advogado e futuro parlamentar Fábio Feldmann, entre

Mobilização da campanha #Mangue faz a diferença, em Santos (SP), fevereiro de 2012.

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25SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

outros) promoveu uma intensa mobilização junto às forças políticas do momento, que ajudou a dissuadir o governo de construí-las. Após muito barulho e o apoio do lendário ambientalista Paulo Nogueira-Neto, à frente da Secretaria Especial de Meio Ambiente, futuro ministério, o projeto foi arquivado em 1985. Também crescia a mobilização em prol da Serra do Mar, que ganhou destaque na imprensa em ra-zão dos índices nefastos de poluição que deram à cidade industrial de Cubatão a triste alcunha de “Vale da Morte”.

No início de 1986, um importante encontro reuniu, na Ilha do Cardoso (litoral sul de São Paulo), ambienta-listas, empresários, políticos, cientistas e os governadores de São Paulo, Franco Montoro, e do Paraná, José Richa. O tema da reunião, a proteção dos remanescentes flores-tais no litoral paulista, rendeu muitos desdobramentos. Poucos meses depois, em outubro, nascia oficialmente a Fundação SOS Mata Atlântica. E mais: o governo de São Paulo anunciou que uma área total de 80 mil hectares seria transformada na Estação Ecológica Jureia-Itatins, resguardando os remanescentes da Mata Atlântica do li-toral sul paulista das pressões do mercado imobiliário, que pretendia transformar parte da Jureia em um condo-mínio fechado de alto padrão. Montoro ainda anunciou a criação da Secretaria de Meio Ambiente do Estado de São Paulo, cujo primeiro ocupante foi José Pedro de Oli-veira Costa, que havia sido assessor de meio ambiente na Secretaria de Planejamento. O engajamento de Zé Pedro, como é conhecido, rendeu importantes vitórias ao movi-mento ambientalista, como o Tombamento da Serra do Mar e o reconhecimento internacional, pela Unesco 14 , da Reserva da Biosfera da Mata Atlântica.

Ao longo da trajetória da SOS Mata Atlântica, a atu-ação em áreas de interface com o mar foi uma constante. Mas faltava sistematizar essa proteção ao mar e posicioná--la como um ponto estratégico da atuação da Fundação. Ao mesmo tempo, as ameaças aos ecossistemas marinhos vão se tornando mais contundentes na esfera global: os efeitos do aquecimento global, a acidificação dos oceanos,

14 Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.

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26 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

Áreas Prioritárias Marinhas 2007Importância biológica

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27SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

a perda da biodiversidade. “Começamos a ver o mar como uma grande oportunidade de reforçar nossa atuação, de chamar a atenção para os problemas, desenvolver conhe-cimento e mobilizar pessoas”, diz Roberto Klabin, um dos fundadores e atual presidente da ONG 15 .

Faltava buscar conhecimento, expertise, e definir áreas marinhas prioritárias para a conservação. Um tra-balho imprescindível nesse sentido foi o estudo realizado em 2006, a pedido da SOS Mata Atlântica, pela profes-sora Yara Schaeffer-Novelli, do Instituto Oceanográfico da USP 16 , uma das maiores autoridades nacionais em meio ambiente costeiro. O “Macrodiagnóstico das Zo-nas Costeira e Marinha sob Influência do Bioma Mata Atlântica” identificou regiões do litoral brasileiro prio-ritárias para ações de preservação dos ecossistemas, em razão de sua exuberância ecológica, bem como os princi-pais fatores de pressão sobre o meio ambiente: da polui-ção metropolitana à criação de camarões, passando pela exploração de petróleo e o turismo predatório.

O estudo listou 10 áreas: Rio Jaguaribe, no Ceará; Canal de Santa Cruz, em Pernambuco; Costa dos Corais, na divisa entre Pernambuco e Alagoas; Baía de Todos os Santos e Baía de Camamu, ambas na Bahia; Baía de Vitória, no Espírito Santo; Baía de Ilha Grande, no litoral fluminense; Iguape-Cananeia-Paranaguá, entre os estados de São Paulo e Paraná; Baía da Babitonga, em Santa Catarina; e Lagoa do Peixe, no Rio Grande do Sul. Em cada uma dessas regiões, foram mapeados tanto os aspectos ambientais que devem ser protegidos quanto os principais impactos à natureza, além de critérios econômicos e de desenvolvimento huma-no e social, a presença de ONGs e universidades atuantes. Apontou ainda atividades alternativas de fomento à econo-mia dessas regiões, mas com reduzido impacto ambiental.

O trabalho foi base para o Programa Costa Atlântica e o Fundo Costa Atlântica, criados em 2006 com o objetivo de contribuir com o equilíbrio ambiental das regiões costei-ras. Como a SOS Mata Atlântica estruturou seus projetos? É o tema do capítulo seguinte.

15 Organização Não Governamental.

16 Universidade de São Paulo.

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28 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

Estação Ecológica de Jureia-Itatins. © Zig Koch

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29SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

O ponto de partida foi o pedido de um macro-diagnóstico das regiões marinha e costeira 1 à professora Yara Schaeffer-Novelli, do Instituto

de Oceanografia da USP, na época conselheira da Fun-dação SOS Mata Atlântica. Com base neste diagnóstico, realizado com a participação de uma equipe formada por Clemente Coelho-Jr, Renato de Almeida, Marília Cunha-Lignon e Rocardo Palamar Menghini, a Funda-ção se deu conta de que tinha muito trabalho a fazer. A organização já possuía 20 anos de experiência de traba-lhar com a mobilização de diferentes agentes e, agora, contava com um completo diagnóstico das regiões onde era preciso agir para evitar e contornar a degradação am-biental dos ecossistemas marinhos.

As prioridades e as carências eram muitas, mos-trou o estudo. De salvar da extinção o peixe-boi marinho (Trichechus manatus), o mais ameaçado dos mamíferos brasileiros, a fortalecer unidades de conservação em re-giões sob intensa pressão ecológica: faltava apenas orde-nar a forma de atuação. Com esse objetivo, foi criado o Programa Costa Atlântica, em 2006. O princípio nortea-dor da iniciativa é promover ações para a conservação da biodiversidade e o desenvolvimento sustentável das zo-nas costeira e marinha em um território que abrange os estados sob influência do bioma Mata Atlântica, ou seja, do Piauí ao Rio Grande do Sul. Para isso, a organização passou a buscar patrocinadores para um fundo que ga-rantiria a realização e a continuidade dessas ações.

O Programa Costa Atlântica: hora de agir

2

1 Ver O desafio de proteger o mar, pág. 15.

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30 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

Assim, o Programa Costa Atlântica se dividiu em duas vertentes – ou melhor, dois tipos de fundos. O Fun-do Costa Atlântica, que passou a apoiar, por meio de editais públicos, projetos de criação e implementação de UCs marinhas, tais como parques e reservas extrativis-tas no mar e na costa brasileira. Também são elegíveis projetos de desenvolvimento regional sustentáveis, com ênfase em atividades de fomento à economia dessas co-munidades costeiras, sem comprometer o meio ambien-te. A segunda vertente é o Fundo Pró-Unidades de Con-servação Marinhas 2 . Estabelecido como um fundo de perpetuidade, ou endowment fund em inglês – onde o dinheiro é aplicado e os rendimentos líquidos custeiam as atividades de conservação –, tem a missão de apoiar a gestão e a sustentabilidade de áreas marinhas que já são protegidas por lei, mas que enfrentam enormes desafi os em sua sobrevivência.

O Fundo Costa Atlântica alcançou conquistas im-portantes, ao viabilizar projetos em áreas prioritárias. Desde seu início, realizou quatro editais, angariou patro-cinadores, investiu R$ 672 mil e possibilitou viabilizar 19

Grande desafi o

De acordo com o biólogo Fábio Motta, que coordenou o Programa Costa Atlântica de maio de 2007 a março

de 2012, trabalhar com o mar representa um grande desa o no Brasil atual. “Algumas das atividades que vêm comprometendo a biodiversidade marinha estão avançando, como a conversão de manguezais em áreas portuárias e a pesca ilegal”, diz Motta. Outro desa o é a falta de prioridade com que órgãos do governo encaram os ecossistemas marinhos e costeiros.

NÚMEROS DO FUNDO COSTA ATLÂNTICA:

19 PROJETOS

12 UNIDADES DE CONSERVAÇÃO

8 ESTADOS

R$ 672 MILINVESTIDOS

2 Ver capítulo 3, pág. 75.

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31SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

projetos em regiões costeiras de todo o Brasil, que aju-dam a proteger uma área de 107 mil hectares, equivalente a 107 mil campos de futebol. A seguir, vamos conhecer os principais projetos apoiados, seus resultados e os lega-dos que estão propiciando para a conservação do bioma Mata Atlântica, das espécies que nele vivem e para a po-pulação dessas comunidades.

Primeiro edital

O primeiro edital do Fundo Costa Atlântica foi lan-çado em 2007, em um evento durante o Rio Boat Show, na Marina da Glória, no Rio de Janeiro. Os projetos po-deriam ser enviados por ONGs, universidades, centros de pesquisa e entidades governamentais até 31 de julho daquele ano – no total, foram 11 iniciativas inscritas, e uma comissão especial elegeu, entre esses, cinco proje-tos. Os recursos também já estavam assegurados: com a empresa Copebrás, atualmente Anglo American, a Fun-dação SOS Mata Atlântica captou um patrocínio de R$ 1 milhão, sendo o primeiro aporte de R$ 200 mil, utilizado na íntegra para financiar os projetos deste edital.

REFÚGIO DE VIDA SILVESTRE DO PEIXE-BOI MARINHO

QUEM FEZ: Associação de Pesquisa e Preservação de Ecossistemas Aquáticos (Aquasis), com APA Delta do Parnaíba (ICMBio), Centro Mamíferos Aquáticos (ICMBio) e Universidade Federal do CearáPRINCIPAL ATIVIDADE: Diagnóstico socioambiental

A região dos estuários dos rios Timonha/Ubatuba e Cardoso/Camurupim, localizada próxima à divisa dos estados do Ceará e Piauí, é considerada, pelo MMA, de importância biológica extremamente alta. A região con-centra população remanescente do peixe-boi marinho (Trichechus manatus) 3 . A região é também um dos

3 Considerado o mamífero brasileiro mais criticamente ameaçado de extinção: estima-se que existam apenas 500 indivíduos em toda a costa brasileira.

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32 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

mais importantes pontos de parada de aves migratórias do corredor do Atlântico Ocidental. Além de ser um importante abrigo para a biodiversidade ameaçada, existem na região ambientes de grande relevância para a manutenção dos recursos pesqueiros: estuários com manguezais, recifes costeiros e bancos de algas, que são considerados os berçários da vida marinha.

O objetivo do projeto foi realizar um diagnósti-co socioambiental na região, para fornecer subsídios à proposta de criação de uma unidade de conservação de proteção integral nos estuários. Finalizado em maio de 2009, o projeto percorreu quatro municípios do litoral leste do Ceará: Beberibe, Fortim, Aracati e Icapuí. Fo-ram levantados subsídios técnicos para o encaminha-

Trinta-réis-grande (Phaetusa simplex) – briga no rio Cardoso, Piauí.

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33SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

mento da proposta de criação da UC. Os resultados dos estudos foram consolidados em um documento de 318 páginas que foi entregue ao Instituto Chico Men-des de Conservação da Biodiversidade e ao Ministério do Meio Ambiente.

A proposta é criar uma UC com abrangência de 50.307 hectares para proteger a principal área de repro-dução, alimentação e abrigo do peixe-boi marinho no Hemisfério Sul. Também beneficiará outras espécies da fauna marinha, como cetáceos e quelônios, que utilizam a área para deslocamentos e reprodução. A unidade de conservação também terá o papel de assegurar a manu-tenção dos serviços ambientais de um dos maiores e bem preservados complexos de estuários do litoral nordestino.

“Mais do que a sobrepesca, a principal ameaça à sustentabilidade das pescarias no litoral leste do Ceará é a perda de ambientes costeiros de berçário, principal-mente os manguezais e bancos de algas. Sem os serviços ecológicos prestados por esses ambientes, não há repo-sição dos estoques pesqueiros”, diz o coordenador do projeto, o engenheiro de pesca Alberto Alves Campos.

Atividades econômicas como a carcinicultura (criação de camarão), a exploração de petróleo e gás e outras ativistas extrativistas hoje representam ameaça à saúde dos ecossistemas. Ao mesmo tempo, a pesca arte-sanal é fonte de renda relevante para a comunidade local – daí a importância de preservar os mangues e estuá-rios, explica Campos. “Graças ao apoio do Fundo Costa Atlântica na elaboração dos estudos, a criação desta UC marinha deverá propiciar uma maior participação das comunidades costeiras sobre a gestão da pesca”, diz o coordenador. “As propostas de ordenamento poderão ser mais adequadas às particularidades locais para pro-mover também a conservação da biodiversidade e dos berçários da vida marinha”.

Concluída em 2009, a proposta de criação da UC 4 aguarda aprovação do ICMBio e do Ministério do Meio Ambiente.

4 Processo no 02007. 001132/2009-05.

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34 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO PARQUE NACIONAL MARINHO E NA ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL DE FERNANDO DE NORONHA

QUEM FEZ: Instituto Gol�nho Rotador com ICMBio PRINCIPAL ATIVIDADE: Educação ambiental para turistas e moradores

Sua beleza e importância ecológica dispensam apre-sentações: rochas e solos vulcânicos deram origem a um dos arquipélagos mais bonitos do planeta: Fernando de Noronha, no litoral do Nordeste. Mesmo com a visitação controlada, o conjunto de ilhas atrai milhares de visitantes todos os anos. Por isso o Instituto Golfinho Rotador propôs ao Fundo Costa Atlântica um projeto de educação ambien-tal para sensibilizar turistas e moradores quanto à impor-tância da conservação e do uso sustentável das unidades de conservação que abraçam o território do arquipélago.

A ilha principal está dividida em duas regiões: o Parnamar 5 de Fernando de Noronha, que ocupa uma área aproximada de 70% das terras, e a APA 6 Fernan-do de Noronha, que ocupa os 30% restantes – onde está localizada a porção urbanizada da ilha, com comércio, residências, restaurantes, pousadas e aeroporto.

O projeto foi concluído em maio de 2009. Durante 12 meses, três públicos alvos foram contemplados pela ini-ciativa de educação ambiental. Os alunos da Escola Arqui-pélago Fernando de Noronha participaram, dentro e fora de sala de aula, de atividades de conscientização. Tiveram a disciplina de Educação Ambiental (227 alunos), “Férias Ecológicas” (94 crianças), oficinas ambientais teóricas (429 alunos) e oficinas ambientais práticas (129 alunos e 20 professores). As oficinas abordaram temas como zonea-mento e áreas protegidas, Snuc 7 , as UCs locais, observa-ção terrestre do Arquipélago (Visita ao Morro do Francês e Hotel de Trânsito da Força Aérea Brasileira), observação marinha do Arquipélago (passeio de barco com mergulho livre) e de elementos da flora e da fauna nativas.

5 Parque Nacional Marinho.

6 Área de Proteção Ambiental.

7 Sistema Nacional de Unidades de Conservação.

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35SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

O programa “Férias Ecológicas” abordou a temáti-ca dos cinco elementos: água, ar, fogo, terra e o cuidado com a natureza. Foi realizada uma oficina de rádio e lo-cução para os jovens, proporcionando um contato com o meio de comunicação de massa de maior alcance no Brasil e também em Fernando de Noronha.

A população local que vive do turismo também foi envolvida. Prestadores de serviços turísticos no arquipélago – como condutores de visitantes, proprietários e tripulan-tes de embarcações, empresários e condutores de mergu-lho, donos de pousadas e seus funcionários – participaram de debates e reuniões sobre as questões ambientais.

Os turistas também não ficaram de fora. Para eles, foram ministradas três palestras semanais no Centro de Visitantes do Instituto Chico Mendes para a Conserva-ção da Biodiversidade, o que atraiu um total de 15.600 visitantes. Os três principais pontos de visitação do ar-quipélago (Mirante dos Golfinhos, Porto de Santo Antô-nio e Baía do Sueste) viraram ponto para orientação dos visitantes. Os voluntários do Instituto Golfinho Rotador explicaram aos visitantes as normas que regem a vida nas UCs, a fragilidade dos ecossistemas das ilhas e práticas de boa conduta nos passeios. Um total de 56.295 turistas interagiu com a equipe de monitores.

Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha.

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36 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

APOIO À CRIAÇÃO E PLANEJAMENTO DE UMA UNIDADE DE CONSERVAÇÃO MUNICIPAL MARINHA EM ILHÉUS (BA), PARA PRESERVAÇÃO DO MERO-CANAPU (Epinephelus itajara)

QUEM FEZ: Instituto Floresta Viva com Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc) e Secretaria de Meio Ambiente de IlhéusPRINCIPAIS ATIVIDADES: Mapeamento das áreas prioritárias para preservação dos meros; diagnóstico socioeconômico da região; e proposta de polígono para a unidade de conservação

O mero-canapu (Epinephelus itajara) é uma das maiores espécies de peixes que ocorre no litoral brasilei-ro – e é também uma das mais ameaçadas. Peixe da fa-mília dos Serranídeos, que abrange também as garoupas, chernes e badejos, o mero pode alcançar até 2,7 metros de comprimento e pesar mais de 400 kg. Seu ciclo de cresci-mento é longo: os filhotes só atingem a maturação com seis anos, em média. Embora sua captura seja proibida por lei, os meros ainda são alvo de pescadores inescrupulosos.

Pedras de Ilhéus e Ilheuzinho no Parque Marinho Municipal dos Ilhéus.

© Carlos M

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37SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

O projeto do Instituto Floresta Viva, de Ilhéus (BA), nasceu com o objetivo de apoiar o poder público munici-pal na tomada de decisão quanto a delimitação, zonea-mento e gestão de uso público da unidade de conservação marinha criada pela Lei Municipal no 3.212, de janeiro de 2006. A UC deveria zelar pela preservação do mero-cana-pu e ordenar os usos do mar na região, como as atividades de pesca, transporte marítimo, turismo e lazer.

Em 2009, os estudos de mapeamento dos hábitats marinhos foram aperfeiçoados, graças a ferramentas de tecnologia. O mapeamento das áreas prioritárias para preservação dos meros foi efetuado com base em três cri-térios: (1) a ocorrência dos recifes; (2) o posicionamento dos mais importantes locais de captura do mero; e (3) a legislação ambiental vigente. O monitoramento dos usos do mar foi finalizado em abril de 2009, após 13 me-ses de atividades semanais. Seus resultados ajudaram na atribuição de áreas de influência em torno dos pontos de avistamento ou rotas de embarcações.

Um diagnóstico socioeconômico foi igualmente conduzido e concluiu que a pesca na região é feita majo-ritariamente por pequenas embarcações – e mais de 50% dos pescadores no local possuem outras fontes de renda. Mas o estudo apontou a existência de zonas de conflito, como a caça submarina nas imediações da Pedra de Ilhéus, área prioritária para a preservação ambiental, e a ocorrên-cia da pesca de arrasto em áreas proibidas pelo Ibama 8 .

Assim, foram propostos dois polígonos para a criação do Parque Marinho Municipal, apresentadas em reuniões para consulta pública. A proposta foi discuti-da na região por dois anos, até que em junho de 2011 veio a boa notícia: o prefeito de Ilhéus, Newton Lima, assinou o decreto que regulamenta a Lei Municipal no 3.212. Estava, assim, criado o Parque Nacional Marinho dos Ilhéus. Graças à ajuda do Fundo Costa Atlântica, o exuberante mero-canapu pode, enfim, respirar um pouco mais aliviado nos belos recifes e ilhas rochosas de Ilhéus.

8 Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis.

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CENTRO DE INFORMAÇÕES AMBIENTAIS DA ESTAÇÃO ECOLÓGICA TAMOIOS – BAÍA DA ILHA GRANDE

QUEM FEZ: Sociedade Angrense de Proteção Ecológica (Sape) com Estação Ecológica de Tamoios (ICMBio), Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Universidade Federal Fluminense, Associação de Maricultores da Baía de Ilha Grande e Instituto Biodiversidade MarinhaPRINCIPAL ATIVIDADE: Criação de Centro de Informações Ambientais

A Baía da Ilha Grande é classificada como área de importância biológica extrema, ou seja, é uma área prioritária para a conservação da biodiversidade brasi-leira. Reúne um conjunto significativo de unidades de conservação, a maior parte delas hoje inserida no Mosai-co Bocaina – que integra o Corredor de Biodiversidade da Serra do Mar, na região de Angra dos Reis, Paraty e Ubatuba. A baía também abriga a maior parte dos re-manescentes florestais de Mata Atlântica do Estado do Rio de Janeiro. A Estação Ecológica de Tamoios abrange 8.700 hectares, sendo 96% de área marinha e o restante de áreas insulares. Foi criada em 1990, com objetivo de proteger, pesquisar e monitorar uma amostra represen-tativa do ecossistema insular marítimo da baía. Possui plano de manejo aprovado e sua zona de amortecimento abrange toda a Baía da Ilha Grande.

Com tamanha importância ecológica, era imperativo consolidar um Centro de Informações Ambientais, sediado na própria UC. A ideia era promover a estação ecológica a um ambiente de realização de estudos e pesquisas que contribuíssem para a formulação de políticas públicas para a sustentabilidade da Baía da Ilha Grande.

Finalizado em setembro de 2009, o projeto da So-ciedade Angrense de Proteção Ecológica, em pareceria com instituições integrantes do Conselho Consultivo da UC, possibilitou a criação de um Centro de Informações Ambientais que reúne grande parte do conhecimento

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científico hoje existente sobre a Baía de Ilha Grande. O produto obtido é um sistema com plataforma cliente--servidor orientado para web, que permite a manuten-ção (consulta, inclusão, edição e remoção) de referências sobre trabalhos realizados na região ou que se referem à região, além de informações sobre coleções de espécies animais e vegetais da área.

O sistema permite ainda o georreferenciamento das informações por meio do cadastro de marcos geo-gráficos dentro da área da Baía da Ilha Grande e Paraty, vinculando os pontos de um mapa às suas coordenadas geográficas e permitindo o relacionamento das informa-ções na base de dados a esses marcos. O sistema funciona localmente na sede da Estação Ecológica de Tamoios.

Os esforços para o levantamento bibliográfico en-volveram, além das pesquisas na internet e visitas feitas a bibliotecas de centros de pesquisa, o contato através de correspondência com 257 pesquisadores, autores de tra-

Esec Tamoios, na Baía da Ilha Grande (RJ).

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balhos científicos na região. Foram reunidas e sistema-tizadas 1.100 referências e 510 publicações em formato PDF. Além disso, foram agrupadas as informações sobre as coleções de organismos já coletados na Baía da Ilha Grande, dados que estão disponíveis também na inter-net 9 . Foram cadastradas um total de 423 coleções, com as informações completas de taxonomia.

Segundo Adriana Gomes, chefe da unidade de con-servação, o Centro de Informações Ambientais da Esta-ção Ecológica de Tamoios pretende se consolidar como uma importante ferramenta de consulta para subsidiar e orientar as ações de manejo da UC. “Será útil aos pesqui-sadores que vêm trabalhar na região, bem como para a formulação de políticas públicas sustentáveis e em bases científicas para a região da Baía da Ilha Grande”, diz ela.

APOIO À FISCALIZAÇÃO MARINHA DA ESTAÇÃO ECOLÓGICA DOS TUPINIQUINS E ENTORNO

QUEM FEZ: Sociedade de Defesa do Litoral Brasileiro (SDLB) com Estação Ecológica dos Tupiniquins, Polícia Ambiental do Estado de São Paulo, Marinha do Brasil e Capitania dos PortosPRINCIPAIS ATIVIDADES: Campanha de �scalização e conserto de embarcação destinada à �scalização

Unidade de conservação marinha criada pelo go-verno federal em 1986, com o objetivo de proteger os ecossistemas insulares no litoral sul de São Paulo, a Esta-ção Ecológica dos Tupiniquins carecia de um programa de fiscalização marinha mais eficiente, para coibir espe-cialmente a pesca e a caça, proibidas na reserva.

Foram realizadas duas primeiras campanhas de fis-calização, mas a embarcação apresentou problemas me-cânicos, gerando divergências entre a ONG proponente e o órgão gestor quanto aos encaminhamentos que deve-riam ser dados. A SOS Mata Atlântica optou em inves-tir o recurso do projeto no conserto da embarcação e o

9 http://www.itis.gov.

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ICMBio assumiu o compromisso de efetuar com recursos próprios o restante das campanhas de fiscalização previs-tas no projeto.

Segundo edital: foco no desenvolvimento regional

O segundo edital do Fundo Costa Atlântica foi anunciado em maio de 2008 durante o Viva a Mata, evento realizado anualmente pela SOS Mata Atlântica. Com R$ 200 mil para investir – fruto da parceria man-tida com a Copebrás-Anglo American e também de um novo patrocinador, a Bradesco Capitalização -, foram recebidas 10 propostas. Dessas, três projetos foram es-colhidos, além de dois outros projetos induzidos de de-senvolvimento regional – tema que, no entender da SOS Mata Atlântica, é de crucial importância para o apro-fundamento dos trabalhos de conservação: pois a popu-lação também faz parte dos ecossistemas que precisam ser protegidos.

Revoada de aves insulares na Ilha do Castilho (SP).

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LEVANTAMENTO DE SUBSÍDIOS PARA CRIAÇÃO DO REFÚGIO DE VIDA SILVESTRE DA PRAIA DO FORTE, NO MUNICÍPIO MATA DE SÃO JOÃO (BA)

QUEM FEZ: Fundação Pró-Tamar com Centro Nacional de Tartarugas Marinhas (Tamar/ICMBio)PRINCIPAIS ATIVIDADES: Diagnóstico de pesca e o�cinas sobre áreas protegidas

As praias do litoral norte da Bahia recebem anu-almente cerca de 8.000 desovas de quatro espécies de tartarugas marinhas: a tartaruga-cabeçuda (Caretta ca-retta); a tartaruga-de-pente (Eretmochelys imbricata); a tartaruga-oliva (Lepidochelys olivácea) e a tartaruga--verde (Chelonia mydas). Com a recente onda de ocu-pação imobiliária na região, foi levantada a ideia da criação de uma unidade de conservação com o obje-tivo de proteger as praias de desova da região. A Praia

Tartaruga Oliva (L. olivacea), na Praia do Forte (BA).

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agens Projeto Tamar

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do Forte, em Mata de São João, onde ocorrem cerca de 20% das desovas das quatro espécies, foi escolhida para a criação desta UC.

O processo de criação da RVS 10 de Praia do Forte já estava em andamento no ICMBio, mas necessitava de maior embasamento científico e discussão com a sociedade. A parceria entre a Fundação Pró-Tamar, a SOS Mata Atlântica e o ICMBio gerou um Diagnós-tico de Pesca, que traçou o perfil socioeconômico dos pescadores artesanais e levantou informações sobre as características da pesca na região, além da ocorrência de espécies ameaçadas de extinção. A parceria também possibilitou a realização de três oficinas participativas, com 16 horas cada uma, que reuniram 320 pessoas: 32% eram moradores da região, 13% ligados às orga-nizações da sociedade civil, 12% empresários, 10% li-gados a ONGs socioambientais locais, 8% pescadores, 8% representantes do governo estadual, 8% represen-tantes do governo municipal e 4% representantes do governo federal.

Os trabalhos para a criação da UC partiram do en-tendimento da necessidade de envolvimento dos diversos atores sociais e da comunidade no processo de criação.

As oficinas serviram para apresentar e discutir os objetivos para criação da UC, diagnósticos sobre a área, experiências similares, categorias de unidades segundo o Snuc, potencialidades e ameaças ao patri-mônio cênico e ambiental. “As oficinas consolidaram a necessidade de criação de áreas protegidas na região e resultaram no mapeamento das áreas prioritárias para a proteção”, conta Paulo Hunold Lara, biólogo da Fundação Pró-Tamar da Base da Praia do Forte. A documentação produzida foi encaminhada ao ICMBio, que realizou, em maio de 2011, a consulta pública à sociedade sobre a criação da RVS.

A metodologia participativa para criação de UC era uma novidade para o Projeto Tamar/ICMBio e para os processos de criação de UCs adotados no país. O

10 Refúgio da Vida Silvestre.

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envolvimento do projeto na criação de unidades de conservação foi baseado nas questões técnicas referen-tes aos dados biológicos e ecológicos das espécies de tartarugas marinhas. Estas espécies são excelentes ban-deiras para a proteção de ecossistemas. “Com o apoio do Programa Costa Atlântica houve a possibilidade de promover ampla discussão sobre a conservação dos ecossistemas marinhos e, consequentemente, colabo-rar com o processo participativo de criação da RVS na Praia do Forte”, diz Lara. “No atual cenário de ocupa-ção hoteleira e imobiliária do litoral norte baiano, a RVS será um importante instrumento de conservação e proteção ambiental, além de fomentar o desenvolvi-mento sustentável da região”, conclui o biólogo.

ARTICULAÇÃO PRÓ-MANGUE CANAL DE BERTIOGA: PROPOSTA DE CRIAÇÃO DE UNIDADE DE CONSERVAÇÃO DE USO SUSTENTÁVEL PARA A REGIÃO DE CANAL DE BERTIOGA, RIO ITAPANHAÚ E MANGUEZAIS ASSOCIADOS

QUEM FEZ: Instituto MaramarATIVIDADE PRINCIPAL: Produção de diagnóstico e documento técnico com dados físicos, biológicos, históricos e socioeconômicos da região para embasar poder público sobre região

O Canal de Bertioga é assim batizado por ser um braço de mar com cerca de 25 km de extensão, divi-dindo os municípios de Santos, Guarujá e Bertioga, no litoral de São Paulo. Surpreendentemente, uma extensa área de manguezal irrigada por águas marinhas man-tém vivas fauna, flora e boa parte da gente que vive em seu entorno – ainda que muito próxima do maior porto do Brasil, o Porto de Santos, e de áreas absoluta-mente transformadas pelo turismo desordenado.

Longe da bucólica visão de mangues preservados e intocados, os manguezais e áreas estuarinas do sis-

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tema do Canal de Bertioga dão sustento a extrativis-tas, marisqueiras e pescadores artesanais, além de uma crescente atividade de pesca recreativa, turismo náutico e pesquisa. Esse mosaico de usos compatíveis e confli-tantes exige uma nova estratégia de conservação, uma iniciativa que permita que a região valorize seus ativos locais com base na conservação e uso da biodiversidade.

Assim, o projeto inscrito no Costa Atlântica trouxe como objetivo discutir com a comunidade de extrativistas os benefícios da criação de uma unidade de conservação de uso sustentável, bem como sistema-tizar informações sobre as características socioeconô-micas da região. “O apoio dado pelo Costa Atlântica permitiu registrar os diferentes usos das áreas estua-rinas, manguezais e Mata Atlântica associada, e dia-logar com as populações acerca das possibilidades de gestão participativa e perspectivas de uma nova forma de governança”, afirma Fabricio Gandin, coordenador da Maramar.

Foi produzido documento técnico abordando os seguintes aspectos: caracterização física e biológica da área de estudo (revisão da literatura), histórico da ocupação humana, infraestrutura e serviços públicos e atividades socioeconômicas. “O trabalho permitiu dar voz à região, visando a sensibilizar o governo federal e, mais importante, o governo local”, diz o coordena-dor. Segundo ele, os planos de expansão urbana dos municípios vizinhos e a falta de entendimento entre os usuários são ameaças constantes para a conservação da biodiversidade. Ele enumera algumas conquistas obtidas a partir do diagnóstico realizado com o apoio do Fundo Costa Atlântica, como o reconhecimento, pelo Plano Diretor de Santos, de áreas rurais e áreas para conservação na região. “Também vêm ocorrendo avanços para implementação de medidas de controle das atividades náuticas, visando diminuir os impactos diretamente provocados sobre os manguezais”, enu-mera Gandin.

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DIAGNÓSTICO DE BIODIVERSIDADE DO ARQUIPÉLAGO SUL CAPIXABA (ES)

QUEM FEZ: Associação Ambiental Voz da Natureza, com Laboratórios de Nectologia e Ictiologia da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e Núcleo de Unidades de Conservação do Espírito Santo (ICMBio)PRINCIPAIS ATIVIDADES: Diagnósticos pesqueiros, socioeconômicos e ambientais nas ilhas e região costeira do entorno

O litoral sul do Espírito Santo apresenta grande di-versidade de paisagens, abrigando por sua vez uma rica fauna de peixes e aves marinhas. As ilhas costeiras são alvo de intensa atividade turística e pesqueira, sendo con-sideradas áreas prioritárias para o manejo e conservação no estado. Além disso, a região possui uma das maiores jazidas de algas calcárias do mundo, formando extensos e espessos bancos de rodolitos (algas calcárias), e a maior diversidade de macroalgas do Brasil, constituindo, junta-mente com os estuários e praias arenosas, um importan-te berçário para diversas espécies de peixes ameaçados de extinção e de importância comercial. A região abriga também uma elevada diversidade cultural e atividades de pesca tradicionais, além da presença de comunidades indígenas. A especulação imobiliária, as atividades de mineração dos depósitos calcários e a pesca predatória, além do interesse na instalação e expansão de diversas indústrias, portos e estaleiros de grande porte, são as principais ameaças para esses ambientes.

No ano de 2003, começou a ser delineada uma pro-posta de criação de um parque nacional marinho entre os municípios de Piúma e Marataízes. A área escolhi-da visava à preservação de cinco ilhas e uma proposta chegou a ser elaborada por entidades locais. Uma breve consulta pública realizada em 2004, no entanto, apon-tou fragilidades na proposta, principalmente em relação à presença de atividades de pesca tradicionais na área.

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Assim, optou-se por uma revisão da área e categoria de unidade de conservação.

Em 2009, o programa Costa Atlântica e instituições parceiras apoiaram projetos desenvolvidos pela Voz da Natureza, Ufes e ICMBio com o objetivo de fechar uma nova proposta. Foram realizados diagnósticos pesqueiros e socioeconômicos que envolveram oficinas participati-vas, além de diagnósticos ambientais nas ilhas e região costeira do entorno. “Os diagnósticos comprovaram a importância das atividades de pesca artesanais e apresen-taram um mapeamento da distribuição dos pesqueiros”, conta Hudson Pinheiro, presidente da Associação Am-biental Voz da Natureza. Depois, informações ambien-tais como diversidade, presença de espécies ameaçadas, densidade de espécies alvos de pescarias foram incorpo-radas ao mapeamento.

Assim, duas UCs marinhas, a Área de Proteção Ambiental Costa das Algas e o Refúgio de Vida Silvestre de Santa Cruz, foram finalmente criadas em 2010 entre os municípios da Serra e Aracruz, no Espírito Santo. Essa região apresenta um mosaico de ecossistemas muito pe-culiar, formado por recifes e costões, além de importantes sistemas pluviais e estuarinos, com extensos manguezais.

O apoio do Fundo Costa Atlântica para a proteção desses ecossistemas, no primeiro momento, se traduziu no amplo diagnóstico ambiental do litoral sul do Espí-rito Santo, que contemplou a biodiversidade terrestre das ilhas (vegetação e fauna), mapeamento dos hábitats marinhos, pesca, distribuição das espécies de peixes, conectividade entre ambientes marinhos e as principais ameaças à região. Também foi realizado um levantamen-to socioeconômico dos municípios abrangidos pela área de estudo – Anchieta, Piúma, Itapemirm e Marataízes.

A criação das unidades de conservação, em 2010, foi uma grande vitória para os moradores da região, mas, ao mesmo tempo, os desafios não pararam de crescer. Tanto que o litoral sul capixaba voltou a ser contempla-do no Edital IV do Fundo Costa Atlântica 11 . 11 Ver pág. 62.

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Projetos induzidos

ORDENAMENTO DO ENTORNO DE ÁREA DE RECUPERAÇÃO RECIFAL NA APA COSTA DOS CORAIS, TAMANDARÉ (PE)

QUEM FEZ: Instituto Recifes Costeiros, com APA Costa dos Corais (ICMBio), Centro de Pesquisa de Gestão de Recursos Pesqueiros do Litoral Nordeste (Cepene-Ibama) e Universidade Federal de PernambucoPRINCIPAIS ATIVIDADES: Monitoramento e controle de área de recuperação de recifes e seu entorno, levantamento e mapeamento de trilhas subaquáticas e criação de cooperativa voltada para atividades turísticas na região

Um cenário paradisíaco. Recifes de corais costei-ros, estuários, manguezais, restingas, praias arenosas e remanescentes de Mata Atlântica fazem da Área de Pro-teção Ambiental Costa dos Corais, entre o litoral sul de Pernambuco até o norte de Alagoas, uma região de alta importância ecológica, com aproximadamente 185 espé-cies de peixes registradas. Soma-se a isso a presença de espécies ameaçadas de extinção, como meros, tartaru-gas marinhas e o peixe-boi marinho, e o resultado foi a classificação da área, pelo Ministério do Meio Ambiente, como de prioridade extremamente alta para a conserva-ção e uso sustentável da biodiversidade.

Criada em 1997, a APA Costa dos Corais represen-ta uma conquista histórica: trata-se da primeira unidade de conservação federal a proteger parte dos recifes cos-teiros no Nordeste brasileiro. Abrange a área localiza-da entre os municípios de Tamandaré (PE) e Paripueira (AL). Esta área protegida, de aproximadamente 413 mil hectares, inclui uma linha que vai até 18 milhas da costa, incluindo a plataforma continental, que conta com man-guezais e estuários. No entorno da APA Costa dos Co-rais, vive uma população de cerca de 200 mil habitantes, que têm na pesca, agricultura e turismo suas principais atividades econômicas.

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Iniciado em dezembro de 2008, o projeto induzi-do pela Fundação SOS Mata Atlântica teve como prin-cipal objetivo apoiar a criação e a gestão de uma Zona de Amortecimento 12 na reserva marinha de Tamandaré.

Assim, a implementação da Zona de Amorteci-mento ajudou a recuperação das espécies marinhas que vivem nessa área de recifes, já que atividades como a pes-ca tiveram de ser suspensas no local. Ao mesmo tempo, resguardou a biodiversidade local e também trouxe uma importante fonte de renda para a população do entorno: o turismo ecológico.

Assim, a iniciativa promoveu o monitoramento e controle da área de recuperação dos recifes e seu entorno e realizou o levantamento e mapeamento de trilhas suba-quáticas, que são importantes para a prática do ecoturis-mo. Foi também criada uma cooperativa, que recebeu o nome de Náutica Ambiental, formada inicialmente por 29 pessoas, entre pescadores, estudantes, jangadeiros,

APA Costa dos Corais, Tamandaré (PE).

12 Segundo a Lei que instituiu o Snuc, a Zona de Amortecimento é o entorno de uma UC, onde as atividades humanas estão sujeitas a normas e restrições específicas, com o propósito de minimizar os impactos negativos sobre a UC.

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trabalhadores, mergulhadores e empresários da região. Hoje, a cooperativa leva os visitantes para praticar mer-gulho contemplativo em trilhas subaquáticas localizadas no entorno da área protegida. As trilhas foram plane-jadas em áreas também já beneficiadas pelos efeitos da Zona de Amortecimento, onde podem ser vistos peixes, corais e outras formas de vida em abundância. A biodi-versidade marinha protegida começa a gerar renda a uma parcela da população local.

O projeto induzido pela SOS Mata Atlântica na APA Costa dos Corais foi tão bem sucedido nessa etapa, que a região virou foco de investimentos do Fundo Pró--Unidades de Conservação 13 , que também faz parte do Programa Costa Atlântica. Agora, o desafio é ampliar a experiência bem sucedida de Tamandaré, criando novas áreas com restrições à pesca no interior da APA.

MATA ATLÂNTICA & PESCA: DIAGNÓSTICO E ORDENAMENTO PARTICIPATIVO DA PESCA AMADORA NO COMPLEXO ESTUARINO-LAGUNAR DE IGUAPE, CANANEIA E ILHA COMPRIDA, LITORAL SUL DE SP

QUEM FEZ: Fundação SOS Mata Atlântica, com APA Cananeia Iguape Peruíbe (ICMBio), ONG Biologus, Instituto de Pesca de São Paulo, Plano Nacional de Desenvolvimento da Pesca Amadora (PNDPA-Ibama) e Escola Técnica Estadual Engenheiro Agrônomo Narciso de MedeirosPRINCIPAL ATIVIDADE: Diagnóstico da pesca amadora na região

A pesca, amadora e esportiva, é um importante polo de atração de visitantes para a Área de Proteção Ambiental de Iguape, Cananeia e Peruíbe, no litoral Sul de São Paulo. Todos os anos milhares de pescadores bus-cam a região, também conhecida como Lagamar, para momentos de lazer junto à natureza. Mas qual é o per-fil desses visitantes e dos guias de pesca que os acom-

13 Ver pág. 75.

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panham em sua jornada mar adentro? Será que a pesca amadora gera impactos significativos às populações de peixes e ao meio ambiente como um todo?

Para responder a essas questões, a SOS Mata Atlân-tica e parceiros realizaram um amplo diagnóstico da pes-ca amadora nessa região. O objetivo do projeto, explica Fabio Motta, biólogo da Fundação e coordenador do Pro-grama Costa Atlântica de maio de 2007 a março 2012, foi gerar subsídios para a gestão participativa dos recursos pesqueiros da APA e promover um turismo de pesca sus-tentável, “que garanta a geração de emprego e renda na região, aliado à conservação ambiental”, diz Motta.

A área é reconhecida pela UICN 14 como uma das mais produtivas do Atlântico Sul, está inserida no maior remanescente contínuo de Mata Atlântica do Brasil e é classificada como de extrema importância e prioridade para a conservação, uso sustentável e repartição dos be-nefícios da biodiversidade pelo Ministério do Meio Am-biente. O Lagamar é constituído por estuários, mangue-

Projeto fez diagnóstico da pesca amadora no Lagamar.

14 União Internacional para a Conservação da Natureza.

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zais, dunas, restingas, lagunas, praias, ilhas entre outros ambientes com alta biodiversidade e um número signifi-cativo de espécies endêmicas e ameaçadas de extinção.

O projeto realizou cerca de 10 reuniões com pro-prietários de marinas, pesqueiros e guias de pesca para compartilhar os resultados parciais dos diagnósticos e discutir o ordenamento da pesca amadora na APA. O monitoramento pesqueiro participativo feito pelos guias de pesca do Lagamar durante 12 meses acompanhou 341 pescarias e registrou mais de 10 mil exemplares de peixes pertencentes a 51 diferentes espécies. Para o diagnóstico da cadeia produtiva e perfil do pescador amador, foram aplicados cerca de 400 questionários.

Concluído em 2010, o estudo rendeu um quadro muitíssimo interessante, que está em vias de sair em pu-blicações científicas. Em síntese, os resultados do projeto apontaram que, embora a pesca amadora venha gerando emprego e renda na região, alguns recursos pesqueiros importantes já se encontram em estado de sobre-explo-tação, principalmente devido ao baixo cumprimento da legislação pesqueira, fato diretamente ligado à falta de informação por parte da maioria dos seus praticantes.

Terceiro edital: fôlego à iniciativa

O sucesso dos editais I e II do Fundo Costa Atlân-tica, que conseguiram viabilizar importantes projetos em regiões da costa brasileira prioritárias para a conser-vação, deu fôlego à iniciativa. Em 2009, entrou em cena um novo patrocinador, a Fundação Toyota do Brasil. Juntas, Fundação Toyota e Bradesco Capitalização des-tinaram R$ 300 mil à realização do terceiro edital. Outra novidade foi a criação de uma nova categoria, voltada à conservação e uso sustentável dos ambientes marinhos e costeiros associados à Mata Atlântica, que neste edital teve os manguezais e as restingas como foco. No total, 11 projetos foram submetidos ao programa, sendo seis projetos selecionados.

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53SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

ÁREA MARINHA PROTEGIDA DO LITORAL LESTE DO CEARÁ

QUEM FEZ: Associação de Pesquisa e Preservação de Ecossistemas Aquáticos (Aquasis), com Instituto Terramar, Amigos da Prainha do Canto Verde, Fundação Brasil Cidadão, Universidade Federal do Ceará e ICMBioPRINCIPAL ATIVIDADE: Elaboração de diagnóstico socioambiental de área proposta para criação de unidade de conservação

O objetivo do projeto foi elaborar um diagnóstico socioambiental abrangente como subsídio ao processo de criação de uma unidade de conservação de uso susten-tável no litoral leste do Ceará, área prioritária para con-servação de espécies como o peixe-boi marinho, cetáceos e tartarugas marinhas.

Como resultado, foi elaborado e encaminhado ao ICMBio o Diagnóstico Socioambiental da área proposta para criação da UC, contemplando os seguintes aspectos: caracterização dos municípios e comunidades costeiras, experiência da comunidade em gestão compartilhada e as principais atividades econômicas da região, como o extrativismo marinho, o turismo e a maricultura (cultivo de organismos marinhos, como ostras e mexilhões, em seu hábitat natural).

CONSOLIDAÇÃO E FORTALECIMENTO DA RESERVA EXTRATIVISTA MARINHA DE CANAVIEIRAS (BA)

QUEM FEZ: Pangea – Centro de Estudos Socioambientais, com Associação Mãe dos Extrativistas da Resex de Canavieiras (Amex) e Resex Canavieiras (ICMBio)PRINCIPAL ATIVIDADE: Projeto foi cancelado

Localizada no litoral sul da Bahia, entre os municí-pios de Canavieiras, Belmonte e Uma, a Resex 15 Mari-nha de Canavieiras foi criada por decreto presidencial em

15 Reserva extrativista.

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2006, em uma área de cerca de 100 mil hectares. Prevista para beneficiar 2.300 famílias de extrativistas, gente que vive da pesca e da mariscagem, a UC necessitava de es-tudos mais aprofundados para finalizar a elaboração do seu plano de manejo.

No entanto, o projeto teve de ser cancelado, em razão de divergências entre a instituição proponente, a Pangea, e a chefia da Resex. Houve, por fim, desinteresse do órgão gestor, o ICMBio, em avançar com a iniciativa.

FORMAÇÃO DO CONSELHO DELIBERATIVO DA RESERVA EXTRATIVISTA MARINHA DO CASSURUBÁ, BAHIA.

QUEM FEZ: Instituto Baleia Jubarte, com Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Caravelas, Conservação Internacional, Ecomar, Movimento Cultural Arte Manha, Associação dos Pescadores de Caravelas (Apesca) e Resex Cassurubá (ICMBio)PRINCIPAIS ATIVIDADES: Elaboração de mapeamento institucional, diagnóstico socioambiental e o�cinas para a formação do Conselho Deliberativo da Resex

Uma unidade de conservação novinha em folha, criada por decreto presidencial em junho de 2009 – esse

Resex Marinha de Canavieiras (BA).©

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é o perfil da Reserva Extrativista de Cassurubá, que pre-enche uma área de 100 mil hectares nos municípios de Alcobaça, Caravelas e Nova Viçosa, no litoral sul da Bahia. A Resex fica na região do Banco dos Abrolhos, fundamental para a conservação de espécies marinhas, e foi criada para proteger uma importante área de man-gues, estuários e restingas. É desses ecossistemas que cer-ca de 1.000 famílias de pescadores e marisqueiros tiram seu sustento: a região é prodigiosa em espécies como o caranguejo-uçá (Ucides cordatus), o siri (Callinectes spp.), o caranguejo-guaiamum (Cardisoma guanhumi) e moluscos, que também são fonte de proteína e renda para a população local.

A criação da Resex surgiu de uma demanda co-munitária – marisqueiros, extrativistas e pescadores ar-tesanais estavam preocupados com a ação de catadores de caranguejos vindos de outras regiões. Além disso, um dos principais desafios da comunidade foi lutar contra a proposta de implantação do maior projeto de carci-nicultura do país, um empreendimento considerado in-compatível com a conservação da área e que gerou mui-tos conflitos na região. Havia ainda a preocupação com o aumento da especulação imobiliária, além de outros conflitos com os setores de exploração de petróleo e gás e papel e fábricas de celulose – estes minimizados após ajustes nos limites da Resex.

Uma vez criada a reserva, o papel do projeto inscri-to no Fundo Costa Atlântica foi desencadear o processo de formação do Conselho Deliberativo da Resex Cas-surubá. Foram realizadas nove oficinas socioeducativas com os extrativistas, visando a mobilizar esses atores, esclarecer dúvidas sobre os objetivos da unidade de con-servação e seus instrumentos de gestão. Foram também elaborados o mapeamento institucional e o diagnóstico socioambiental, este último documento obrigatório para a formalização do Conselho. Em 5 de junho de 2011, foi realizada a assembleia com vistas a definir a composição do Conselho Deliberativo da Resex do Cassurubá.

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CONSOLIDAÇÃO DE NOVAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO MARINHAS DE ARMAÇÃO DE BÚZIOS, RIO DE JANEIRO

QUEM FEZ: Associação Amigos do Museu Nacional – Projeto Coral Vivo, com Prefeitura Municipal de Armação dos Búzios, Museu Nacional e Jardim Botânico do Rio de JaneiroPRINCIPAIS ATIVIDADES: Formação e capacitação dos conselhos gestores das UCs, divulgação, demarcação e sinalização das áreas protegidas

Quem caminha pela charmosa Rua das Pedras e olha o belo mar azul celeste de Armação de Búzios, no litoral fluminense, não faz ideia da riqueza biológica que a região, de atratividade turística sem igual, abriga em suas águas. Um exemplo são os corais. Parte desses or-ganismos existentes no município é endêmica ou rara, como a gorgônia (Phyllogorgia dilatata), nativa do Brasil e com limite sul de distribuição na região. Esse coral já figura nas listas oficiais de espécies ameaçadas do Estado do Rio de Janeiro e no Livro Vermelho de espécies ame-açadas do Brasil. “Apesar do risco de extinção, essa gor-gônia ainda está presente em populações significativas em alguns trechos do mar de Búzios”, explica o doutor em biologia Clóvis Castro, professor associado do Mu-seu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador do Projeto Coral Vivo.

As águas de Búzios são objeto de uso intensivo por uma gama variada de atividades, incluindo pesca, turis-mo marítimo de diversas modalidades e esportes náuti-cos, especialmente vela, mergulho e similares. Pelo uso intenso e descontrolado do espaço e dos recursos natu-rais, a questão ambiental vinha sendo negligenciada no balneário – tanto no que diz respeito à preservação dos ecossistemas marinhos, de uma forma geral, quanto aos bancos de corais em particular, atingidos diretamente pela ação antrópica e ameaçados de desaparecimento.

Em 6 de novembro de 2009, foram criadas duas unidades de conservação municipais marinhas em Bú-

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zios: a Área de Proteção Ambiental e o Parque Natural dos Corais. A APA, com 20.830 hectares, abrange litoral e grande parte das águas que circundam o cabo de Bú-zios. O Parque Natural, com área em torno de 56 hecta-res, está localizado dentro da APA e é onde ocorrem as principais formações coralíneas.

O projeto apresentado ao Fundo Costa Atlântica nasceu com o objetivo de consolidar a criação das UCs marinhas de Armação de Búzios. Buscou atuar no seu fortalecimento, por meio da formação e capacitação de seus conselhos gestores e divulgar a existência e os limites das UCs para toda a população, com a demar-cação e sinalização das áreas protegidas. Os conselhos foram criados de forma participativa, através de reuni-ões onde foram apresentados e discutidos seu papel e suas formas de atuação.

A produção de material de divulgação ajudou a formar o conceito da existência das UCs, em especial do Parque dos Corais, para diversos usuários. Esta concre-

Gorgônia ou orelha-de-elefante (Phyllogorgia dilatata), Búzios (RJ).

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tização é especialmente evidente nos conselhos e entre os funcionários da Secretaria de Meio Ambiente e da Pesca do município. “Coincidência ou não, os conflitos com pescadores observados nos primeiros meses após a criação do Parque dos Corais não foram mais relatados”, conta o professor Clóvis Castro.

Segundo ele, a parceria com o Programa Costa Atlântica foi fundamental em diversos aspectos. “Em primeiro lugar, trouxe a credibilidade da Fundação SOS Mata Atlântica ao processo de formação e capacitação dos conselhos das UCs marinhas de Búzios, através de processo de seleção pública do nosso projeto. Além disso, permitiu que o processo de consolidação das unidades, a formação dos conselhos, sua capacitação e outras ativi-dades contassem com recursos financeiros específicos”, diz Castro. O apoio financeiro ao projeto permitiu, por exemplo, a contratação de consultorias, a preparação de manual de consulta para os conselheiros e a preparação e produção de material de divulgação sobre as unidades de conservação para o público em geral. O projeto foi realizado durante os anos de 2010 e 2011.

SERVIÇOS AMBIENTAIS EM ECOSSISTEMAS COSTEIROS: O PAPEL DOS MANGUEZAIS NA MITIGAÇÃO DO AQUECIMENTO GLOBAL

QUEM FEZ: Instituto Marinho para o Equilíbrio Socioambiental – Instituto Marés, com Núcleo de Estudos em Manguezais da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Nema/UERJ) e Reserva Biológica e Arqueológica de GuaratibaPRINCIPAL ATIVIDADE: Quanti�cação e valoração do sequestro de carbono de florestas de mangue

Em tempos de aquecimento global, o papel dos oceanos e de seus ecossistemas associados no processo de “sequestrar” o carbono da atmosfera tem sido cada vez mais alvo de estudos científicos. No Brasil, não é di-

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ferente: um dos estudos nessa linha busca caracterizar o papel dos manguezais no processo de sequestro de car-bono, com vistas a valorar – ou seja, aplicar um valor financeiro – a este serviço ambiental tão importante.

O projeto inscrito no Fundo Costa Atlântica, fruto da parceria entre o Instituto Marés e o Núcleo de Estudos em Manguezais da Universidade do Estado do Rio de Ja-neiro (Nema-UERJ), foi desenvolvido de junho de 2010 a maio de 2011 na Reserva Biológica de Guaratiba, no mu-nicípio do Rio de Janeiro (RJ). Com uma área de aproxi-madamente 36 km2, a Reserva Biológica de Guaratiba é responsável por preservar um dos principais remanescen-tes do ecossistema manguezal no estado do Rio de Janeiro.

O projeto tem como objetivo geral demonstrar a importância do ecossistema para a mitigação do aqueci-mento global, por meio de sua função como armazena-dor e sequestrador de carbono. Utilizando o manguezal da Reserva Biológica de Guaratiba como modelo, o esto-que de carbono armazenado na parte aérea da vegetação e as taxas de sequestro de carbono foram quantificados. Com base nessa quantificação, foi realizada a valoração do serviço ambiental de sequestro de carbono pelas flo-restas de mangue, através da aplicação do valor de mer-cado do carbono às taxas de sequestro encontradas 16 .

“A tradução desses valores em termos monetários (valoração) ainda está em processo de elaboração. Entre-tanto, os valores de estoque e sequestro de carbono por si só já demonstram a importância dos manguezais como armazenadores de carbono na zona costeira”, afirma Es-trada. Ele destaca que a qualidade técnica e a relevância do projeto foram reconhecidas pelo Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas durante a IV Conferência Regional sobre Mudanças Globais, em abril de 2011. Nessa oca-sião, o trabalho intitulado “Quantificação do Estoque de Carbono em Florestas de Mangue: Desenvolvimento de Modelo Alométrico para Estimativa da biomassa aérea de Avicennia schaueriana” foi premiado como um dos cinco melhores dentre os apresentados.

16 Conforme explica o pesquisador Gustavo Duque Estrada, do Instituto Marés, os resultados obtidos pelo projeto indicam que os manguezais armazenam grande quantidade de carbono em sua vegetação (entre 21,7 e 74,5 tC.ha-1). As taxas de sequestro de carbono que resultam nesse estoque oscilam espacialmente e dependem da dinâmica das florestas, oscilando entre a liberação de 7,5 tC.ha-1.ano-1 até o sequestro de 8,0 tC.ha-1.ano-1.

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Segundo Estrada, o apoio do programa Costa Atlântica foi essencial para a realização deste projeto, tanto pelo suporte financeiro quanto pelo apoio institu-cional. “Como exemplo de apoio institucional, podemos citar o convite para expormos o projeto no Viva a Mata 2010 e 2011”, enumera.

VIDAMANGUE: PROGRAMA DE FORMAÇÃO DE MONITORES AMBIENTAIS LOCAIS DE ÁREAS DE MANGUEZAIS, SÃO FRANCISCO DO SUL, SANTA CATARINA

QUEM FEZ: Instituto Vidamar com Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina (Campus Itajaí), Corpo de Bombeiros de São Francisco do Sul e ICMBioPRINCIPAIS ATIVIDADES: Diagnósticos participativos, curso de formação de condutores, visitas e atividades práticas com a comunidade

O município de São Francisco do Sul, no litoral ca-tarinense, é banhado pela Baía da Babitonga, região que concentra a última grande ocorrência, no Sul do Brasil, do ecossistema de manguezal. A área, prioritária para a criação da primeira reserva de fauna do Brasil, possui fragmentos importantes desse ecossistema e vem sofren-do constantes impactos ambientais, provocados pela pesca predatória, turismo desordenado e, especialmente, pela especulação imobiliária.

O objetivo do projeto Vidamangue foi promover a integração da comunidade com esse ambiente, na pers-pectiva de conservá-lo, através do desenvolvimento das atividades de ecoturismo e de educação ambiental.

Nesse sentido, buscou-se a realização de um proje-to baseado em metodologias participativas, promoven-do o desenvolvimento local a partir da participação da comunidade, na localidade da Vila da Glória. Essas me-todologias contemplaram a realização de diagnósticos participativos, curso de formação de condutores, visitas

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e atividades práticas, e envolvimento da comunidade local. Foi realizado um curso de formação na comuni-dade, com o objetivo de formar Condutores Ambientais Locais, com a parceria de instituições como o Instituto Federal de Santa Catarina – Campus Itajaí. A partir da realização do curso, buscou-se estimular a atividade de ecoturismo, como forma de promover o conhecimento e a conservação dos manguezais existentes no local e a criação da Reserva de Fauna da Babitonga.

“Este projeto proporcionou o entendimento das re-lações da comunidade com o lugar onde vive, estimulan-do o conhecimento e a conservação dos ambientes natu-rais, especialmente o manguezal”, conta Renata Acauan, coordenadora do Vidamangue. Esse novo olhar deu ori-gem, explica Renata, ao planejamento de uma alternati-va de renda que integrasse desenvolvimento econômico local e conservação ambiental e cultural.

Ao final do curso, 21 moradores da comunidade fo-ram formados Condutores Ambientais Locais, em um cur-

Treinamento de monitores ambientais em São Francisco do Sul (SC).

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so teórico prático, com duração de 160 horas, realizado em parceria com o Instituto Federal de Santa Catarina. Os con-dutores estão aptos a atuar na atividade ecoturística na sua comunidade e em locais com características semelhantes à Vila da Glória. O projeto envolveu diretamente pelo menos outras 50 pessoas nas atividades; através das atividades edu-cativas e de divulgação, estima-se que tenha alcançado um público superior a 500 pessoas, a partir da ação dos con-dutores e dos materiais distribuídos no município e região.

“A parceria da Fundação SOS Mata Atlântica foi de fundamental importância para a realização do Projeto, pois forneceu os subsídios necessários para o seu início e o apoio para sua continuidade”, ressalta a coordenadora.

A primeira fase de execução contou com um esfor-ço de divulgação do projeto, quando foram realizadas oito saídas a campo, com visitas a escolas, associações de moradores, igrejas, estabelecimentos comerciais e nas próprias áreas de manguezal. Para auxiliar nos tra-balhos, foi elaborado um folder contendo informações sobre o projeto, o ambiente local (Manguezais e Baía de Babitonga), o curso e um convite para ele. Na oportuni-dade, também foi realizado um diagnóstico sobre a per-cepção da comunidade com relação à importância dos manguezais e o potencial turístico da região.

Quarto edital: consolidação de unidades de conservação

Em 2010, a Fundação SOS Mata Atlântica deu prosseguimento ao Fundo Costa Atlântica, com o lança-mento do IV Edital, que destinou R$ 200 mil para pro-jetos com foco na criação e consolidação de unidades de conservação marinhas e para iniciativas de conservação e uso sustentável de ambientes marinhos e costeiros. O patrocínio para os cinco novos projetos escolhidos veio da Bradesco Capitalização, Fundação Toyota do Brasil e Repsol. Essas iniciativas estão em fase de execução.

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SOS CARAMUANAS: DIAGNÓSTICO RÁPIDO PARTICIPATIVO PARA A CRIAÇÃO DE UMA ÁREA MARINHA PROTEGIDA NOS RECIFES DE CORAL DAS CARAMUANAS, BAHIA

QUEM FEZ: Organização Sócio Ambientalista Pró-marPRINCIPAIS ATIVIDADES: Diagnóstico da pesca na região, negociações com poder público para criação de UC e apoio à criação de Associação de Marisqueiras e Pescadores

Promover o diagnóstico da pesca e documenta-ção para a formalização de pedido da criação de uma área marinha protegida: essas foram as linhas prioritá-rias de ação do Projeto SOS Caramuanas, que se pro-pôs a renovar o estoque pesqueiro local e conservar os recifes de coral na Ilha de Itaparica, Bahia. Assim, pos-sibilitou definir quais as formas de uso do Recife das Caramuanas, próximo à localidade de Aratuba, devem ser resguardadas de impactos humanos. A iniciativa faz parte do Projeto SOS Caramuanas, executado de janeiro de 2011 a abril de 2012 pela Organização Só-cio Ambientalista Pró-Mar, com o apoio do Programa Costa Atlântica.

Entrevista com pescador para diagnóstico da pesca na Ilha de Itaparica (BA).

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A região das Caramuanas, localizada no município de Vera Cruz, possui cerca de 2 km de diâmetro e é de grande importância para o ecossistema, pois é um dos recifes mais próximos da costa baiana. Apresenta grande cobertura de corais, enorme riqueza ecológica e abun-dância de espécies marinhas. O local sofre, há décadas, os efeitos da pesca predatória, incluindo o uso de explo-sivos e compressor, ainda frequentes na região.

A ideia de criação de áreas marinhas protegidas na Ilha de Itaparica surgiu em 2007 a partir das queixas dos pescadores da região: os peixes estavam ficando cada vez mais escassos. “A Pró-Mar realizou estudos e detectou a relevância ecológica da área, principalmente para os mo-radores da região de Aratuba, que são quem mais utiliza o recife”, afirma a bióloga Priscilla Malafaia, coordena-dora do Projeto. “Buscamos incentivar a criação de áreas marinhas protegidas e promover a gestão dos recursos pesqueiros de forma participativa”, acrescentou.

Com poucos meses de projeto, foi possível obter grandes resultados, como a promoção do diagnóstico da pesca na região, o apoio da população, o sucesso de ne-gociações com o poder público, além do auxílio na cria-ção da Ampa 17 .

De acordo com o presidente da Ampa, Antonio Nunes de Brito, conhecido como Cutia, o projeto foi de suma importância para a atividade pesqueira. “Quere-mos de volta aquela pescaria maravilhosa de anos atrás. A gente nem se preocupava, porque não faltava peixe”, revelou o presidente, que pesca na área há 40 anos.

Apesar do engajamento do líder da Ampa, a postu-ra pouco participativa dos pescadores locais nos encon-tros consultivos foi o ponto de maior dificuldade encon-trado pela Pró-Mar. Atribui-se ao tímido envolvimento o escasso conhecimento sobre o tema áreas marinhas pro-tegidas, bem como a falta de costume da participação popular em processos de mobilização.

Como estratégia para atrair a participação da co-munidade, foram utilizados banners informativos, bonés,

17 Associação das Marisqueiras e Pescadores de Aratuba.

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cartilhas ilustrativas, cartazes e carro de som. Além dis-so, foram traçados planos de ação direcionados a mídia e entidades públicas de potencial interesse no assunto.

Após as oficinas, decidiu-se não criar uma nova uni-dade de conservação marinha, visto que a área de interes-se está inserida em outras duas UCs. Porém, baseando-se no diagnóstico de pesca, um Acordo de Pesca foi firmado e enviado ao Ibama para apreciação técnica e jurídica, o qual é um instrumento importante para o ordenamento pesqueiro. A Pró-Mar, no entanto, continuará com a rea-lização de ações para a criação e implementação da Área Marinha Protegida no Recife das Caramuanas Leste--Sudeste com as comunidades que aderiram à proposta.

CAPACITAÇÃO DO CONSELHO CONSULTIVO E ELABORAÇÃO DO PLANO DE AÇÃO INICIAL PARA AS RECÉM-CRIADAS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO MARINHAS APA COSTA DAS ALGAS E REVIS DE SANTA CRUZ, ESPÍRITO SANTO

QUEM ESTÁ FAZENDO: Associação Ambiental Voz da Natureza, com Núcleo de Unidades de Conservação do Espírito Santo (ICMBio), Laboratórios de Ictiologia e Oceanogra�a Geológica da Universidade Federal do Espírito Santo, Laboratório de Ficologia da Universidade Federal de Santa CatarinaATIVIDADES EM ANDAMENTO: Realização de o�cinas e mapeamento do Conhecimento Ecológico Tradicional

O objetivo desse projeto, que já havia sido contem-plado no II Edital 18 do Fundo Costa Atlântica, foi criar subsídios para a elaboração de um plano de ação inicial para duas recém-criadas unidades de conservação ma-rinha no Espírito Santo: a Área de Proteção Ambiental Costa das Algas e o Refúgio de Vida Silvestre de Santa Cruz, ambas localizadas entre os municípios capixabas de Serra e Aracruz. Também teve o objetivo de capacitar o conselho consultivo das UCs.

18 Ver pág. 41.

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Foram realizadas três oficinas participativas com pescadores de sete comunidades. As oficinas tiveram, em um primeiro momento, o objetivo de capacitação dos pescadores em relação à criação das UCs, seus benefí-cios, formas de uso, mobilização social e importância do conselho consultivo. E um segundo momento, foi trabalhado o mapeamento do Conhecimento Ecológico Tradicional dos pescadores, informação que subsidiará o plano de ação inicial. Com os pescadores, foram le-vantadas informações baseadas no conhecimento eco-lógico desses profissionais, como os tipos de fundo do mar onde a pesca é realizada (fundo arenoso, calcário ou consolidado – informações que são relevantes para localizar recursos pesqueiros específicos e para atracar navios), áreas de relevância ambiental e conflitos exis-tentes. Paralelamente ao planejamento e realização das oficinas, levantamentos de dados ambientais primários e secundários foram efetuados. As informações reunidas deverão compor o Plano de Ação Inicial das UCs, que deve ser finalizado em 2013.

O�cina participativa com pescadores da APA Costa das Algas.

© Thiago J. F. Costa

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FERRAMENTA INTERATIVA PARA APOIAR A GESTÃO DA RESERVA EXTRATIVISTA MARINHA DE ARRAIAL DO CABO, RIO DE JANEIRO

QUEM ESTÁ FAZENDO: Fundação Coordenação de Projetos, Pesquisas e Estudos Tecnológicos (Coppetec), com Reserva Extrativista Marinha de Arraial do Cabo (ICMBio), Colônia de Pescadores Z5, Associação da Reserva Extrativista de Arraial do Cabo (Aremac), Fundação de Meio Ambiente, Pesquisa, Ciência e Tecnologia – Arraial do Cabo, Secretaria Municipal de Educação de Arraial do CaboATIVIDADES EM ANDAMENTO: Formação de multiplicadores em ferramentas interativas de auxílio à educação ambiental e ao manejo participativo da Resex

Arraial do Cabo, no litoral Norte fluminense, é uma das raras localidades no Brasil em que é possível verificar o fenômeno da ressurgência, ou afloramento (upwelling), que consiste na subida de águas profundas, ricas em nutrientes, para regiões menos profundas do oceano. Essa característica especial tornou a região uma das mais piscosas e de maior biodiversidade da costa bra-sileira, o que proporcionou, durante décadas, o sustento para milhares de famílias que vivem da pesca artesanal.

Criada em 1997, a Reserva Extrativista Marinha de Arraial do Cabo nasceu para resguardar a presença mile-nar da pesca artesanal e assegurar o uso sustentável dos recursos da biodiversidade na região. Agora, o desafio é engajar os atores locais, principalmente os pescadores, no planejamento do manejo participativo dos recursos que o mar oferece. O momento é precioso, já que o litoral norte do Rio de Janeiro já enfrenta desafios para manter a integridade de seus ecossistemas, como a pesca indus-trial de arrastão, o crescimento desordenado do turismo náutico, a bioinvasão (chegada de espécies exóticas) em razão da intensificação do tráfego naval da exploração petrolífera offshore na Bacia de Campos. E com as des-cobertas de gigantescas jazidas de hidrocarbonetos no

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pré-sal da mesma Bacia, os desafios rumo ao desenvol-vimento sustentável da região só tenderão a aumentar.

O projeto escolhido pelo Fundo Costa Atlântica tem como objetivo formar multiplicadores em design de ferramentas interativas de auxílio à educação ambiental e ao manejo participativo dos recursos marinhos na Re-serva Extrativista. A ideia é abrir caminho para a nova tendência da Etnoconservação, que é a cooperação entre os conhecimentos ecológicos científicos e os tradicionais, que pertencem aos pescadores artesanais, na elaboração do plano de manejo da UC.

Já foram realizadas duas reuniões de trabalho para estruturação da equipe técnica, formalização das parcerias, elaboração de duas matrizes de planejamen-to estratégico, a ementa do curso para formação de multiplicadores em planejamento de manejo participa-tivo de áreas marinhas protegidas, um estudo para o compartilhamento de conceitos-chave na equipe técni-ca e nas atividades pedagógicas do curso e apresenta-

Resex Marinha Arraial do Cabo (RJ).

© Leo Francine

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ção da metodologia durante o 1° Simpósio Nacional de Gestão Sustentável de Ecossistemas Aquáticos em Ar-raial do Cabo, em março de 2012. Em breve, o projeto deverá contar também com ferramentas interativas de auxílio ao planejamento das atividades da UC, como maquetes interativas, protótipo de rede virtual e um programa de oficinas.

SENSIBILIZAÇÃO DAS COMUNIDADES PARA O USO SUSTENTÁVEL DOS RECURSOS NATURAIS NA ILHA GRANDE DE SANTA ISABEL, PIAUÍ

QUEM FEZ: Comissão Ilha Ativa, com APA Delta do Parnaíba (ICMBio), Universidade Estadual do Piauí, Semar – Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Piauí, Secretaria Municipal de Meio Ambiente de Ilha Grande, Câmara de Vereadores de Ilha GrandePRINCIPAIS ATIVIDADES: Levantamento e Mapeamento das atividades extrativistas na região

O projeto executado pela Comissão Ilha Ativa (CIA), em Parnaíba, no litoral do Piauí, de janeiro a de-zembro de 2011, elaborou um diagnóstico sobre o uso dos recursos naturais utilizados pelas comunidades de Ilha Grande de Santa Isabel e áreas de entorno, conside-rando seu contexto socioambiental e econômico, contri-buindo para participação ativa da população no proces-so de conservação e preservação ambiental.

Especificamente, realizou um levantamento e mape-amento das atividades extrativistas presentes na área, fo-mentando uma cartilha, lançada em 2012 durante o Viva a Mata, que serve como importante fonte de informações para a provável estruturação da Reserva Extrativista do Cajuí. Em 2007, a Comissão Ilha Ativa requereu a criação da Resex, com o objetivo de proteger a população tradi-cional da região dos problemas trazidos pelo turismo de-sordenado e pela especulação imobiliária. A implantação

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da Resex formaria um mosaico importante de ecossiste-mas preservados, pois na região já existem a APA Delta do Parnaíba e a Resex Marinha Delta do Parnaíba.

Foram mapeados os principais recursos naturais extraídos pelas comunidades residentes e usuárias, com-postos pela vegetação nativa (principalmente o cajuí, Anacardium ssp.), crustáceos, moluscos e peixes.

Com o incentivo do projeto, por meio do workshop realizado em agosto de 2011, foi criada uma comissão com representantes de todas as comunidades para mo-tivar ações concretas que visassem ao fortalecimento da proposta de conservação dos recursos naturais e do modo de vida da população residente e/ou usuária da Ilha Grande de Santa Isabel. As oficinas para apresentar a proposta de criação da Resex aos moradores atraíram 180 pessoas.

Dentre as dificuldades encontradas pode-se citar a falta de articulação dos grupos para realização das reu-niões de sensibilização e oficinas de mapeamento, por causa de desinteresse em participar de reuniões; baixa relação de confiança entre técnicos e comunidade; e a não compreensão sobre o que seriam unidades de con-servação. Houve desmotivação da população em relação à criação da Resex, pois entre o pedido de sua criação e o projeto se passaram três anos, dificultando uma reto-mada das discussões pelas comunidades, exceto na praia Pedra do Sal, onde há constante disputa territorial com a especulação imobiliária.

O apoio do Programa Costa Atlântica ao projeto foi fundamental para retomar a discussão sobre a prote-ção do território, visando a garantir o meio de vida des-sas comunidades extrativistas. Nas palavras do catador de caranguejo Raimundo Padindin, “antigamente a terra era liberta, não tinha cerca”.

A criação da Resex do Cajuí poderá resolver o pro-blema de acesso ao território, aos recursos existentes, propondo preservá-los por meio de planos de manejo e alternativas de renda para as populações extrativistas.

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MONITORAMENTO E CONSERVAÇÃO DOS SÍTIOS REPRODUTIVOS DAS ANDORINHAS-DO-MAR NAS ILHAS COSTEIRAS DO ESPÍRITO SANTO

QUEM FEZ: Associação Vila-Velhense de Proteção Ambiental (Avidepa), com Instituto Estadual do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos (Iema)PRINCIPAIS ATIVIDADES: Expedições às ilhas costeiras do Espírito Santo para monitoramento das aves e consolidação da base de dados

O projeto vem sendo desenvolvido pela Associação Vila-velhense de Proteção Ambiental desde 1988, visando à conservação das ilhas costeiras do Espírito Santo.

As ilhas do Espírito Santo são um dos locais mais importantes para a conservação das andorinhas-do-mar--de-bico-amarelo (Thalasseus acuvlavidus) e das ando-rinhas-do-mar-do-bico-vermelho (Sterna hirundinacea), pois reúnem uma das maiores populações em idade de reprodução do Atlântico Sul.

O projeto contribui com a conservação dos sítios reprodutivos das andorinhas-do-mar nas ilhas costeiras do Espírito Santo e com sua integração às cidades como elemento paisagístico e cultural, permitindo a melhoria da qualidade de vida dos moradores e visitantes, através do es-tabelecimento de uma relação harmônica com a Natureza.

Foram realizadas 24 expedições às ilhas costeiras do Espírito Santo. No primeiro semestre, a Avidepa mo-nitorou as ilhas Itatiaia (Vila Velha), as ilhas Galheta (Vitória), a ilha da Raposa e Escalvada (Guarapari) e a ilha Branca (Marataízes) durante a temporada de mi-gração das andorinhas-do-mar-de-bico-amarelo e das andorinhas-do-mar-de-bico-vermelho para reprodução. A organização também desenvolveu ações de orientação e informação educativa aos visitantes, principalmente nas ilhas Itatiaia, onde a visitação ocorre com maior fre-quência. As ações de divulgação do projeto ocorreram com a fixação de cartazes em escolas e linhas de ônibus

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da região. Foram realizadas 44 expedições para as ilhas no período de outubro de 2010 e agosto de 2011, atingin-do um total de 178 visitantes. Foi feita ainda a revisão e atualização de todas as informações sobre anilhamento e recuperação das andorinhas-do-mar em colônias repro-dutivas no Espírito Santo registrados no Sistema Nacio-nal de Anilhamento entre 1988 e 2010.

Mas um fato surpreendeu os pesquisadores. Como ocorreu raramente em temporadas anteriores, durante os anos de 2011 e 2012 as colônias reprodutivas de andori-nhas-do-mar não se fixaram nas ilhas costeiras do Espí-rito Santo. O fato levou à diminuição do esforço de di-vulgação, apresentações ao público escolar e orientação e informação educativa aos frequentadores das praias e orla. Pelo mesmo motivo, houve pouco acréscimo de informações ao banco de dados referentes à temporada reprodutiva de 2011 e 2012.

“O apoio da Fundação SOS Mata Atlântica neste período foi fundamental para evitar a interrupção do tra-balho de monitoramento e garantir assim que os dados coletados tenham consistência ao serem tratados para entendermos a dinâmica populacional das espécies estu-dadas, permitindo a elaboração de propostas de conser-vação”, diz César Musso, diretor executivo da Avidepa.

Colônia de reprodução nas Ilhas Itatiaia. Ao fundo, orla de Vila Velha (ES).

© Cesar M

usso/Arquivo Avidepa

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Vem mais por aíOs bons resultados colhidos ao longo desses cinco

anos de existência do Fundo Costa Atlântica mostram que o caminho escolhido pela SOS Mata Atlântica de fortalecer as unidades de conservação marinhas e fomentar estratégias de desenvolvimento comunitário com respeito aos ecossistemas é auspicioso, mas há muito a avançar. Em agosto de 2012, foi lançado o V Edital 19 , com recursos do Bradesco Capitalização, Repsol Sinopec e Anglo American em apoio a mais sete projetos, que continuam a fortalecer as ONGs, universidades, institutos de pesquisa e os órgãos gestores das unidades de conservação, mas agora possibilitando também que empresas de consultoria participem do Programa Costa Atlântica.

19 Ver no capítulo 5 – Mar a vista! – novos projetos da SOS Mata Atlântica, pág. 157.

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e os órgãos gestores das unidades de conservação, mas agora possibilitando também que empresas de consultoria participem do Programa Costa Atlântica.

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Ilhas das Peças, Parque Nacional do Superagui, Guaraqueçaba (PR). © Zig Koch

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75SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

A realidade brasileira mostra que, para se preservar o patrimônio ecológico, não basta que uma região considerada de importante interesse ambiental seja

transformada em uma unidade de conservação. A experiên-cia prática mostra que o dia a dia de uma UC, até sua imple-mentação efetiva, com a definição do seu plano de manejo e o ordenamento das atividades, é cercado de dificuldades. Há desafios de ordem financeira (nem sempre há recursos públicos suficientes para custear as atividades de uma área de preservação), de ordem burocrática e até política – mui-tas vezes a criação de reservas e parques contrariam inte-resses locais, o que acaba gerando conflitos de toda ordem.

Quando a SOS Mata Atlântica definiu sua estratégia de trabalhar com a conservação de ambientes marinhos e costeiros, em 2006, com o Programa Costa Atlântica 1 , um dos focos era fomentar projetos de implementação de UCs marinhas por meio de editais públicos através do Fun-do Costa Atlântica. A segunda vertente do programa foi a criação do Fundo Pró-Unidades de Conservação Marinhas.

O Fundo Pró-Unidades de Conservação Marinhas é um fundo de perpetuidade – do inglês endowment fund. Trata-se de um mecanismo financeiro onde o dinheiro rece-bido de doações de pessoas físicas e jurídicas é aplicado e os rendimentos dessa aplicação financeira apoiam as ativida-des de conservação ambiental, filantropia, pesquisas cien-tíficas, entre vários outros exemplos. Esse expediente tem sido utilizado por organizações ambientalistas e filantrópi-cas em diferentes países, inclusive no Brasil, com sucesso.

Fundo Pró-Unidades de Conservação Marinhas

3

1 Ver O Programa Costa Atlântica: hora de agir, pág. 29.

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O primeiro

A ideia de usar o mecanismo do fundo patrimo-nial, ou fundo de perpetuidade, para custear programas de conservação ambiental teve início na cabeça de Ro-berto Klabin, presidente da SOS Mata Atlântica. Liga-do ao meio empresarial, Klabin tomou conhecimento de iniciativas semelhantes e pensou em trazer o meca-nismo para a ONG, com o objetivo de auxiliar na ges-tão de UCs brasileiras.

Assim, foi definida a estratégia do Fundo Pró--Unidades de Conservação Marinhas com o ideal de aprimorar a gestão e garantir a sustentabilidade de áre-as marinhas que já são protegidas por lei, mas que en-frentam enormes desafios para sua sobrevivência devido à escassez financeira. Assim, uma fonte permanente de recurso auxiliaria UCs em sua gestão, como no custeio de despesas com transporte, melhoria da infraestrutura

Rebio Atol das Rocas, primeira UC bene�ciada pelo Fundo Pró-Unidades de Conservação.

© M

ario Haberfeld

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para abrigar pesquisadores e continuidade em projetos para levantamento socioambiental da região em torno das UCs. O órgão gestor da UC, segundo o desenho do Fundo, ficaria responsável também por oferecer uma contrapartida financeira.

Não por acaso, a primeira UC a ser beneficiada com o Fundo Pró-Unidade de Conservação foi a primei-ra reserva biológica marinha criada legalmente no Brasil, em 1979: a Rebio Atol das Rocas, um dos maiores santu-ários ecológicos do país.

O Atol das Rocas, situado a 148 km do arquipéla-go de Fernando de Noronha, no Oceano Atlântico, é um refúgio para mais de 150 espécies de aves. Além disso, outras espécies importantes e ameaçadas de extinção, como tartarugas-marinhas, lagostas e tubarões, utilizam o Atol para reprodução.

Apesar de ter sido criada por um Decreto Federal, o Atol amargou por vários anos os problemas da falta de recursos públicos e uma infraestrutura demasiada-mente precária para amparar as atividades de gestão e pesquisa. Hoje, após a criação do Fundo Atol das Rocas, essa realidade mudou consideravelmente: com infraestrutura renovada, a UC abriga todos os anos de-zenas de pesquisadores brasileiros, que escolheram a área para fazer estudos aprofundados nas áreas de bio-logia, conservação, meteorologia, entre outros campos do conhecimento.

Dos estudos hoje realizados no Atol das Rocas, pode sair até a cura para a Aids, além de pesquisas impor-tantes para se entender os efeitos do aquecimento global nos oceanos. Mas isso é tema do próximo capítulo 2 .

A experiência com o uso de um fundo patrimonial voltado à conservação, iniciada com o Atol das Rocas, fortaleceu e inspirou a SOS Mata Atlântica a seguir por esse caminho, consolidando a experiência do Fundo Pró--Unidades de Conservação Marinhas. Como veremos a seguir, mais recursos foram captados e novas áreas estão sendo beneficiadas.

2 A história da criação da UC do Atol das Rocas e de como a SOS Mata Atlântica escolheu trabalhar com o local é tão impactante que mereceu um capítulo especial, Atol das Rocas: onde tudo começou, pág. 99.

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Plantando florestas no mar

A colaboração das pessoas físicas, como voluntá-rias e doadoras, tem sido imprescindível para que a SOS Mata Atlântica desempenhe suas atividades desde 1986, quando foi fundada. Isso fi cou mais do que claro quan-do, em 2008, uma pessoa procurou a Fundação com um objetivo em mente: fazer uma doação em dinheiro para “ajudar o meio ambiente”.

Não era uma doação como outra qualquer. A pes-soa em questão, cujo nome preferiu manter no anonima-to, tinha a fi rme intenção de doar nada menos do que o valor correspondente a 1 milhão de dólares para apoiar projetos de conservação ambiental, na época equivalen-tes a R$ 1,7 milhão. O acerto dos termos da doação foi feito junto a Roberto Klabin, que propôs ao doador algo que soaria inusitado.

Berçários naturaisOs manguezais são ecossistemas riquíssimos em

nutrientes e considerados berçários naturais para uma in nidade de espécies, como crustáceos e peixes. Especialmente por essa razão, fornecem sustento para milhares de famílias em todo o Brasil. Além disso, são também grandes reservatórios de CO2, o principal gás responsável pelo efeito estufa. Ao mesmo tempo, estão cada vez mais ameaçados pela poluição, desmatamento, empreendimentos portuários, pesca predatória, expansão de atividades de criação de camarão, expansão da ocupação humana, entre outros problemas.

Berçários naturaisOs manguezais são ecossistemas riquíssimos em

nutrientes e considerados berçários naturais para uma in nidade de espécies, como crustáceos e peixes. Especialmente por essa razão, fornecem sustento para milhares de famílias em todo o Brasil. Além disso, são também grandes reservatórios de CO2, o principal gás responsável pelo efeito estufa. Ao mesmo tempo, estão cada vez mais ameaçados pela poluição, desmatamento, empreendimentos portuários, pesca predatória, expansão de atividades de criação de camarão, expansão da ocupação humana, entre outros problemas.

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79SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

– Que tal plantar florestas no mar? – disse Klabin ao anônimo futuro doador.

Ele, por sua vez, indagou: – E isso é possível?– Claro que sim: manguezais! – respondeu Klabin.

O argumento de que é viável “plantar florestas no mar” seduziu o doador dos recursos. Estava plantada a semente do novo fundo patrimonial que nasceria dali. Em 2008, surgiu o Fundo Guanabara, voltado a apoiar a Estação Ecológica da Guanabara, sendo que R$ 200 mil foram destinados para atividades e ações emergenciais e R$ 1,5 milhão foi aplicado no Fundo, cujo saldo atual está na casa de R$ 1,8 milhão. E como o próprio nome indica, o Fundo Guanabara já tinha um destino certo: auxiliar a gestão de um importantíssimo remanescente de manguezais na Baía de Guanabara, distante pouco mais de 50 minutos do centro do Rio de Janeiro. Sim, a Cidade Maravilhosa, dentro de sua região metropolita-na, mantém preservado por lei um igualmente maravi-lhoso remanescente de manguezal.

A Estação Ecológica (Esec) da Guanabara, com área de 1.935 hectares, foi criada em 2006 e está locali-zada no interior da APA 3 de Guapimirim, uma impor-tante unidade de conservação federal responsável pela proteção de manguezais na Baía de Guanabara.

A APA está localizada bem no Recôncavo da Baía da Guanabara, onde se pode encontrar um paraíso eco-lógico com alguns dos últimos remanescentes de man-guezal da baía. Com aproximadamente 14 mil hectares, a APA de Guapimirim foi a primeira UC brasileira criada especificamente para proteger manguezais 4 .

Esta rara área da Mata Atlântica preservada está localizada num vale formado pela base do Pico do Dedo de Deus, no Parque Nacional da Serra dos Órgãos, fazen-do limite com os municípios de Teresópolis, Petrópolis (norte), Itaboraí, fundos da Baía de Guanabara (sul), Ca-choeiras de Macacu (leste) e Magé (oeste).

3 Área de Proteção Ambiental.

4 Decreto Federal no 90.225, de 25 de setembro de 1984.

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Na área, pesquisadores registraram a ocorrência de bosques de manguezais primários, o que justificou a criação da Esec Guanabara, que tem gestão compar-tilhada com a APA de Guapimirim. Assim, foi possível conciliar áreas de proteção integral (núcleo) com locais de uso sustentável (o anel externo da UC), onde são realizadas atividades de pesquisa, palestras e visitas guiadas, expedições escolares, entre outras. E, por ou-tro lado, embora o Fundo seja específico para a Esec Guanabara, a APA também vem sendo beneficiada de forma integrada.

A SOS Mata Atlântica viu no fortalecimento das UCs uma grande oportunidade para expandir sua atu-ação no mar e nas regiões costeiras. Como as equipes nessas duas UCs trabalham de forma integrada e ocu-pam a mesma estrutura administrativa e sede, no in-terior das UCs, os rendimentos do Fundo Guanabara têm permitido aos gestores da Esec e da APA garantir um fluxo adicional de recursos, que ajuda a custear melhorias de infraestrutura para fiscalização e análise ambiental; tem possibilitado o fomento à pesquisa so-bre pesca amadora na área, promoção de atividades de voluntariado e educação ambiental, além da estrutura-ção de um quarentenário para animais silvestres, já que a APA recebe animais silvestres que aparecem em áreas urbanas no entorno das UCs.

Para Breno Herrera, ex-chefe da APA de Guapi-mirim, a parceria tem sido bem-sucedida. “Ela (par-ceria) nos ajudou porque os aportes de recursos orça-mentários passam por desníveis ao longo do ano. O orçamento público segue o calendário administrativo e nós seguimos o calendário da natureza”, explica Her-rera. “O Fundo Guanabara e a parceria com a SOS Mata Atlântica, no âmbito financeiro, nos dão a segu-rança de poder projetar as nossas atividades de gestão ambiental ao longo do ano e saber que aquele recurso não vai passar pelas oscilações que são comuns ao flu-xo orçamentário público”, afirma.

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81SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

Resistência ambientalParece difícil acreditar, mas navegar pelos rios que

compõem a APA é como voltar 500 anos na história do Brasil. Os canais sinuosos deixam antever a rica fauna que habita a região: garças, socós, colhereiros, siris de várias espécies. Os animais nascem e crescem no mangue, para depois se espalharem pelo litoral e servirem de base para o sustento de 3 mil pescadores e suas famílias.

Juntas, as duas áreas se tornaram o maior símbolo de resistência ambiental da Baía de Guanabara. Todo o entorno sofreu intensamente com os processos de urbanização e industrialização desenfreadas que se concentraram na região metropolitana do Rio de Janeiro e também nas regiões de São Gonçalo e Niterói, do outro lado da baía. As UCs protegem o modo de vida de comunidades que tiram seu sustento dos manguezais, bem como são importante polo de preservação de espécies típicas do ecossistema, como o jacaré-do-papo-amarelo (Caiman latirostris), aves e caranguejos.

sofreu intensamente com os processos de urbanização e industrialização desenfreadas que se concentraram na região metropolitana do Rio de Janeiro e também nas regiões de São Gonçalo e Niterói, do outro lado da baía. As UCs protegem o modo de vida de comunidades que tiram seu sustento dos manguezais, bem como são importante polo de preservação de espécies típicas do ecossistema, como o jacaré-do-papo-amarelo (Caiman latirostris), aves e caranguejos.

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O ex-gestor da APA de Guapimirim, um apaixo-nado pela região, elenca com orgulho alguns dos prin-cipais feitos que a parceria tem permitido. Um deles foi a realização do primeiro encontro de pesquisadores da APA: mais de 40 linhas de pesquisa são conduzidas nos manguezais de Guapimirim.

As atividades de monitoramento do jacaré-de-pa-po amarelo também trazem satisfação: os animais são estudados e vários indivíduos ganharam chips, e vêm sendo sistematicamente acompanhados por biólogos. Na prática, isso estancou a caça e está permitindo uma recuperação das populações de indivíduos da espécie. “Estamos encontrando vários animais jovens, o que é um claro indício de recuperação da espécie”, comemo-ra Herrera.

E não são apenas as populações de jacarés que estão ganhando fôlego. O próprio manguezal está se recuperando nos trechos em que havia passado por al-

Manguezal da APA Guapimirim, Esec Guanabara.

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cervo APA

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terações antrópicas. Isso graças à criação propriamen-te dita das UCs e aos mutirões de reflorestamento que vêm sendo organizados, também no âmbito da parce-ria do ICMBio com a SOS Mata Atlântica.

“Nos últimos dez anos a APA de Guapimirim apresentou um aumento da cobertura vegetal, contra-riando tendências de diminuição por causa da pressão humana”, diz Herrera. Isso pode ser comprovado pe-las imagens dos satélites do Inpe 5 , que monitoram os remanescentes florestais e compõem o Atlas da Mata Atlântica. 6

A valorização e o fortalecimento dessas UCs são cada vez mais necessários, pois, mesmo protegidas por lei, essas áreas de remanescentes da Mata Atlântica não estão livres de ameaças. Atualmente, o principal desafio para a integridade das UCs é a retomada da industrialização na parte ao fundo da Baía de Gua-nabara, a única região que ainda não havia recebido projetos industriais de grande magnitude. O setor de petróleo e derivados está se estabelecendo na área, que deve abrigar o Comperj 7 , provavelmente o maior gru-po de empresas petroquímicas da América Latina.

O complexo é o maior investimento do PAC 8 no Estado do Rio e ficará a nada menos que 9 km a mon-tante da APA. A preocupação com o fato dos poluentes chegarem aos rios da APA já tira o sono dos pescadores e catadores de caranguejo, que temem pelo seu modo de vida.

“Junto com os empreendimentos de refino de pe-tróleo vem a infraestrutura associada: redes de dutos, novos sistemas viários, sistemas de adução de água, sistema de descartes de efluentes. Todos esses empreen-dimentos vão trazer profundas alterações ambientais, geográficas, econômicas e sociais. O desafio é manter a qualidade ambiental frente a essa nova leva de indus-trialização que está chegando. É importante a natureza estar bem preservada. Ela não pode ficar refém dos in-teresses econômicos”, resume Herrera.

5 Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais.

6 O Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica tem como objetivo mapear e monitorar a situação da Mata Atlântica e seus ecossistemas associados. A iniciativa é marcada por um convênio pioneiro entre a Fundação e o Inpe. Sua primeira edição, lançada em 1990, revelou a gravidade da situação da floresta, que possuía menos de 8% de sua formação original. Desde então, as informações sobre as alterações na vegetação nativa são sempre atualizadas, fornecendo meios para monitorar, controlar e definir novas unidades de conservação. As análises compreenderam períodos de cinco anos até 2005 e, a partir daí, o Atlas foi publicado num período menor de tempo, entre 2005 e 2008, 2008 e 2010, e 2010 a 2012.

7 Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro.

8 Plano de Aceleração do Crescimento.

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PERFIL: Breno Herrera

Defensor da APA de Guapimirim e de sua gente

Biólogo de formação e com mestrado em economia ambiental, Breno Herrera, 34 anos, é um defensor

aguerrido dos remanescentes de manguezais e dos pescadores, caranguejeiros e artesãos que moram nas proximidades da área de proteção ambiental. Che ou por sete anos com paixão e trabalho árduo a APA de Guapimirim, ajudando a proteger os mais de 14 mil hectares da unidade de conservação.

A galera mais jovem também é fã do trabalho de Herrera. Todos os anos, ele coordenava atividades de voluntariado para recuperar áreas degradadas do manguezal – quase sempre, os participantes eram jovens que moram próximos às áreas de remanescentes. Mas foi um episódio recente que mostrou o apoio ao trabalho de Herrera na região.

Em abril de 2012, Herrera foi comunicado pela diretoria do ICMBio de que teria de deixar a che a da APA de Guapimirim. A exoneração não tinha um motivo claro, mas, na região, o que se falava era que o afastamento de Herrera da gestão da APA teria sido motivado por um embate com a Petrobras, que tem o projeto de construir uma hidrovia dentro da APA para permitir o transporte de equipamentos pesados do porto do Rio até o pátio de obras do Comperj. Herrera se opõe ao projeto da hidrovia, por causa do impacto das embarcações no leito estreito dos rios da área de proteção ambiental. O projeto já havia sido vetado pelos órgãos ambientais.

Bastou a notícia da exoneração circular na internet que uma verdadeira comoção se instaurou. Nas redes sociais,

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internautas pediram a volta do gestor à APA de Guapimirim, ao mesmo tempo em que organizavam um protesto contra a exoneração de Herrera em frente à Assembleia Legislativa do Rio. Dezenas de pessoas compareceram à manifestação, o que parece ter forçado o ICMBio a recuar na decisão.

No nal de 2012, porém, o próprio Herrera pediu licença para realizar doutorado. Mauro Muniz, chefe da Estação Ecológica da Guanabara, passou a acumular a che a da APA de Guapimirim.

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86 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

Um mar de possibilidades: APA Costas dos Corais

O mar é de um verde-esmeralda profundo. As praias, de areias finas e beleza incomparável, com remanescentes de Mata Atlântica ainda bem preservados. O ecossistema, riquíssimo: mais de 185 espécies de peixes catalogadas, recifes de corais e a presença do ameaçado peixe-boi mari-nho 9 , um dos mamíferos mais peculiares de nossa fauna.

A APA Costa dos Corais, que se estende por 11 muni-cípios desde o litoral sul de Pernambuco até o norte de Ala-goas, entre os municípios de Tamandaré (PE) e Paripueira (AL), já nasceu fazendo história: foi a primeira unidade de conservação do Brasil a proteger os recifes costeiros. Sua criação data de 1997, de generosa abrangência: são mais de 413 mil hectares de área protegida. E não poderia ser dife-rente: na classificação do Ministério do Meio Ambiente, a região é considerada “como de importância e prioridade de ação extremamente alta para a conservação, uso sustentá-vel e repartição dos benefícios da biodiversidade” 10 .

Não demorou muito para que a relevância ecoló-gica da APA Costa dos Corais entrasse no radar da SOS Mata Atlântica. A APA já constava do diagnóstico das re-giões marinha e costeira realizado pela equipe da profes-sora Yara Schaeffer-Novelli, do Instituto de Oceanografia da Universidade de São Paulo (USP), estudo que ajudou a SOSMA a delinear seu Programa Costa Atlântica 11 .

No segundo edital do Fundo Costa Atlântica, a APA Costa dos Corais foi um dos projetos induzidos 12 que deram bons resultados. A parceria de múltiplos atores, como o Instituto Recifes Costeiros, a gestão da APA Costa dos Corais (ICMBio), o Centro de Pesquisa de Gestão de Recursos Pesqueiros do Litoral Nordeste (Cepene-Ibama) e a Universidade Federal de Pernambu-co (UFPE), resultou em estudos sobre a importância de áreas de exclusão de pesca no interior da APA. Também foi criada a Cooperativa Náutica Ambiental, que ajuda a população local a se beneficiar economicamente do turis-mo com respeito à natureza.

9 O peixe-boi-marinho (Trichechus manatus) é uma espécie de peixe-boi da família dos triquicídeos, que pode ser encontrada do litoral dos Estados Unidos até o Nordeste brasileiro. Esses mamíferos chegam a medir até 4 metros de comprimento. É o mamífero aquático mais ameaçado no Brasil.

10 Portaria MMA no 9, de 23 de Janeiro de 2007.

11 Ver O Programa Costa Atlântica: hora de agir, pág. 29.

12 Ver Segundo Edital: foco no desenvolvimento regional, pág. 41.

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Mas a Costa dos Corais precisava de mais apoio. E apoio consistente ao longo dos anos. Embora tenha sido criada por Decreto Federal ainda na década de 1990, até hoje a APA não possui plano de manejo. A infraestrutura física e de fiscalização ainda carece de melhorias, bem como as atividades de educação ambiental, envolvendo turistas e comunidade. Além disso, a APA necessita de um plano para estimular o desenvolvimento de negócios sustentáveis ligados à pesca e ao turismo, criando vín-culos vitalícios entre a economia local e as atividades de conservação. Em suma, a Costa dos Corais precisa de planejamento de longo prazo.

E qual a melhor receita para isso? O Fundo Pró--Unidades de Conservação Marinhas provou que a for-mação de um fundo patrimonial poderia ser a resposta para as demandas da Costa dos Corais. E, ao contrário dos outros fundos patrimoniais já constituídos, Guana-bara e Atol das Rocas, cujas doações para constituir o fundo vieram de pessoas físicas, desta vez surgiu outro parceiro e patrocinador: a iniciativa privada, na figura da Fundação Toyota do Brasil, braço de responsabilidade socioambiental da montadora japonesa Toyota.

As negociações foram longas. “Mais de três anos de conversas”, conta Roberto Klabin. Mas chegaram a um bom termo: em agosto de 2011, foi assinado, em São Paulo, o acordo de cooperação entre a SOS Mata Atlân-tica, o ICMBio e a Fundação Toyota do Brasil.

A Fundação Toyota destinará um total de R$ 10 milhões, por um período de 10 anos, para fortalecer a gestão da APA Costa dos Corais com aportes anuais de R$ 1 milhão. Destes, R$ 500 mil anuais serão destinados a compor o fundo patrimonial e outra parte será desti-nada à apoiar a APA Costa dos Corais e os projetos e iniciativas de parceiros locais. Ao final do período, os rendimentos do fundo constituído poderão custear as atividades na APA: o fortalecimento de sua gestão, a criação e implementação do plano de manejo, o ordena-mento da pesca nas áreas protegidas. A SOS Mata Atlân-

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tica ficará encarregada de fazer a gestão e o aporte dos recursos na unidade de conservação.

A parceria ainda está em fase inicial de operação, mas já começam a ocorrer avanços nas atividades de fiscalização e também no fortalecimento do Conselho Consultivo da APA. Em fevereiro de 2012, foi realizada a operação “Oito Braços”, ação de fiscalização do ICM-Bio com a Marinha e a Polícia Federal, para combater a pesca predatória de polvos na região da APA. A ação aconteceu na zona costeira dos municípios de Porto de Pedras, Japaratinga e Maragogi, na parte alagoana da APA, e também nas cidades pernambucanas de Paripuei-ra e São José da Coroa Grande. A força-tarefa também autuou embarcações turísticas que não possuíam licença do ICMBio para operar nas piscinas naturais. Arpões e nadadeiras foram apreendidos.

Avanços também já estão ocorrendo no fortaleci-mento do Conselho Consultivo da APA, estratégia fun-damental para a boa gestão da UC, pois envolve todas as partes interessadas – governo local, comunidades, atores econômicos. Em abril de 2012, um encontro em Taman-daré (PE) foi realizado com esse intuito e referendou qua-tro Câmaras Técnicas: Pesquisa e Impactos; Turismo; Pesca e Comunicação.

Parcerias com ONGs locais também foram fir-madas em agosto de 2012. Além do Instituto Recifes Costeiros e da Cooperativa Náutica Ambiental, agora temos o Instituto BiomaBrasil e a Associação dos Con-dutores de Turismo e Observação do Peixe-boi Mari-nho. Com atividades voltadas para a capacitação de professores da rede municipal de ensino, o Instituto BiomaBrasil já desenvolveu atividades no município de Tamandaré e Porto de Pedras. Eles utilizam o guia Ma-ravilhosos Manguezais do Brasil como base para insti-gar os professores a realizar atividades com seus alu-nos para demonstrar a importância ecológica e social dos manguezais. Já a Associação, criada a partir de um TAC 13 e formada por moradores da região, desenvolve

13 Termo de Ajustamento de Conduta.

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atividades de educação ambiental por meio de saídas monitoradas para avistação do peixe-boi marinho no rio Tatuamunha, gerando assim emprego e renda à co-munidade, aliados à conservação.

Ainda há muito trabalho a fazer. Proteger a belíssi-ma Costa dos Corais do turismo desordenado, da pesca predatória e fortalecer a gestão da UC demandam esfor-ços e tempo. Mas com parceiros arrojados, dinheiro no banco e empenho de todos, tudo fica mais fácil.

Juatinga e Cairuçu: turismo responsável

A cidade histórica de Paraty, no litoral sul do Rio de Janeiro, concentra atrativos históricos, é um balneário procurado por turistas e sedia, todos os anos, uma festa literária, a Flip, que atrai visitantes de todo o mundo. A cidade, bem como a vizinha Angra dos Reis, faz parte da

Press Trip em Tamandaré (PE), outubro de 2012.

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Baía de Ilha Grande – região que possui a maior concen-tração de remanescentes de Mata Atlântica do Estado.

Manguezais, costões rochosos, restingas, praias e ilhas compõem a bela paisagem e formam um mosaico de ecossistemas marinhos e costeiros com alta relevân-cia biológica. Hoje, os dois municípios, Paraty e Angra dos Reis, são os que possuem os maiores percentuais de cobertura vegetal nativa da Mata Atlântica no estado do Rio.

Devido a esse conjunto de atributos naturais, a região foi classificada pelo Ministério do Meio Am-biente como área de extrema importância para a con-servação, uso sustentável e repartição dos benefícios da biodiversidade (Portaria MMA no 9/2007), abrigando o maior número de unidades de conservação do estado do Rio de Janeiro. São 11 UCs no total, com destaque para a Área de Proteção Ambiental do Cairuçu e a Re-serva Ecológica da Juatinga.

Praia de Ponta Negra, Paraty (RJ), em dezembro de 2012.

© A

ndrea Herrera

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91SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

A proximidade com as duas maiores metrópoles do país, São Paulo e Rio de Janeiro, tornou necessária a criação das UCs para proteger esses importantes rema-nescentes de florestas e manguezais. Inteiramente loca-lizada no município de Paraty, a APA Cairuçu foi criada por um Decreto Federal em 1983, abrangendo uma área de 33,8 mil hectares e 63 ilhas. Abriga espécies de fauna e flora raras e ameaçadas de extinção, sustenta sistemas hidrológicos da região e mantém comunidades caiçaras estabelecidas desde a década de 1970.

A sua porção continental se inicia no rio Mateus Nunes e termina na fronteira com o estado de São Pau-lo. A parte insular se estende desde a Ilha do Algodão, em Mambucaba, até a Ilha de Trindade, localizada no distrito de mesmo nome, muito procurado por turistas durante o verão, onde se sobrepõe aos limites do Par-que Nacional da Serra da Bocaina. Em seu território também estão totalmente inseridas a Reserva Ecológi-ca da Juatinga, as aldeias Guarani Araponga e Paraty Mirim, o quilombo do Campinho, a APA Municipal de Paraty-Mirim, o Saco do Mamanguá e algumas ilhas que fazem parte da Estação Ecológica de Tamoios. A APA, administrada pelo ICMBio, integra a Reserva da Biosfera da Mata Atlântica e também faz parte da área do tombamento da Serra do Mar e Mata Atlântica no estado do Rio.

Sua importância biológica vai além: Cairuçu tem função estratégica para a conservação da biodiversida-de por constituir um corredor ecológico entre as dife-rentes áreas protegidas da região, conectando fragmen-tos florestais de regiões costeiras às matas de encosta da Serra do Mar.

Alguns anos depois que Cairuçu se tornou área protegida, o governo fluminense decretou, em 1991, a criação de outra UC na região. Nascia, assim, a Reserva Ecológica da Juatinga, uma área de 8.000 hectares (cer-ca de 8,6% do território total do município de Paraty) voltada à proteção de remanescentes de Mata Atlântica,

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92 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

Transição para economiavoltada ao turismo

Até a década de 1970, as comunidades locais viviam exclusivamente da pesca artesanal, da agricultura de

subsistência e do extrativismo vegetal. No entanto, desde o início dos anos 1980 a economia da região vive uma transição, passando de uma economia de base pesqueira e agroextrativista para uma economia de serviços ligados ao turismo. Isto fez surgir novas atividades nas comunidades, como o transporte de turistas em pequenas embarcações, comércio de alimentos, bebidas e artesanato, e até a hospedagem em campings e chalés.

Apesar de já estarem envolvidas na exploração econômica do turismo, a inserção das comunidades tradicionais no setor vem ocorrendo de forma desorganizada, sem capacitação, infraestrutura adequada e planos de ordenamento turístico.

A Vila de Trindade é um exemplo notório. Quem já se aventurou a conhecer o simpático vilarejo durante feriados da alta temporada, como carnaval e réveillon, viu o paraíso natural e suas belas praias e trilhas na Mata Atlântica transbordando de gente, com campings e pousadas superlotados. A ine ciente coleta de lixo não dá conta da quantidade de resíduos que os visitantes acabam produzindo e, muitas vezes, descartando no próprio ambiente. Não é raro ver latas de cerveja ou garrafas de refrigerantes nas trilhas e praias.

O cenário contrasta com a calma Trindade de 40 anos atrás. Até os anos 1970, o vilarejo era uma comunidade tradicional de pescadores, que vivia da pesca artesanal e agricultura de subsistência: cultivavam banana, mandioca, feijão e cana-de-açúcar. Elementos típicos da cultura caiçara moldavam a paisagem: modestas casas de pau-a-pique e sapê. Nas casas, os próprios moradores confeccionavam utensílios, como pilões, redes de pesca, canoas.

vem ocorrendo de forma desorganizada, sem capacitação,

viu o paraíso natural e suas belas praias e trilhas na Mata

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O ponto de conversão de um vilarejo tranquilo para um destino procurado por turistas foi a construção da estrada Rio-Santos (BR-101), que colocou Trindade no mapa do turismo. Começaram a vir jovens com um perl mais alternativo, com ecos do movimento hippie, que buscavam as praias para acampar. Depois, com a melhoria do acesso, o vilarejo se converteu em um destino de turismo de massa: oferece pousadas, restaurantes, campings e lojas de artesanato. Na alta temporada, é comum a vila receber mais de 20 mil visitantes com alta pressão na região. Além do turismo desordenado, a ocupação do solo com edicações é também causadora de forte impacto ambiental e descaracterização da paisagem, pressão essa que atinge outras comunidades locais, como as da Praia do Sono e de Ponta Negra.

A abertura da Rio-Santos também ajudou a provocar, na região, um aumento da ocupação à beira-mar, com a construção de condomínios de veraneio de luxo. Um símbolo desse tipo de ocupação foi o Condomínio Laranjeiras.

O empreendimento começou em 1983, em uma parcela das antigas terras da Fazenda Laranjeiras. Idealizado pelas empresas Brascan e Parati Desenvolvimento Turístico S/A, o condomínio foi inspirado no modelo americano de agrupamentos recreativos, com clube náutico, clube social, campo de golfe e heliponto.

A Fazenda abriga importantes remanescentes �orestais e ecossistemas costeiros da Mata Atlântica ainda bem preservados. Uma pequena parte foi destinada para a área residencial, dividida em 298 lotes com ocupação sazonal. O apoio ao ordenamento e desenvolvimento do turismo sustentável na região tem sido fundamental. Para a SOS Mata Atlântica, a parceria com as três esferas de governo – ICMBio, Inea e Prefeitura –, a Associação Cairuçu (uma ONG local) e o Condomínio Laranjeiras tem sido um bom exemplo e modelo que pode ser adotado em outras regiões da costa brasileira.

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restingas, manguezais e costões rochosos, e à preservação da cultura caiçara. Possui algumas das mais belas e con-corridas praias de Paraty: Sono, Antigos, Antiguinhos, Ponta Negra, Martins de Sá, Pouso, Itanema, Calhaus, Itaóca e Grande da Cajaíba. A floresta da reserva é uma das mais exuberantes do município. Outra paisagem no-tável e também um berçário natural para a reprodução de espécies marinhas é o Saco do Mamanguá, um golfo estreito que delimita ao norte e noroeste a Reserva Ecoló-gica da Juatinga e é totalmente inserido na APA Cairuçu.

Além do patrimônio natural, Juatinga abriga ainda doze núcleos de ocupação de populações tradicionais que se distribuem em trechos ao longo do litoral e subsistem da pesca artesanal e da agricultura e, mais recentemente, do turismo que vem sendo o causador de um forte processo de ocupação da região, com consequências danosas para o meio ambiente e para a cultura local, que vem sofrendo um processo de descaracterização ano após ano. Esta Reserva encontra-se em processo de recategorização e a área deverá ser transformada em Parque Estadual e outras categorias.

Início da parceria

A atuação da Fundação SOS Mata Atlântica na região começou em 1998, quando foi estabelecida uma parceria com o Ibama, o Instituto Estadual de Florestas do Rio de Janeiro (IEF-RJ) e a Prefeitura Municipal de Paraty para a elaboração do plano de manejo da APA Cairuçu e da Reserva Ecológica de Juatinga. Além dos po-deres públicos estadual, federal e municipal, o plano era envolver também os moradores da área de influência das UCs: caiçaras e os ocupantes do Condomínio Laranjeiras.

Roberto Klabin levou, no ano seguinte, uma pro-posta aos condôminos do Laranjeiras: que cada proprie-tário contribuísse financeiramente para viabilizar o Pro-jeto Cairuçu. A parceria foi estabelecida e importantes avanços foram obtidos: o plano foi criado e aprovado em 2005. Hoje, a unidade possui conselho consultivo e a

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equipe técnica é formada por sete profissionais. Também houve incrementos importantes nas áreas de educação ambiental, assistência ao ecoturismo e na gestão do lixo, com coleta e reciclagem dos resíduos.

Nas duas UCs, a SOS Mata Atlântica vem atuando sempre em conjunto com a Associação Cairuçu, ONG de atuação local que conhece de perto os dilemas da APA e da REJ. Com a bem sucedida parceria, chegou a hora de expandir a atuação da Fundação no local e fortale-cer ainda mais a gestão dessas unidades de conservação. Mas como fazê-lo? Ou melhor, como garantir uma fonte segura de recursos financeiros para atender todas as ne-cessidades das UCs e de sua gente?

A resposta estava no próprio Fundo Pró-Unidades de Conservação. A experiência positiva dos fundos pa-trimoniais que ajudam a financiar a gestão do Atol das Rocas e da Estação Ecológica de Guanabara poderia ser usada como inspiração para fortalecer a gestão das UCs Cairuçu e Juatinga.

Dotar as UCs de infraestrutura adequada para mi-nimizar os impactos negativos da ocupação desordena-da, prever a tendência de agravamento do problema em algumas localidades, estabelecer padrões de qualidade ambiental para atividades permitidas, exercer monitora-mento efetivo da ocupação do solo, agir com rapidez nos casos de iminente dano ambiental e institucionalizar o controle de acesso de pessoas são algumas das ações que podem ser potencializadas com a criação de um fundo de apoio às UCs da região.

Esse fundo se encontra em fase de captação de recursos, mas já conta com apoio financeiro do Condo-mínio Laranjeiras e do Bradesco Cartões para o desen-volvimento de projetos específicos e atividades locais. Segundo Márcia Hirota, diretora de gestão do conhe-cimento da SOS Mata Atlântica, embora o Fundo não tenha sido estabelecido, recursos captados ajudam a cus-tear atividades importantes, como o projeto de ordena-mento turístico da região. “A região é belíssima e possui

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características ambientais de importância singular. A pressão vem aumentando nos últimos anos e os órgãos ambientais dependem de bases para melhorar a atuação, o que justifica esse estudo de capacidade de suporte, o apoio ao fortalecimento na gestão e do trabalho comu-nitário, na infraestrutura e no controle e fiscalização. A ideia é promover o desenvolvimento regional e o cresci-mento ordenado do turismo de base comunitária aliados à conservação”, diz.

Assim, no final de 2009, aproveitando a alta tempo-rada do verão, teve início nas praias de Paraty um minu-cioso levantamento com o objetivo de gerar informações sobre os fluxos de visitação, os meios de locomoção e hos-pedagem, o tempo de permanência e o perfil socioeconô-mico dos visitantes das áreas protegidas do município. A SOS Mata Atlântica e a Associação Cairuçu coordenam o estudo, realizado pelos institutos EcoBrasil e BioAtlânti-

Crianças (caiçaras) brincando na Praia de Ponta Negra, Paraty (RJ), em 2012.

Fotos © A

ndrea Herrera

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Cidade de Paraty (RJ) em dezembro 2012.ca, cujos beneficiários são a APA de Cairuçu, a Reserva da

Juatinga e o Parque Nacional da Serra da Bocaina. Agora, o próximo passo será o ordenamento turís-

tico da região e o fortalecimento das iniciativas locais, a exemplo da Ponta Negra, sempre em parceria com os órgãos públicos e as ONGs locais. O planejamento das ações será feito levando-se em consideração as necessi-dades das comunidades locais, de modo que uma even-tual restrição ao número de visitantes não se converta em prejuízo econômico para essas famílias, mas sobretudo garanta a sustentabilidade e a proteção da região.

Com esse programa e parcerias locais, a SOS Mata Atlântica acredita que o litoral sul do Rio e a graciosa cidade de Paraty continuarão a abrigar o principal rema-nescente de Mata Atlântica preservada do Estado. E mais visitantes poderão desfrutar de sua beleza – com ordem e respeito às tradições locais.

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Rebio Marinha Atol das Rocas. © Acervo SOS Mata Atlântica

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Não seria possível falar em unidades de conser-vação marinhas no Brasil sem contar a história do Atol das Rocas, a primeira Reserva Biológi-

ca Marinha do país, criada em 5 de junho de 1979 pelo Decreto no 83.549. Formado por duas ilhas, a do Farol e a do Cemitério, o Atol fica a 267 quilômetros da cidade de Natal, capital do Rio Grande do Norte, e a 148 quilôme-tros do Arquipélago de Fernando de Noronha. Embora sua área não seja extensa – são 360 km² no total – essa reserva tem fundamental importância biológica por ser o único atol 1 do Atlântico Sul e em razão de abrigar cen-tenas de espécies, muitas delas endêmicas – só encontra-das nessa região do planeta – e tantas outras migratórias.

Mas, por hora, vamos voltar às origens históricas dessa que se tornaria a primeira UC marinha brasileira. Quem descobriu o Atol das Rocas é um mistério não re-velado pela história – mas sabe-se que o atol representa-va, sobretudo, um risco para os navegadores do passado, e são incontáveis as histórias de naufrágios de navios que colidiram com sua estrutura. Não por acaso, o nome Atol das Rocas vem de sua constituição geológica, que lembrava rochas – do espanhol, roccas – na acepção dos navegadores ibéricos que por aqui aportavam nos idos de 1500 e nos séculos seguintes. A primeira menção ao Atol aparece na carta náutica de Alberto Cantino, publicada em 1502, uma das primeiras a representar o Brasil e ou-tras descobertas na América. Outra referência ao Atol é

Atol das Rocas: onde tudo começou

4

1 Um atol é uma formação de recifes de coral em forma de anel ao redor de uma ilha vulcânica. À medida que esta ilha vai afundando, o recife vai se acumulando e crescendo para fora em busca de águas mais ricas em nutrientes e transformando-se num recife de barreira. Caracteriza-se também por conter uma lagoa de águas rasas em seu interior, que mantém conexão com o oceano por meio de canais.

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atribuída ao almirante luso Dario Paes Leme, que des-creveu o naufrágio de um navio português ocorrido em 1503, conduzido pelo capitão Gonçalo Coelho.

A partir do século XIX, as menções a Rocas co-meçam a aparecer com mais frequência nos registros dos navegantes. Os frequentes naufrágios assombravam os marinheiros de outrora, especialmente os ingleses, que utilizavam uma rota direta para Pernambuco. Em 1805, uma esquadra britânica quase afundou por completo ao colidir com o Atol: dois navios ficaram comprometidos.

A sucessão de naufrágios só diminuiu em 1883, quando foi instalado um farolete no Atol, fato que per-mitiu a primeira experiência de ocupação humana nesse ambiente. Uma casa de pedras com cisterna para abrigar o faroleiro ficou pronta em 1887, mas o total isolamen-to a que esses homens eram submetidos, aliado às duras condições de sobrevivência (não existe água doce em Ro-cas) fez com que muitos deles desistissem da empreitada.

Área da Rebio Marinha Atol das Rocas.

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Como é e onde fi ca o Atol das RocasComo é e onde fi ca o Atol das Rocas

O Atol das Rocas é o único atol do

Atlântico Sul.

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Em 1914, um farol automático foi instalado, mas as ruí-nas do antigo farol ainda sobrevivem à maresia. O farol que hoje resiste às intempéries foi colocado em 1967.

Rocas viveu anos de relativo isolamento, exceto pelos barcos pesqueiros que navegavam até seu entorno em busca, principalmente, da lagosta. O crustáceo já co-meçava a rarear na costa, vítima da superexploração, e os barcos iam cada vez mais longe em busca da iguaria, disputada nos restaurantes. Na década de 1970, essa mo-vimentação passou a chamar a atenção do embrionário movimento ambientalista que começava a se desenvolver no Brasil: especialmente biólogos e estudantes de oceano-grafia que tentavam pôr um fim à matança de tartarugas marinhas e elaboraram um plano de conservação desses animais que depois ficaria conhecido em todo o País: o Projeto Tamar 2 3 . Entre 1976 e 1978, as equipes do Ta-mar fizeram as primeiras expedições para estudar os que-lônios em locais como Fernando de Noronha, Abrolhos e no próprio Atol das Rocas, e constataram que essas eram importantes regiões para a reprodução de espécies ame-açadas de extinção, como a tartaruga-verde (Chelonia mydas) e a tartaruga-de-pente (Eretmochelys imbricata).

A necessidade de proteger a riqueza biológica do Atol das Rocas chegou, por meio do grupo, ao governo federal. O principal articulador do movimento foi o almi-rante Ibsen de Gusmão Câmara, que, do posto mais alto da Marinha Nacional, encampou a luta pela criação de muitas unidades de conservação marinhas. O almirante já era um pioneiro na batalha contra a caça às baleias no litoral brasileiro e um entusiasta da conservação ambien-tal. Assim, Câmara propôs ao IBDF 4 a criação de um parque com o objetivo de proteger o santuário ecológico do Atol das Rocas. O próprio almirante se ocupou de traçar os limites da UC, que, em 1979, viria a se tornar a primeira unidade de conservação do Brasil 5 .

A criação da UC, no entanto, ficou durante alguns anos apenas no papel. No verão de 1981, o IBDF organi-zou, por meio de um convênio com o Projeto Tamar e o

2 www.tamar.org.br.

3 Ver pág. 42.

4 Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal: antiga autarquia do governo federal, vinculada ao Ministério da Agricultura para gerir projetos florestais. Foi embrião da Secretaria Especial de Meio Ambiente (Sema), criada em 1973, e Ibama, que viria a ser instituído em 1989.

5 Depois, o almirante ainda conseguiu criar os parques marinhos de Fernando de Noronha e dos Abrolhos: verdadeiras vitórias, em um momento que o ambientalismo dava seus primeiros passos no país.

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Projeto Peixe-Boi Marinho, um acampamento de caráter científico no Atol das Rocas. O objetivo da empreitada, que durou três meses, foi levantar informações sobre a fauna e flora existentes no Atol. Outro acampamento para pesquisas viria a ser realizado alguns anos mais tar-de, em 1989, quando a gestão das UCs passou do IBDF para o recém criado Ibama. Dessa vez, a pesquisa teve um viés multidisciplinar: foram levantados dados referentes à sedimentação, geologia, população de aves marinhas, tartarugas, peixes, crustáceos e mamíferos.

Mas foi a partir de 1991 que se iniciaram as ações efetivas para a implantação da Reserva Biológica, que ficou a cargo do oceanógrafo Gilberto Sales e culminou com a inauguração, em 1993, da primeira estação de pesquisa do Atol. Era uma pequena casa de madeira, projetada pela ar-quiteta Cristina Engel de Alvarez, da Universidade Federal do Espírito Santo, fabricada pelo Laboratório de Produtos Florestais do Ibama, alimentada por energia solar e com capacidade para abrigar até quatro pesquisadores – desde então, pesquisadores e técnicos do órgão gestor da UC se revezam ininterruptamente na reserva.

A fauna única de Rocas

O santuário ecológico que é Rocas foi então se des-cortinando aos olhos dos pesquisadores. Ao lado do Arqui-pélago de Fernando de Noronha, o Atol das Rocas é consi-derado a área mais importante para a reprodução das aves marinhas do Brasil, tanto em diversidade de espécies quanto em número de indivíduos. O Atol detém a maior colônia de aves marinhas tropicais do Brasil – são pelo menos 150 mil aves, de 29 diferentes espécies. Dessas, cinco espécies constroem seus ninhos no Atol: o atobá-mascarado (Sula dactylara), o atobá-marrom (Sula leucogaster), o trinta-réis--do-manto-negro (Onychoprion fuscatus), a viuvinha mar-rom (Anous stolidus) e a viuvinha negra (Anous minutus).

Além delas, 25 espécies migratórias fazem do Atol das Rocas um porto permanente. É o caso do atobá-do-pé-

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-vermelho (Sula sula) e da fragata (Fregata magnificens), que voam de Fernando de Noronha rumo ao Atol para capturar suas presas e também para descansar.

Por estar tão afastado da costa, o Atol se tornou a morada de diversas espécies aquáticas: peixes, moluscos, algas, crustáceos e tartarugas, que veem no isolamento da formação o hábitat ideal para sua reprodução. Já fo-ram catalogadas mais de 150 espécies de peixes diferen-tes, incluindo espécies de valor comercial como sargos e garoupas. Quase 100 espécies de algas, 45 de moluscos, 70 de esponjas, oito espécies de coral, além das duas es-pécies importantes de tartarugas já identificadas pelo olhar atento dos pioneiros do Projeto Tamar.

O Atol é um importante sítio de reprodução das tartaguras verde e de-pente, espécies ainda ameaçadas de extinção. Elas habitam a área repleta de bancos de algas e esponjas, que são os principais itens da dieta das tarta-rugas. Estima-se que, todos os anos, as fêmeas construam 500 ninhos na área e lá depositem 120 ovos cada uma. Li-

Tubarão-limão (Negaprion brevirostris), no Atol das Rocas.

© Luciano Candisani

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105SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

vres da predação humana, os ovos eclodem como espera-do, de tal forma que, hoje, Rocas é o segundo maior local de reprodução da tartaruga-verde no Brasil, atrás apenas da Ilha de Trindade, a 1.200 km da costa capixaba.

Em razão de toda essa riqueza biológica, o Atol das Rocas foi classificado como uma Rebio 6 .

Defensora do Atol

É também nos anos 1990 que entra em cena uma personagem cuja própria história de vida se confunde com a da implantação da Reserva Biológica do Atol das Rocas. A bióloga Maurizélia de Brito Silva, também co-nhecida como Zelinha, hoje é chefe da Reserva Biológica do Atol das Rocas e zela, com unhas e dentes e o que for preciso, para manter o Atol livre de ameaças. Mais do que seu local de trabalho, o Atol é parte de sua vida há duas décadas. Filha e neta de funcionários do Ibama, Ze-linha encontrou sua vocação profissional quando pisou no Atol pela primeira vez, em 1991.

Desestimulada com uma ocupação burocrática no Ibama, ela vinha de uma fase ruim até conhecer – e se apaixonar – pelo Atol das Rocas. Ela não reluta em con-tar que tinha problemas com álcool, acumulava faltas no trabalho e estava prestes a ir trabalhar com outra coisa quando visitou Rocas. A partir daí, suas existências se entrelaçaram. “Quando pisei no Atol pela primeira vez, pensei: ‘é esse o meu lugar’”, conta Zelinha. “Me apeguei ao Atol como meu caminho de vida e por ele abdiquei de tantas outras coisas, como família, vida acadêmica, coisas materiais”, relata.

Zelinha assumiu a chefia da unidade de conserva-ção em 1995. Embora more em Natal, sua rotina inclui jornadas mensais ao Atol, coordenando as visitas dos pesquisadores. Não é fácil: cada viagem consome em mé-dia 26 horas de barco. Profunda conhecedora do lugar, Zelinha sabe também o quanto é difícil fazer valer as res-trições à ocupação humana no Atol. Volta e meia tem que

6 Reserva Biológica é uma categoria de UC cujo objetivo principal é a preservação integral de fauna e flora e demais atributos naturais existentes em seus limites, devendo salvaguardar espécies e amostras de ecossistemas raros e representativos da biodiversidade brasileira. Assim, na reserva não é permitida a visitação pública, sendo autorizadas apenas atividades científicas, de monitoramento ambiental e de patrulhamento, sempre com autorização prévia do ICMBio, hoje o órgão que responde pela gestão das UCs brasileiras.

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embarcar em um bote para afugentar barcos pesqueiros que rondam o local – a pesca em suas imediações é ter-minantemente proibida. Mas já houve tempos ainda mais difíceis, quando a sede que abrigava Zelinha e os pesqui-sadores que visitavam o Atol era bastante precária – no início, os cientistas precisavam acampar no Atol para rea-lizar seus estudos e sequer havia energia elétrica. Também eram comuns problemas de manutenção das embarcações que servem à Rebio: até combustível chegou a faltar, im-pedindo o transporte. Houve momentos em que a Reserva não tinha orçamento sequer para pagar o aluguel do bar-co que transportava os pesquisadores a cada mês.

“Quando assumi a chefia da UC, a primeira coisa que constatei foi que a verba pública destinada ao Atol era insuficiente”, conta Zelinha. A bióloga lançava mão de uma série de esforços pessoais para ajudar a custear as atividades do Atol – incluindo colocar dinheiro do próprio bolso. “Todo o meu investimento de vida está no Atol. Para angariar recursos, eu fazia ‘vaquinha’ entre os pes-quisadores e cheguei a tomar empréstimos bancários pes-soais para ajudar a custear melhorias na infraestrutura da reserva” diz Zélia. Empresários e profissionais de impren-sa de boa vontade também ajudavam com despesas pontu-ais. Um empresário do Rio, cujo filho era uma apaixonado pelo Atol, chegou a bancar as despesas de transporte com barco por um ano inteiro. Mas era desgastante, para Ze-linha e todos os envolvidos com as atividades de pesquisa do Atol, manter a Rebio com base somente na filantropia.

Enquanto isso, em São Paulo...

Na década de 2000, a Fundação SOS Mata Atlântica colocou um objetivo para os próximos anos: aumentar sua atuação em projetos no mar e na costa brasileira. Já haviam sido traçadas as diretrizes do Programa Costa Atlântica 7 e a organização saía em busca de parcerias inteligentes.

Em 2001, o Atol das Rocas fez parte do noticiá-rio nacional e mundial em razão de uma boa notícia:

7 Ver capítulos 2, pág. 29, e 3, pág. 75.

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a Unesco havia incluído o Atol das Rocas e o Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha como pa-trimônios naturais da humanidade. A notícia fez bem ao ego de Rocas, mas os problemas de gestão persis-tiam. Um grande novo passo, porém, estava prestes a ser dado, cinco anos mais tarde.

Em 2006, o presidente da SOS Mata Atlântica, Roberto Klabin, tinha tomado conhecimento, por in-termédio de pessoas ligadas ao Ibama e Projeto Tamar, das dificuldades pelas quais a Rebio do Atol das Ro-cas vinha passando. Ciente desses problemas, Klabin marcou uma reunião, em Brasília, com o objetivo de oferecer uma parceria institucional entre a Fundação e o órgão gestor das UCs.

“Começamos a ver o mar como grande oportu-nidade de atuação. Fomos ao Ibama e propusemos um desafio: queremos ajudar, criando mecanismos financei-ros inovadores para a conservação”, conta Klabin. A SOS Mata Atlântica tinha em mente ajudar a gestão do Atol das Rocas, mas os técnicos ofereceram, primeiro, uma parceria para atuar em Fernando de Noronha. O Atol das Rocas, no entanto, era a primeira opção da ONG: foi alvo de atenção por ser a primeira unidade de conser-vação marinha brasileira. Além disso, por ser uma UC de proteção integral, Rocas não poderia contar com re-cursos advindos do turismo, como ocorre com Noronha. “Tomamos conhecimento de que a Rebio sofria com a falta de recursos para manutenção e falta de pessoal. Os pesquisadores dependiam de favores ora da Marinha, ora da Petrobras para chegar até lá”, diz Klabin. Ele pros-segue: “Aí perguntamos ao governo: quanto seria gasto para manter o Atol funcionando em boas condições?”

Na primeira reunião sobre a Reserva do Atol das Rocas, participaram Rômulo José Fernandes Mello, que posteriormente assumiu a presidência do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Ricardo So-avinsky, José Dias Neto, Guy Marcovaldi, do Projeto Ta-mar, Maurizélia Brito, entre outros. Nascia ali a parceria.

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Passando o chapéu

A resposta mostrou que não seria necessária uma avalanche de recursos para manter as atividades da Reser-va Biológica do Atol das Rocas: bastavam em torno de R$ 100 mil por ano. Ciente disso, a Fundação resolveu “pas-sar o chapéu”: Klabin e Pedro Passos, empresário e vice--presidente do Conselho Administrativo da SOS Mata Atlântica, organizaram um jantar beneficente com o ob-jetivo de amealhar recursos para colocar em dia as finan-ças do Atol. O evento, realizado no estrelado restaurante D.O.M., em São Paulo, com apoio do chef Alex Atala, mobilizou mais oito generosos doadores, todos pessoas físicas. Nessa noite, foram arrecadados mais recursos que no final totalizaram R$ 1,7 milhão. Os doadores passa-ram então a compor o Conselho de Amigos do Atol das Rocas, ao lado da Fundação SOS Mata Atlântica.

E como garantir a longevidade desses recursos, de modo que o dinheiro ajudasse na gestão das atividades realizadas no Atol por muitos anos? Conhecedor do meio empresarial e financeiro, Klabin tomou conhecimento de um mecanismo financeiro chamado de fundo de perpe-tuidade – ou endowment fund, em inglês – onde os recur-sos arrecadados por meio de doações são aplicados em um fundo gerenciado por uma instituição financeira. Os rendimentos líquidos da aplicação, descontada a inflação e outros impostos e tributos, são utilizados para custear as despesas operacionais da unidade de conservação, de modo que o dinheiro das doações permaneça aplicado, gerando dividendos.

Dessa forma, o montante de R$ 1,7 milhão arreca-dado com os Amigos do Atol das Rocas hoje está em R$ 2,4 milhões. O rendimento líquido da aplicação nunca chegou a ser utilizado, pois foram levantados mais R$ 900 mil para recuperar a estrutura do Atol. “Nosso re-curso fez com que a máquina não parasse de funcionar – custeia o combustível das embarcações, a manutenção dos equipamentos e das bases, os consertos. Mudou

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completamente a vida do Atol. É pouco dinheiro, mas é flexível e faz toda a diferença”, diz Klabin.

De casa nova

A começar pela estrutura física da casa que recebe os pesquisadores. Antes, quem ia ao Atol para expedi-ções científicas tinha como única opção de alojamento a velha casa que servia como base científica. Trazida ao Atol em 1993, a estrutura sofria com o desgaste causado pelo tempo e pela maresia.

Em 2008, foi iniciada a construção da nova Esta-ção Científica do Atol das Rocas, um trabalho hercúleo que consumiu nada menos do que 109 viagens de bote para transporte do material de construção usado na edi-ficação. O projeto da nova estação nasceu da prancheta da arquiteta Cristina Engel de Alvarez, coordenadora do Laboratório de Planejamento e Projetos da Universidade Federal do Espírito Santo e autora do projeto da primeira base construída em 1993. Indicada pelo ICMBio, Cristi-na é uma especialista 8 em projetos em locais de difícil acesso e em condições climáticas extremas. O projeto da nova base científica do Atol, assinado também pelo ar-quiteto Anderson Buss Woelffel, levou em consideração aspectos importantes da arquitetura em áreas ambien-talmente sensíveis: mínimo impacto ao entorno, confor-to térmico e simplicidade na construção. Além disso, a questão logística era um ponto importante a ser conside-rado: como navios grandes podem apenas aproximar-se do Atol, o transporte de cargas e pessoas até as ilhas é feito por meio de botes infláveis. Por isso, as placas de madeira e demais estruturas da base tiveram que ser di-mensionadas para caber nesses pequenos botes.

A instalação das sapatas, bases para receber a edi-ficação, contou com o apoio da equipe da Base Naval de Natal e da Emgepron, uma empresa da Marinha do Bra-sil. A casa de madeira, produzida pela empresa Brasmerc, tem capacidade para abrigar até cinco pessoas. No início

8 A arquiteta projetou a Estação Emílio Goeldi – base brasileira de pesquisa na Ilha Elefante, na Antártida. No continente gelado, também trabalhou na ampliação da Estação Antártica Comandante Ferraz, que reúne a nata dos pesquisadores brasileiros. Eu seu currículo também constam trabalhos no Arquipélago de São Pedro e São Paulo e na Ilha de Trindade.

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Pesquisa

Com a nova estrutura para receber pesquisadores, as pesquisas estão indo de vento em popa – tanto que novos

agendamentos para expedições só poderão ser feitos a partir de 2014. O Atol já consegue abrigar cerca de 80 pesquisadores por ano, com boas condições de infraestrutura. As principais universidades do país hoje realizam pesquisas que têm como base a rica biodiversidade do Atol. Entre elas a Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade do Estado da Bahia (Uneb), Universidade Federal do Ceará (UFCE), Fundação Universidade Federal do Rio Grande (Furg), Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Universidade Federal Fluminense (UFF) e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Além das pesquisas desenvolvidas pelo próprio governo federal, no âmbito do ICMBio.

Na pauta dos pesquisadores, há estudos em andamento sobre a reprodução de espécies marinhas como a tartaruga-

de São Paulo (USP), Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Universidade do Estado da Bahia (Uneb), Universidade Federal do Ceará (UFCE), Fundação Universidade Federal do Rio Grande (Furg), Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE), Universidade Federal Fluminense (UFF) e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Além das pesquisas desenvolvidas pelo próprio governo federal, no âmbito do ICMBio.

Na pauta dos pesquisadores, há estudos em andamento sobre a reprodução de espécies marinhas como a tartaruga-

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verde; atualização do número de espécies que vivem ou passam pelo Atol; estudos sobre polvos que habitam águas rasas; monitoramento das populações de ouriços-brancos; estudos sobre a estrutura das comunidades de aves marinhas tropicais; inventários de peixes que habitam recifes e pesquisas para identi cação de cetáceos, como baleias e gol nhos, nas águas que banham o Atol. Há ainda estudos para determinar a presença de lixo e poluentes nas águas da região – Zelinha conta que o mar traz embalagens até da Malásia e Indonésia, como pesquisadores puderam veri car nos rótulos.

Outra frente de pesquisas é o desenvolvimento de medicamentos naturais de algas marinhas com potência antiviral. “As algas do Atol estão sendo estudadas para a criação de uma vacina em potencial contra a Aids. Imagine a importância de uma pesquisa como essa para a humanidade”, diz a chefe da UC com orgulho. O Atol também serve como base de pesquisas sobre o aquecimento global: fornece valiosas informações sobre a temperatura da água e a elevação do nível do oceano.

Malásia e Indonésia, como pesquisadores puderam veri car nos rótulos.

Outra frente de pesquisas é o desenvolvimento de medicamentos naturais de algas marinhas com potência antiviral. “As algas do Atol estão sendo estudadas para a criação de uma vacina em potencial contra a Aids. Imagine a importância de uma pesquisa como essa para a humanidade”, diz a chefe da UC com orgulho. O Atol também serve como base de pesquisas sobre o aquecimento global: fornece valiosas informações sobre a temperatura da água e a elevação do nível do oceano.

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de 2009, foram colocados os acabamentos: a pintura, as instalações, móveis, materiais e equipamentos de apoio aos pesquisadores. A antiga habitação, com apenas dois cômodos, deu lugar a um depósito para armazenamento de materiais e equipamentos de uso da Reserva e dos pes-quisadores visitantes.

Também foram adquiridos pela SOS Mata Atlân-tica e doados para o Atol um sistema de radiocomuni-cação (VHF e SSB), embarcação, motores, filmadora, máquina fotográfica, GPS e dois geradores de energia elétrica. Em 2012, foram instalados equipamentos para geração de energia solar, em substituição aos geradores a óleo diesel, e está previsto um banheiro seco, para dar maior conforto aos visitantes. “Finalmente os geradores poluentes serão aposentados. A energia utilizada no Atol será 100% solar”, comemora Zelinha.

No dia 7 de maio de 2009, a Nova Estação Cientí-fica foi inaugurada, para alegria – e emoção – dos pes-quisadores e profissionais envolvidos. “Foi a realização de um sonho”, resumiu Zelinha. “Finalmente tivemos os recursos e as condições necessárias para ampliar as pesquisas em favor da conservação da biodiversidade

Nova Estação Cientí�ca do Atol das Rocas.

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em Rocas.” Na data, foram celebrados os 30 anos de criação da Rebio.

Os recursos obtidos com o fundo Atol das Rocas também possibilitaram melhorar as condições de acesso à Reserva. Foi contratado um serviço de fretamento de embarcação para viabilizar as atividades de campo dos pesquisadores. O serviço torna possível a permanência das equipes do ICMBio e de outros prestadores de servi-ço no Atol, o que permite melhor desempenho e acom-panhamento das atividades de monitoramento e patru-lhamento das áreas para evitar, por exemplo, a presença de barcos pesqueiros. E, desde 2011, o próprio ICMBio assumiu a contratação regular da embarcação para o transporte de técnicos e pesquisadores.

Ficou mais fácil manter os visitantes indesejados afastados. O resultado desse esforço pode ser visto na re-dução drástica da pesca ilegal no entorno do Atol, que caiu 90% em comparação a 1995, quando Zelinha assu-miu a chefia da UC.

As melhorias na estrutura da Reserva vêm contri-buindo diretamente para a realização de novas pesquisas no Atol das Rocas. “A execução das atividades de pesquisa tem contribuído para a descoberta de novas espécies e um conhecimento mais aprofundado do local”, diz Zelinha. “A presença dos pesquisadores garante que a estação perma-neça ocupada durante todo o ano, cumprindo um dos prin-cipais objetivos de criação da UC, que é a pesquisa científi-ca visando à preservação do ecossistema”, completa.

O dinheiro proveniente do fundo patrimonial tam-bém ajuda a dar visibilidade para as ações de conservação e os projetos de pesquisa que vem sendo delineados na Reserva. Desde 2008 são realizadas ações de divulgação e de educação ambiental sobre a importância do Atol das Rocas para escolas públicas e privadas de Natal e de cida-des litorâneas do Rio Grande do Norte, em mais de 150 ciclos de atividades que já atingiram 3.500 estudantes.

A experiência positiva do Atol das Rocas vem sen-do divulgada em eventos anuais da SOS Mata Atlântica,

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como o Viva a Mata 9 . O esforço em prol da conserva-ção do Atol já foi tema de reportagens da TV Globo, do jornal O Estado de S. Paulo e de revistas como National Geographic Brasil. Outro trabalho de grande impor-tância para a divulgação do Atol das Rocas é o livro de fotografias de autoria do renomado fotógrafo Luciano Candisani 10 , que participou de uma expedição ao Atol. Suas fotografias, fruto de intenso trabalho realizado du-rante essa jornada, ilustram também este livro.

Mais recentemente, um novo livro de fotografias foi lançado. Atol das Rocas 3º51´S 33º48´W 11 , compila o rigoroso trabalho das fotógrafas Zaira Matheus e Marta Granville, que registraram ao longo de cerca de dez anos a beleza e a diversidade de Rocas. Produzida em colabo-ração com a bióloga Alice Grossman, a obra apresenta, ainda, uma extensa pesquisa sobre a ocupação humana no local, incluindo fotografias e registros iconográficos históricos. Um texto assinado pelo almirante e historia-dor Max Justo Guedes mostra como os cartógrafos re-presentaram, ao longo dos séculos, o Atol.

Prestação de contas

A contribuição do fundo de perpetuidade para a ges-tão da Reserva Biológica do Atol das Rocas é acompanhada anualmente pelo Conselho de Amigos do Atol das Rocas. Cabe ao ICMBio prestar contas e elaborar planos de tra-balho e orçamentos anuais, que são discutidos e aprovados pelo Conselho. A estratégia de trabalho vem dando certo.

“Não é co-gestão. Trata-se de um modelo transpa-rente de parceria entre uma ONG e o poder público, com participação de pessoas físicas e a academia para apoio operacional, técnico e financeiro na gestão da unidade de conservação”, explica Marcia Hirota, diretora de Gestão do Conhecimento da SOS Mata Atlântica e coordenado-ra do Fundo Atol das Rocas. Na avaliação de Marcia, que cuida do relacionamento entre o ICMBio, em Brasília, os conselheiros e a equipe da Reserva, “a estratégia de se com-

9 Realizado no Parque do Ibirapuera, em São Paulo, o Viva a Mata é uma grande mostra anual de projetos e iniciativas sobre a Mata Atlântica, com o objetivo de trazer o bioma para mais perto da população, com atividades, palestras, shows e interatividade.

10 Atol das Rocas, de Luciano Candisani. Dorea books: 2002.

11 Atol das Rocas 3º51´S 33º48´W. Alice Grossman, Marta Granville, Zaira Matheus. BEI editora. 2012.

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por um fundo para contribuir com a gestão deu certo e ins-pirou a ampliação para outras áreas marinhas protegidas.

“É uma aliança que pode envolver empresários e li-deranças locais, por exemplo,” diz. A operação financeira do fundo e do centro de custos do Atol das Rocas é res-ponsabilidade de Olavo Garrido, diretor administrativo e financeiro da SOS Mata Atlântica. Depois da bem-sucedi-da experiência do Atol, o modelo inspirou outros fundos de perpetuidade 12 dentro do Programa Costa Atlântica.

Ainda existem inúmeros desafios para assegurar a independência financeira do Atol das Rocas, mas a pre-sença constante dos cientistas, uma legião de apaixona-dos pelo local, é um dos indícios de que o futuro reserva ao Atol a continuidade das boas ações. Nas palavras de Zelinha: “Digo que, quando ocorrer de eu não mais pu-der chefiar a UC, vai haver pessoas dispostas a cuidar do Atol até melhor do que eu cuido”, diz. Seu legado não será esquecido – e, no que depender da SOS Mata Atlân-tica, o Atol das Rocas ainda vai fornecer matéria prima para muita ciência e pesquisa da melhor qualidade. E as tartarugas-verdes, os tubarões, os albatrozes e as lagos-tas continuarão tendo um hábitat seguro e protegido pe-las próximas gerações.

Apresentação de Zelinha sobre o Atol das Rocas no auditório do Viva a Mata em 2009.

12 Ver capítulo 3, pág. 75.

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116 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

Ensaio fotográficoO mundo cabe numa câmera fotográca. Um toque, a

natureza surge. Amplos cenários e belíssimas paisagens com suas luzes e coloridos, a valiosa e frágil biodiversidade existente em ricos e ameaçados ecossistemas ou em pequenos detalhes nas minúsculas formas de vida em cada canto do planeta. Depois, mais um toque e a natureza chega até os nossos olhos, desde lugares dos mais inóspitos e de difícil acesso até locais bem conhecidos.

Os fotógrafos de natureza são grandes desbravadores desse universo. Nesses anos de luta em prol da proteção da Mata Atlântica e, mais recentemente, também pelos ambientes costeiros e ecossistemas marinhos, temos tido uma excelente convivência com prossionais maravilhosos. Com seu belíssimo trabalho, esses fotógrafos têm sido grandes aliados da causa ambiental, contribuindo de forma exemplar para multiplicar nossas ações.

Para este ensaio, não podíamos deixar de convidar o Luciano Candisani, querido parceiro e colaborador, dos mais competentes e respeitados fotógrafos de natureza. É dele o livro Atol das Rocas, a primeira obra publicada sobre esse lugar tão singular e ao mesmo tempo deslumbrante, que ele soube tão bem registrar. Graças a isso, foi possível estabelecer nosso primeiro contato com a Reserva.

Com seu requintado olhar e suas lentes minuciosas, ele nos oferece aqui uma deliciosa oportunidade para apreciar este delicado refúgio ecológico.

As imagens emocionam. Aceite o convite para conhecer um pouco mais essa obra da natureza – patrimônio que é de toda sociedade – e imagine quanta preciosidade pode existir no Brasil e no mundo, ricos e diversicados ambientes dos mais remotos ou que circundam nossas vidas e, muitas vezes, passam despercebidos.

Marcia HirotaDiretora de Gestão do ConhecimentoFundação SOS Mata AtlânticaL

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156 SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

Andorinha-do-mar ou trinta-réis-do-manto-negro (Sterna fuscata), no Atol das Rocas. © Luciano Candisani

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157SÉRIE SOS MATA ATLÂNTICA VOLUME 2

As histórias contadas até aqui mostram que a fórmula adotada pela SOS Mata Atlântica para ajudar a proteger os ecossistemas marinhos e

costeiros – baseada na busca compartilhada por conhe-cimentos sobre o mar, no apoio à gestão das unidades de conservação e na multiplicação dos recursos financeiros necessários por meio da criação de fundos de perpetuida-de – vem sendo bem sucedida. Uma coisa é certa: o que foi feito até aqui é uma amostra do trabalho de proteção e conservação do mar e zonas costeiras e certamente con-tribuirá para a definição de novas estratégias e caminhos a serem trilhados pela Fundação nos próximos anos. O futuro da organização não será apenas o verde das flores-tas e todo o colorido da biodiversidade da Mata Atlânti-ca. Também terá muitas nuances de azul.

O Programa Costa Atlântica e seus editais para projetos de conservação continuam a pleno vapor. Ou-tras importantes parcerias começam a tomar forma, como o apoio a gestão e implementação do Monumento Natural do Arquipélago das Ilhas Cagarras, na cidade do Rio de Janeiro, uma das mais novas UCs marinhas no país; o apoio à Marinha do Brasil e ao Museu Nacio-nal nos projetos de conservação da biodiversidade e da recomposição da vegetação nativa da Ilha de Trindade, no meio do Oceano Atlântico; e a criação de um fundo de conservação em parceria com a Conservação Interna-cional para assegurar a proteção dos recifes de corais do Complexo de Abrolhos, região da costa brasileira onde

Mar a vista! 5

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se encontra a maior concentração e biodiversidade desses ambientes no Atlântico Sul. Esses novos projetos, que já nasceram grandiosos, bem como as estratégias para os próximos anos, serão contados nesse capítulo.

O plano estratégico da Fundação incluiu criar uma divisão específica para ações e projetos na costa brasi-leira. Não que as florestas serão deixadas em segundo plano: elas continuarão no centro das políticas da SOS Mata Atlântica, mas a zona costeira e marinha ganhará merecido destaque, assim como o ambiente urbano me-recerá mais atenção. A ideia é continuar apostando no bem-sucedido modelo de fundos de apoio a projetos e gestão das UCs, na produção de conhecimento, geração de conceitos e metodologias, e investir esforços também na esfera política, influenciando nossos legisladores na formulação de marcos regulatórios e leis, visando à pro-teção dos ecossistemas marinhos.

Ilhas Cagarras: biodiversidade e um cenário de cartão postal

O ano de 2012 já deu bons indícios de que a par-ceria em prol do mar será o grande novo vetor das ati-vidades da SOS Mata Atlântica para os próximos anos. Não obstante a frustração com os resultados práticos da Rio+20 – quando todos esperavam um acordo internacio-nal para proteção dos oceanos, que acabou não vingando –, passos importantes estão sendo dados dentro de casa. Um deles foi a assinatura, em março, do termo de parce-ria da SOS Mata Atlântica com o ICMBio para apoiar a gestão, implementação e manejo do MoNa 1 do Arqui-pélago das Ilhas Cagarras, na cidade do Rio de Janeiro.

Distante apenas 5 km de um dos cartões postais mais famosos do Rio de Janeiro, a praia de Ipanema, o ar-quipélago de Cagarras chama a atenção pela forma sinuo-sa das sete ilhas e rochedos que o compõem. Do ponto de vista da conservação, Cagarras possui alta relevância: pos-sui fragmentos de Mata Atlântica, é colônia reprodutiva

1 Monumento Natural.

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para aves marinhas migratórias, como atobás e fragatas, é área de interesse arqueológico e a pesca nos seus arredo-res constitui fonte de renda para diversas famílias de pes-cadores. A proximidade física com a metrópole, porém, só agravou os impactos ambientais sobre o arquipélago. Além da pesca e visitação de turistas, que já estavam sain-do do controle, os arredores das Ilhas recebem o esgoto produzido por praticamente toda a Zona Sul da cidade do Rio de Janeiro, desembocado ali pelo emissário submari-no de Ipanema, construído na década de 1960. A polui-ção da Baía de Guanabara, que recebe de lixo doméstico descartado no mar à sujeira causada pelas embarcações, também contribui para impactar negativamente a saúde e a qualidade ambiental das Ilhas Cagarras.

Tantas ameaças levaram a uma discussão, que teve origem em 1989, no sentido de transformar o arquipé-lago em uma unidade de conservação. Uma resolução do Conama 2 chegou a propor a criação de uma área de relevante interesse ecológico, de uso sustentável, em

2 Conselho Nacional do Meio Ambiente.

Ilhas Cagarras, cidade do Rio de Janeiro (RJ).

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um raio de 2 quilômetros ao redor do arquipélago. Essa ideia não chegou a prosperar. Anos mais tarde, em 2003, o Projeto de Lei no 1.863, formulado pelo então depu-tado federal Fernando Gabeira, sugeria a criação de um Monumento Natural, de proteção integral, com um raio de 10 a 200 metros de área resguardada da pesca e outras atividades humanas. O projeto de Gabeira não chegou a ser aprovado, mas inspirou outra proposta que chegou à Assembleia Legislativa do Rio, de autoria do deputado estadual Alessandro Calazans. Essa previa a transforma-ção das Ilhas Cagarras em um Parque Marinho.

Em 2006, a então ministra do Meio Ambiente Ma-rina Silva revisou a proposta de criação de um Monu-mento Natural, de proteção integral, e, no ano seguinte, começaram as audiências públicas com os setores envol-vidos – pesca artesanal e industrial, ecoturismo, mergu-lho – para discutir a criação do Monumento Natural. A proposta inicial previa uma zona de amortecimento de 500 metros, o que desagradou praticamente a todo mun-do – dos donos de barcos turísticos ao setor de pesca in-dustrial, passando pelos pescadores artesanais – por ser considerada muito restritiva às atividades econômicas no entorno do arquipélago. Foi só depois da realização de um diagnóstico de pesca, fruto de uma cooperação en-tre Ibama, Ministério da Pesca e Instituto Ecomar, que uma nova proposta, com novo traçado, foi definida. Em seguida, foi criado um GT 3 , formado por vários atores sociais (empresários, ONGs, universidades, pescadores) para discutir os limites da nova UC.

Após muitas discussões sobre o projeto, em 2010, finalmente, a Lei no 12.229 criou o Monumento Natural das Ilhas Cagarras, a mais jovem unidade de conservação marinha brasileira. Ficou definido que a UC contempla-ria as ilhas Cagarras, Palmas, Redonda e Comprida, as ilhotas no entorno dessas ilhas e a área marinha num raio de 10 metros das ilhas e ilhotas. Faltou definir a zona de amortecimento, tema que ainda será objeto de discus-sões durante a etapa de implementação da UC. Como

3 Grupo de trabalho.

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Monumento Natural, Cagarras passa a ser uma unidade de proteção integral, com restrições a atividades no seu entorno – ficam proibidas quaisquer ações que coloquem em risco a integridade dos ecossistemas. Assim, todos os que utilizam as ilhas, seja para sobrevivência ou lazer, te-rão de observar regras mais rigorosas – nada de acampar ou escalar as paredes rochosas das ilhas, nem pescar com redes ou outros tipos de armadilhas. Ganha o arquipéla-go, ganham todos.

Entra em cena Fabiana Bicudo, bióloga formada pela Universidade de Brasília, especialista em ambien-tes costeiros e mestre em oceanografia. Funcionária do Ibama desde 2003, Fabiana sempre soube que queria tra-balhar com o mar. Trabalhou no programa de conserva-ção de mamíferos marinhos – cuja estrela é o peixe-boi marinho – e atuou durante quase quatro anos no Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha. Em 2012, foi incumbida de gerir a recém-criada UC. A guardiã das Ilhas Cagarras – como já está ficando conhecida – tem pela frente um desafio e tanto: criar a estrutura e as con-dições para a gestão da unidade de conservação. Ela é ao mesmo tempo chefe e única funcionária da UC e sequer tem uma sede para chamar de escritório. Mas a UC já tem conselho consultivo forte, formado com representantes de 28 instituições (universidades, ONGs, governo, clubes náuticos, pescadores, prestadores de serviços turísticos).

“Os primeiros passos na direção de estruturar o Monumento Natural das Ilhas Cagarras já estão sendo dados e acredito que essa UC dará muito orgulho ao Rio de Janeiro”, diz Fabiana Bicudo.

A recém-firmada parceria com a SOS Mata Atlân-tica deve assegurar os recursos financeiros necessários para ajudar a estruturar a sede administrativa da UC (materiais de informática e escritório, mobiliário, equi-pamentos de campo, como rádios, equipamentos para mergulho e câmera fotográfica); consolidar a gestão institucional da unidade de conservação; apoiar as ações de fiscalização à pesca e ao turismo predatório;

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fomentar programas de pesquisa e conservação das es-pécies da fauna que se reproduzem na ilha, como aves migratórias; e também criar uma identidade visual para a UC e divulgar a existência do Monumento Natural para a população – seja por meio de materiais impres-sos de divulgação e também com exposições abertas ao público ou campanhas. O Fundo pró-UC marinha MoNa Cagarras deverá ser constituído ao longo de cin-co anos com recursos do Bradesco Cartões e prevê um aporte de recursos da ordem de até R$ 1 milhão para o Fundo e mais R$ 200 mil anuais para as ações emergen-ciais e projetos específicos.

Com a UC estabelecida, outra área de atuação, explica Fabiana Bicudo, será trabalhar junto ao poder público local e a Companhia Estadual de Águas e Esgo-tos do Rio de Janeiro (Cedae) para conscientizar a popu-lação a não jogar resíduos sólidos (papéis, absorventes, cotonetes) na rede de esgotos, já que os detritos invaria-velmente alcançam as Ilhas Cagarras, por causa do emis-sário submarino e de correntes marinhas.

“O esgoto cai, in natura, diretamente no ecossis-tema de Cagarras. Dependendo das correntes marítimas, ele volta para a praia ou impacta diretamente a unidade de conservação. Tudo que as pessoas jogam na rede de esgoto e que não se degrada naturalmente pode prejudi-car a fauna marinha e terrestre”, relata Bicudo.

Não são poucos os desafios que a novíssima UC enfrentará durante seu período de consolidação. Tornar o Monumento Natural mais conhecido pelos cariocas (e pelos brasileiros), incentivar pesquisas sobre sua biodi-versidade, reduzir a poluição que o ameaça, não serão tarefas fáceis nem serão realizadas do dia para a noite. Mas no que depender da SOS Mata Atlântica e de sua guardiã Fabiana Bicudo, as Ilhas Cagarras ainda serão motivo de forte orgulho para a cidade do Rio de Janeiro nos próximos anos. E em se tratando da Cidade Mara-vilhosa e suas belezas naturais incontestáveis, isso não é pouca coisa.

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Ilha de Trindade: onde o sol nasce primeiro

O sol nasce primeiro em Trindade, a ilha oceâni-ca mais afastada da costa brasileira. Desbravada (e de-predada) por portugueses e ingleses, a Ilha de Trindade, hoje ocupada por uma base militar da Marinha do Bra-sil, testemunhou a chegada de navegadores, naufrágios, tentativas de colonizar a terra e a introdução de animais domésticos – como cabras e porcos – em seu território, o que contribuiu para a derrocada de seu exuberante ecos-sistema de Mata Atlântica.

Hoje, mais de 500 anos após a frota do navegador português Estevão da Gama ter registrado a existência da ilha, Trindade luta para revigorar a natureza que um dia fez desse ambiente insular um ecossistema rico, reple-to de espécies endêmicas da fauna e da flora. E um dos grandes projetos que fazem parte da nova estratégia da SOS Mata Atlântica de ampliar sua atuação nos ambien-tes marinhos e costeiros é o apoio à iniciativa de recom-posição da vegetação da Ilha de Trindade.

Ilha de Trindade, a ilha oceânica mais afastada da costa brasileira.

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Em setembro de 2011, a Fundação assinou um acordo de cooperação com o Museu Nacional do Rio de Janeiro e a Marinha do Brasil para recuperar a vegetação nativa da Ilha de Trindade – praticamente dizimada de seu território em razão da ocupação humana ao longo dos últimos três séculos. Pela parceria firmada, o projeto científico e a supervisão técnica ficam a cargo do Museu Nacional – que já vem realizando um trabalho de recu-peração ambiental da ilha nas duas últimas décadas. A coordenação do projeto e o apoio logístico, de transpor-te e hospedagem de pesquisadores são incumbência da Secirm 4 , enquanto a SOS Mata Atlântica cuidará da busca de recursos financeiros para subsidiar as iniciativas no local. O apoio inicial é da Bradesco Cartões, na ordem de R$ 200 mil, que estão sendo investidos no projeto e nas melhorias na infraestrutura e no sistema de energia elétrica da base e alojamentos. Os esforços para capta-ção de mais recursos continuam a ser desenvolvidos pela Fundação em prol da criação dos “Amigos de Trindade”.

“O apoio da SOS Mata Atlântica será crucial no sentido de assegurar a continuidade do projeto do Museu Nacional de revegetação de Trindade e acelerar a recupe-ração ambiental da ilha”, afirma o capitão de mar-e-guer-ra Camilo de Lellis Menezes Felippe de Souza, encarrega-do da Divisão de Ilhas Oceânicas da Secirm. “Trindade sofreu com uma longa história de devastação e seu futuro depende das atividades de pesquisa científica e conserva-ção”, diz Souza, um grande entusiasta do projeto.

O caminho para a recuperação da vegetação na Ilha de Trindade é longo, mas os primeiros passos já foram dados. Localizada a 1.167 quilômetros a leste de Vitória 5 , no centro do Atlântico Sul, para se chegar a Trindade é preciso viajar cerca de três dias de navio. A ilha, com 13,5 km² de extensão, faz parte de uma ca-deia de montanhas submersa e seus picos podem atingir altitudes acima de 620 metros do nível do mar. Ela foi ocupada em diferentes momentos históricos em razão de um elemento muito especial: de todas as ilhas oceânicas

4 Secretaria da Comissão Interministerial para os Recursos do Mar.

5 Capital do Espírito Santo.

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brasileiras, Trindade é a única que possui cursos de água doce perenes, um reflexo de suas condições climáticas, de vegetação e solo.

A Ilha de Trindade foi ocupada por portugueses e ingleses entre os séculos XVIII e XIX. Embora os por-tugueses tivessem “descoberto” a ilha em 1502, Trinda-de foi tomada pelos ingleses a partir de 1700, quando o astrônomo inglês Edmund Halley (o mesmo que previu que um cometa, depois batizado com seu nome, cruza-ria o sistema solar) começou um processo de ocupação da ilha. Halley desembarcou em Trindade em nome da Inglaterra e lá soltou casais de cabras, porcos e galinhas--da-Angola, o que deu início à devastação das florestas que cobriam a ilha. Não tardou muito para que os ovos de tartarugas marinhas se tornassem parte da dieta dos porcos e assim a fauna local começou a ser afetada pelas espécies exóticas. Literalmente, os animais ali introduzi-dos comeram a ilha.

O processo de devastação foi sendo acentuado ao longo dos anos, com as numerosas ocupações que Trin-dade passou a receber. Por volta de 1722, a ilha chegou a sediar um entreposto inglês para venda de escravos. Em 1775, o conhecido capitão inglês James Cook aportou na ilha e descreveu um cenário de árvores mortas e solo desprovido de vegetação. A ocupação inglesa fez com que a ilha tivesse uma população de 150 pessoas entre os anos de 1781 a 1782. Depois, os portugueses toma-ram o território a partir de 1783 e lá introduziram uma população que chegou a 200 habitantes e mais animais domésticos, como gado bovino, ovelhas, canários, gatos e os indefectíveis camundongos, até hoje uma das prin-cipais ameaças ao ecossistema de Trindade. Em 1895, os ingleses, visando manter uma posição estratégica no Atlântico Sul, fizeram a última tentativa de tomar a Ilha de Trindade do Brasil, que a essa altura já era uma ex--colônia portuguesa. Com o apoio de Portugal, a ilha foi novamente reintegrada ao território brasileiro em 1897. Trindade chegou ainda a receber açorianos (que foram

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embora após constatar que o solo da ilha não era pro-pício à agricultura) e chegou a sediar um presídio já no século XX, na década de 1920.

A ocupação definitiva veio só em 1957, quando a Marinha do Brasil estabeleceu ali o Poit 6 , uma base militar onde vivem 30 pessoas e reúne ainda um centro de pesquisas, que abriga cientistas que fazem incursões à ilha para estudar temas como botânica, geologia e me-teorologia. Com a ocupação definitiva pela Marinha, foram tomadas as primeiras ações no sentido de se re-verter a perda do ecossistema natural de Trindade: as populações de ovelhas, mulas e porcos foram erradica-das em 1965, os gatos e as galinhas-de-Angola em 1989 e, finalmente, um corpo de fuzileiros navais exterminou as cabras em 2005, após uma “guerra aos caprinos” que durou mais de dez anos. A ilha chegou a ter mais de 800 cabras – e foi preciso até entrar em ação militares habili-tados em alpinismo para escalar as montanhas e tirar as cabras do topo da ilha.

“Por volta de 1700, quando o astrônomo Halley aportou na Ilha de Trindade, 85% da superfície da ilha era coberta por florestas. Em 1994, quando fui lá pela primeira vez, não restavam mais de 5%”, afirma o bió-logo PhD Ruy Válka, professor do Departamento de Bo-tânica do Museu Nacional. Válka é um dos principais pesquisadores envolvidos no atual projeto de revegetação da ilha, que começou em 1998 pelo Ibama e retomado em 2010, com novas pesquisas, e agora ganha novo fôlego graças à parceria com a SOS Mata Atlântica e a Marinha do Brasil. “A erradicação desses animais, especialmente as cabras, proporcionou uma recuperação da vegetação como nunca havíamos visto antes”, descreve Válka.

Válka é um apaixonado por Trindade e um discí-pulo do naturalista Johann Becker, do Museu Nacional, que em 1957 encontrou o último exemplar vivo da ár-vore saguaraji-vermelho (Colubrina glandulosa), espécie endêmica da ilha cuja madeira vermelha e rígida muito se assemelha à do pau-brasil. Na época, Becker coletou

6 Posto Oceanográfico da Ilha de Trindade.

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material fértil da árvore, o que possibilitou a criação de um banco de sementes no Museu Nacional – que está fornecendo material para a revegetação da ilha desde 1998, quando começaram a ser introduzidas as primeiras mudas do saguaraji-vermelho. “Já é possível encontrar na ilha exemplares de Colubrina glandulosa com até 10 metros de altura. Essas árvores que prosperaram conti-nuam alimentando nossos viveiros de mudas”, alegra-se Válka. Ele afirma que a recomposição será realizada com um “elenco original” de sete espécies endêmicas de Trin-dade conhecidas pela ciência.

À medida que as árvores crescem, reduzem os pro-blemas de erosão do solo na ilha, que possui várias vo-çorocas, causadas pelo impacto das chuvas no solo ainda pobre de vegetação. A falta de proteção do solo faz ainda com que os sedimentos sejam carreados para o mar, o que ameaça a sobrevivência dos recifes de corais, que ficam literalmente sufocados pela poeira e terra em suspensão. “O ciclo ecológico que garante a vida em Trindade está

O biólogo Ruy Válka (centro) com pesquisadores na Ilha de Trindade.

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PERFIL: Ruy Válka

O profundo conhecedor de Trindade

É praticamente impossível dissociar a Ilha de Trindade do nome do professor Ruy Válka, do Museu Nacional. O

PhD em botânica é o principal nome por trás do projeto de restauração da vegetação da ilha e conhece como a palma de sua mão seus 13,5 km² de extensão da ilha.

Válka já esteve presente em 14 missões à ilha. A primeira vez foi em 1994, quando recebeu autorização da Marinha e passou dois meses na ilha junto com o naturalista Johann Becker, seu professor no Museu Nacional e considerado o maior estudioso de Trindade. Com ele, Válka coletou sementes, aprendeu a identicar as espécies endêmicas e escreveu um relatório, entregue à Marinha em 1995, onde rearmava a importância de exterminar os animais invasores para fazer com que o projeto de recuperação ambiental de Trindade fosse bem-sucedido.

Discípulo de Becker, que faleceu em 2004, Válka tomou para si a missão de dar continuidade às pesquisas realizadas desde a década de 1950 pelo naturalista. Em média, a cada dois meses viaja à Trindade para estudar as espécies e colocar em prática o plano de revegetação, sobre o qual é bastante otimista. “Trindade tem futuro. A recuperação da ilha tem sido mais rápida do que esperávamos”, diz o pesquisador.

Mas ele não gosta de falar de si. Prefere ressaltar que há dez pesquisadores do Museu Nacional envolvidos com o projeto de Trindade e que a recuperação ambiental da ilha não só é ecologicamente viável, mas também estratégica para o país. “Como sexta economia do mundo que nos tornamos, é importante que a principal base militar no Atlântico Sul seja ambientalmente responsável”, diz Válka. No que depender da SOS Mata Atlântica e dos parceiros envolvidos no projeto de recuperação ambiental de Trindade, isso é só uma questão de tempo.

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novamente se fortalecendo. A água que passava pela terra em alta velocidade levava para o mar os sedimentos que acabavam sufocando os corais. Com a vegetação voltan-do, há menos sedimentos, os corais correm menos risco de morrer, há mais peixes e mais aves”, afirma o capitão Camilo Souza, da Secirm. Outra vantagem do crescimen-to da vegetação nativa é assegurar um local seguro para as aves que nidificam em Trindade, como atobás e fraga-tas – há duas subespécies de fragatas endêmicas do local e hoje ameaçadas de extinção.

O desafio de tornar a Ilha de Trindade tão exube-rante como era antes da chegada dos navegadores ainda depende da erradicação dos camundongos, que infestam a ilha e são responsáveis pela mortandade dos filhotes das aves marinhas como as fragatas. O Museu Nacional e a Marinha do Brasil estão estudando mecanismos de erra-dicação desses animais, como o uso de substâncias an-ticoagulantes, que não coloquem em risco a sobrevivên-cia de outras espécies da fauna que vivem no local. “Os roedores são uma ameaça real e sua eliminação é ponto crucial para o sucesso do reflorestamento de Trindade”, diz Válka. Segundo o pesquisador, os roedores são res-ponsáveis por até 60% de todas as extinções de aves em ilhas, além de impedirem a regeneração dos bosques.

Abrolhos: parceria em prol da maior biodiversidade do Atlântico Sul

Depois da experiência bem-sucedida da criação de fundos de conservação voltados para o fortalecimento de UCs, como foi o caso do Atol das Rocas, um novo e importante passo da SOS Mata Atlântica será estruturar um fundo voltado para a região do Banco de Abrolhos, o maior complexo de recifes de corais do Atlântico Sul.

Esse projeto é capitaneado pela CI-Brasil 7 , cujo diretor do Programa Marinho é o biólogo Guilherme Dutra, grande especialista no tema. Com a CI-Brasil, a Fundação estabeleceu uma Aliança para a Conserva-

7 Conservação Internacional.

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ção dos Ambientes Marinhos e Costeiros Associados à Mata Atlântica. A união de forças de duas das principais ONGs ambientalistas que atuam no Brasil foi lançada oficialmente em 2008, mas coroa mais de 11 anos de pro-jetos comuns realizados pelas duas entidades – como a realização de pesquisas e levantamento de dados sobre ecossistemas marinhos e cursos de formação em pesquisa aplicada à conservação.

A escolha de Abrolhos, localizada entre o sul da Bahia e o norte do Espírito Santo, não veio à toa. O banco de Abrolhos abrange uma área de 5,6 milhões de hectares e é formado por um verdadeiro mosaico de ecossistemas como recifes de corais, praias arenosas, ilhas vulcânicas, manguezais, restingas e remanescentes continentais de Mata Atlântica. Essa riqueza de ambientes faz com que a região apresente a maior biodiversidade marinha do Atlântico Sul: mais de 265 espécies de peixes são encon-tradas nas águas de Abrolhos. O local é também refúgio reprodutivo para as principais espécies de tartarugas ma-

Camarão de anêmona (Periclimenes sp.) nos recifes de Abrolhos.

© Luciano Candisani

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rinhas que ocorrem no Brasil: a tartaruga-verde (Chelonia mydas), a tartaruga-de-pente (Eretmochelys imbricata) e a tartaruga-cabeçuda (Caretta caretta). De julho a novem-bro, Abrolhos abre espaço para o espetáculo da chegada da baleia jubarte, que nada 4 mil km da Antártica até o Sul da Bahia para acasalar e dar à luz seus filhotes. Só no ano passado, 7 mil baleias jubartes nadaram até a costa brasileira, um número considerado recorde.

E quando o assunto são os recifes de corais, Abro-lhos faz um gol de placa. Na costa brasileira, os recifes estão distribuídos por mais de 3.000 quilômetros do lito-ral do Nordeste, mas é justamente em Abrolhos que está concentrada a maior quantidade e diversidade desses ani-mais – há inclusive espécies endêmicas como o belíssimo coral-cérebro (Mussismilia brasilienses). Os recifes de co-rais de Abrolhos fornecem abrigo e alimento para peixes e crustáceos e são responsáveis por permitir a subsistência de cerca de 20 mil pescadores artesanais só na Bahia.

Dada a sua importância ecológica, Abrolhos está em território protegido desde 1983, quando foi criado o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, que compreen-de uma área de 88 mil hectares. Em 2000, a região ga-nhou outra área protegida: a Resex 8 Corumbau, com uma área de 89,5 mil hectares entre os municípios de Pra-do e Porto Seguro, na Bahia – a primeira reserva extra-tivista criada em uma área de recifes de corais. Subindo em direção ao norte, chega-se à Resex Canavieiras, outra unidade de conservação, criada em 2006 com uma área de 100 mil hectares e abrangendo uma importante área de manguezais. Os esforços para conservação de Abro-lhos resultaram ainda na criação, em 2009, da Resex de Cassurubá, também com 100 mil hectares. Juntas, as três reservas extrativistas garantem sustento a 3.000 famílias de pescadores artesanais e marisqueiros.

Apesar dos avanços na criação de áreas protegi-das nos últimos anos, o Banco de Abrolhos convive com diversas ameaças, como a pesca ilegal, o turismo desor-denado, a poluição e a proximidade com blocos de ex-

8 Reserva Extrativista.

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ploração de petróleo. Além disso, a gestão dessas UCs ainda carece de reforço institucional – e é esse ponto que o Fundo de Conservação Abrolhos buscará fortalecer. O plano é garantir o cumprimento dos planos de manejo das UCs, avançar na agenda de proteção e uso sustentá-vel da biodiversidade e no estímulo ao desenvolvimento de negócios sustentáveis na região.

Isso é ainda mais importante porque não obstante as ameaças aos ecossistemas, o governo federal adiou o projeto de ampliação do Parque Nacional de Abrolhos, que passaria dos atuais 88 mil hectares para 890 mil hec-tares. A proposta, formulada pelo ICMBio, previa ainda a criação de outras três UCs: um refúgio de vida silvestre (Revis) para as baleias jubartes, a Reserva de Desenvolvi-mento Sustentável (RDS) da Foz do Rio Doce, no litoral norte do Espírito Santo, e uma Área de Proteção Am-biental (APA) no entorno do Parque Nacional. No en-tanto, divergências ocorridas entre os participantes das audiências públicas para discussão do projeto fizeram o governo engavetar, ainda que temporariamente, uma de-cisão sobre a ampliação e criação das UCs em Abrolhos.

“O governo perdeu a chance de ampliar, durante a Rio+20, o Parque Nacional Marinho dos Abrolhos, que se tornaria a maior área protegida do mundo. Como isso não saiu do papel, é importante que se fortaleça as áreas protegidas já existentes”, diz Leandra Gonçalves, ex-coor-denadora, atual consultora da SOS Atlântica.

As duas organizações trabalham no desenvolvi-mento de uma campanha e envidam esforços para buscar recursos financeiros para apoiar todo conjunto de UCs da região, o Complexo de Abrolhos.

Fazendo pressão: por um Congresso a favor do mar

No início de 2011, a SOS Mata Atlântica recebeu uma doação não identificada, no valor de US$ 2 milhões, de uma americana. A doadora não quis revelar seu nome, apenas informou que seu pai tinha negócios no Brasil e

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queria doar o recurso para uma instituição de proteção do meio ambiente. Após diversas deliberações, ficou de-cidido que esse recurso seria usado de uma forma com-pletamente inédita: cerca de 80% foi destinado para um fundo de perpetuidade e outra parte destinada ao forta-lecimento de ações políticas voltadas para o mar, como o desenvolvimento de estudos estratégicos, elaboração de marcos regulatórios e propostas de lei, e atividades de um Grupo de Trabalho voltado para o tema na Frente Parla-mentar Ambientalista, para contribuir ao fortalecimento das iniciativas de proteção e sustentabilidade dos ecossis-temas marinho e costeiro. Nas palavras do presidente da SOS Mata Atlântica, Roberto Klabin, “é preciso estar per-to dos políticos e contribuir para que a sociedade acorde para a importância de proteger o mar. Essa será uma das grandes estratégias da SOSMA para os próximos anos”.

A estratégia, segundo Klabin, é que a atividade em prol do mar e dos ecossistemas marinhos e costeiros cresça exponencialmente na organização. “A SOS Mata Atlânti-

Baleia jubarte e �lhote em Abrolhos.

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ca continuará fazendo o que faz pelas florestas. Mas o mar será um braço especial de nossa atuação. Afinal, o nosso verde também depende do azul”, define Klabin.

O plano consiste em levar a pauta marinha para ser discutida no Congresso Nacional. “Vamos contri-buir nas discussões e nas políticas de conservação ma-rinha na Frente Parlamentar Ambientalista e nos esfor-ços das ONGs e instituições que atuam nesse tema”, afirma Mario Mantovani, diretor de políticas da SOS Mata Atlântica.

Há muito trabalho pela frente. Ampliar as áreas protegidas marinhas dos atuais 1,57% para pelo menos 10%, como prevê a Convenção de Biodiversidade de Nagoya, é só um dos objetivos. Reverter o pensamento utilitarista dominante sobre o mar – visto predominante-mente como um local de lazer e de exploração econômi-ca – é outra tarefa hercúlea. “Mas não estamos sozinhos e esperamos poder envolver mais e mais pessoas e insti-tuições para um grande movimento em prol da proteção e da sustentabilidade dessas regiões”, completa Mario.

Farol no Parque Nacional Marinho de Abrolhos.

© Clayton Lino

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Gol�nhos no caminho entre Fernando de Noronha e o Atol das Rocas. © Mario Haberfeld/Wild Soul

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Impressão e AcabamentoGráfica Ipsis

Tiragem2 mil exemplares

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