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ARQUIVO DA TAG: ALBERT CAMUS 01/02/2015 “Uma breve história (filosófica) da felicidade” no Glück Project (com Camus, Giannetti, ComteSponville, Epicuro, Vicente de Carvalho etc…) “Se deveras existe um pecado contra a vida, talvez não seja tanto o de desesperar com ela, mas o de esperar por outra vida, furtandose assim à implacável grandeza desta.” ALBERT CAMUS, Núpcias

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    ARQUIVODATAG:ALBERTCAMUS

    01/02/2015

    Umabrevehistria(filosfica)dafelicidadenoGlckProject(comCamus,Giannetti,ComteSponville,Epicuro,VicentedeCarvalhoetc)

    Sedeverasexisteumpecadocontraavida,talveznosejatantoodedesesperarcomela,

    masodeesperarporoutravida,furtandoseassimimplacvelgrandezadesta.

    ALBERTCAMUS,Npcias

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    OriginalmentepublicadonoGlckProject

    ODIREITOINALIENVELDECAARAVIDAFELIZ

    Nosososfilsofosqueestosempreemseuencalo.caadefelicidade vamos todos, embriagados pelo sonho e impelidos pelocorao(quetemrazesqueaprpriarazodesconhece,comodiziaPascal).Afelicidadesemprefoiecontinuasendoumgrandefim,senoafinalidadesuprema,emnomedoqualsejustificamescolhasnavida pblica e privada escreve Eduardo Giannetti (Felicidade, CiadasLetras,p.68).

    Dizer que a felicidade a finalidade suprema, oniperseguida, deixasubentendido que os meios escolhidos para atingir este fim podemserfracassados,ineficazes,desastrosos.Talvezparaserfelizmesmoagente tenhaque insistir e persistir na infelicidade, tropeandonospercalosdequeoscaminhosdoviverestorepletoseaprendendocomasferidaseostombos?

    Dpradizerquenohsociedade,contemporneaouhistrica,ondea busca da felicidade inexista ela perseguida em toda parte,deveras,mas em diferentes pocas e contextos socioambientais vaiadquirindo mltiplas faces. Ademais, adquire sentidos os maisdiversos e contraditrios em diferentes bocas: Santo Agostinho, emsua poca, contava nomenos que 289 opinies diferentes sobre otemaehojeemdiaomercadoeditorialregistraumaenlouquecedoraquantidade de tratados filosficos, livros de autoajuda, sermes degurus,emumaBabeldediferentesreceitasparaatingirabeatitude.

    Da felicidade, podese dizer que a universalmente perseguida, sepelo termo universal entendermos no uniformidade,homogeneidade emonotonia,mas presena em todas as latitudes elongitudes. Tanto indivduos quanto sociedades esto sob o encantodesta busca pela melhor vida e os problemas da tica no estolimitadosaos filsofosmasdizemrespeitoa todomundoequalquerum.

    Um bom exemplo da ampla gama de diversas manifestaeshistricas da perseguio felicidade a Europa quando o zeitgeistda Idade Mdia foi revolucionado pelo Iluminismo. Neste pontodemutao, escancararamse duas visesdemundo antagnicas sobreaquilo que a Declarao de Independncia dos EUA (1776) declaraentoserumdireitohumano inalienvel: thepursuitofhappiness.Aperseguida tornaseentoumdireitodocidado,a ser respeitado

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    pelas repblicas democrticas, nada menos que um pilar da plis.Consideramos estas verdades como autoevidentes: que todos oshomens so criados iguais, que so dotados pelo Criador de certosdireitos inalienveis, queentre estes sovida, liberdadeebuscadafelicidade

    FELICIDADE:UMPRATOQUESECOMESQUANDOMORTO?

    Na Idade Mdia, a histria era outra: a Cristandade medievalacreditavanapecaminosidadedaperseguioaosprazeresealegriasmundanos solicitavase do rebanho de fiis que carregasse suaprpria cruz pelo vale de lgrimas da Terra e que deixasse paradepois da morte o gozo de uma paradisaca felicidade. A tradiojudaicocrist,deseusprimrdiosathojeemdia,tendeaprometeraosaflitosumabemaventuranadoalmtmulo,entronandoafeaesperanacomovirtudesteologais.

    Em radical contraste, a viso de mundo que associamos aoIluminismo e Revoluo Francesa (e tambm Independncia dosEUA),temavercomumamarmontantedesecularismo,decrticacontra as monarquias absolutistas e os pilares teocrticos que assustentavam. Na Frana, figuras como Voltaire, Diderot e Holbachergueram suas vozes, com lbia afiadssima, para denunciar comofarsa a promessa de um paraso transcendente e criticar comoengodo as pregaes do ascetismo judaicocristo, que mandavamaceraretorturaracarneparamelhorliberaroalma.

    Neste pontodemutao, quando a Cristandade Medieval, em suadecadncia,vaicedendolugaraospoucosaosavanosdaluzqueosEsclarecidos traziam acesa em suas tochas, a felicidade tornaseexigncia de algo a ser vivido aquieagora, nesta vida, antes damorte e no mais depois dela. Em seu livro A Euforia Perptua Ensaio sobre o Dever de Felicidade, Pascal Bruckner pondera que ocristianismo no negava a aspirao humana felicidade, mascolocavaaforadealcance,sejanodendeantesdaQueda,sejanofuturo Reino dos Cus, prometido aos fiis. O sculo XVIII iria secontentaremrepatrila,trazendoaaquiparabaixo.(Bruckner,pg.22) De objeto de nostalgia e esperana, a felicidade tornase agoraumimperativodopresente.

    ComoapontaEduardoGiannetti,osculoXVIIIdeslocariaoponteiroda confiana no progresso e no aumento da felicidade humana aolongodotempoatopontomaisextremodequesetemnotcianosanaisdahistriaintelectual.()Naauroradopensamentomoderno,

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    data:text/htmlcharset=utf8,%3Cheader%20class%3D%22pageheader%22%20style%3D%22display%3A%20block%3B%20lineheight%3A%2022px% 4/12

    sob o efeito inebriante da tripla revoluo (cientfica, industrial efrancesa),acrenanoprogressofoiaoscus.Aequaofundamentaldo iluminismo europeu pressupunha a existncia de uma espcie deharmonia preestabelecida entre o progresso da civilizao e oaumentodafelicidade.(Giannetti,pg.22)

    As ideologias religiosasmonotestas, em especial judaicas e crists,diziamqueafelicidadeeraumpratoqueagentescomemorto,umbanqueteaquestemacessooespritodepoisdeliberadodocorpoj o iluminismo instaurou outro regime, uma espcie de terraprometida da razo secular (Giannetti, pg. 26), que pretendiaconduzir humanidade felicidade em vida atravs do progressomaterial,dadominaoamplaeirrestritadanatureza.

    Aideiareligiosadequeafelicidadeumpratoquessecomemortosofreusoboimpactodesaraivadadecrticas(nosdosiluministas,mas tambm de figuras posteriores como Ludwig Feuerbach e KarlMarx),demodoqueessascrenascaememprogressivodescrdito,apontodeNietzsche,nasegundametadedosc.XIX,diagnosticarnaEuropaos sintomasda mortedeDeuseapontaranecessidadedeuma transvalorao dos valores que tornasse o ideal asctico,enfim,umitemdemuseu.

    Mastambmoideal iluministaamplamentecriticadopordar livrecurso a certos impulsos e fantasias dos homens, especialmente nocampo das aspiraes de ganho monetrio e consumo materialrepresentaumaapostamonumental na conquistada felicidadepelacrescente, violenta e sistemtica subjugao do mundo natural aospropsitosecaprichoshumanos.()Dessemodopoderamosrecriarpeloengenhoesagacidadeumnovo jardimdasdelcias,umparasotecnolgico de turbinas, robs, viagras e disneylndias no qual ohomemsefariaumdeussobreaterraVejamnoquedeubrincardeaprendiz de feiticeiro na manipulao do meio ambiente e noconsumo pantagrulico de recursos naturais. A ameaa de umacatstrofe ecolgica no deixa de ser um espantoso paradoxo destacivilizaoquefezdaracionalidadeedoprogressososseusgrandesprincpiosunificadores.(Giannetti,3940)

    No sculo XX, mesmo aps duas guerras mundiais, mesmo apsbombasatmicasecamposdeextermnio,prosseguiuseperseguindoafelicidade,aindaqueporoutrasvias:algunsdosmovimentosmaisimportantes da contracultura dos anos 1950 e 1960, por exemplo,buscavaminspiraonomisticismooriental(zenbudismo,hindusmo,harekrishna), reavivavam um hedonismo de sabor dionisaco

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    (evocandooesprito livrenietzschiano), lanamsepolticasobainflunciademaostas,BlackPantherseChesNosgrandeslevantesda juventude dos anos 60, sob a influncia de Marcuse e Debord(dentre outros), as ruas e os festivais ousavam demandar: que ossacerdotes no venham mais nos pregar que somos pecadores sporque exigimos gozar sem entraves, como se reivindicava emMaio de 68, e que os poderes tirnicos cessassem de perseguir episoteartodosaquelesque,maneiradebeatniksehippies,cantamedanamemWoodstocksemlouvorpaz,aoamor,justiaprajenopradepois!

    OLABIRINTODAESPERANAEDOTEMOR

    Felicidade

    Saleveesperana,emtodaavida,Disfaraapenadeviver,maisnada:Nemmaisaexistncia,resumida,

    Queumagrandeesperanamalograda.

    Oeternosonhodaalmadesterrada,Sonhoqueatrazansiosaeembevecida,

    umahorafeliz,sempreadiadaEquenocheganuncaemtodaavida.

    Essafelicidadequesupomos,rvoremilagrosa,quesonhamos

    Todaarreadadedouradospomos,

    Existe,sim:masnsnoaalcanamosPorqueestsempreapenasondeapomos

    Enuncaapomosondensestamos.

    VicentedeCarvalho

    A recorrncia, na linguagem, de termos como perseguio dafelicidade[pursuitofhappiness]umndicedafrequnciacomqueafelicidadenosescapa.(O filmeestreladoporWillSmith,baseadonolivrodeChrisGardner,umasagadavidarealquepretende ilustrarnossobreocaminhoquelevadamisriaaoluxo,dapobrezaWallStreet,nochamasejustamenteABuscaPelaFelicidade[ThePursuitofHappyness]?)

    Perseguidasemprepoisraramentepossuda,elasparececonceder

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    nos pequenas fatias de tempo feliz, mas nunca a felicidadeduradoura. No somos poucos aqueles que contam os dias felizescomominoritrios,naquantidadetotaldediasqueenglobaumavidademortalcomoanossa.Nosomospoucosaquelesqueconsideramque somais comuns e frequentes aqueles dias emquepadecemossob o sofrimento, oprimidos por trabalhos estafantes e norecompensadores, tolhidos por temores e melancolias, incertosquantoaofuturo, insatisfeitosnoamorecegosquantosignificaoltimade tudoemespecialdanossa funoe sentidono conjuntocsmicocompleto.

    Hfilsofosquejuramquevochegaraotmulosemteremdeixadopor um nico dia de ter corao emente afligidos por alguma dor,algumaculpa,algumapreocupao,algumaangstiaDavida, tudoo que se pode dizer que nela misturamse e mesclamse, naimanncia concretado fluxo csmico, os afetos alegres eos tristes,os prazeres e as dores, os xtases e as depresses, tudo junto emisturado numa coisa s. Comear a compreender omundo nestestermosdaraquelepassoque,segundoNietzsche,essencialparaque a filosofia siga avante: ir alm do Bem e do Mal, cindidos emdomniosseparados.

    Seperseguirmosumafelicidadequefossesalegrias,umacondiopurgada de todos os afetos tristes, um xtase duradouro e semdesdouro,corremosoriscodeestarmosperseguindoumaquimera.Einfelizes justamente pois perseguimos o que no existe. s vezes oabismo que nos separa da felicidade cavado por ns mesmos:imaginamosalgodequimricoeirrealizvelcujaausnciacontinuadanosdilacera.Talvezconvenha,pois,distinguirentreafelicidadecomovivncia/experincia e como ideal/quimera. A felicidade vivida emcarneeosso,eafelicidademeramentesonhadaeperseguida.

    O filsofo francsAndrComteSponville temvastaobradedicadaanos esclarecer sobre este problema: em sua obraO Mito de caro,composta por Tratado do Desespero e da Beatitude eViver, realizaumacrticafilosficamagistraldaesperana,queconsideraumafetotriste, fruto da impotncia e da ignorncia, sempre geradora detemores e inquietudes. A esperana como uma idealizao daausnciaquenosimpededeamarorealemsuapresena.Quandoafelicidadeapenasumaesperana,enoumavivncia,estamosnainfelicidadequandoa felicidadeapenasesperamos, sentados comabunda no sof, ao invs de agir e amar no sentido de inventla,estamosnainfelicidade.

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    DacaixadePandora,naqualfervilhavamosmalesdahumanidade,osgregosfizeramsairaesperanaemltimolugar,porconsiderlao mais terrvel de todos. No conheo smbolo algum maisemocionantedoqueeste,escreveAlbertCamusemNpcias.

    A esperana, para Andr ComteSponville, apenas uma dasmodalidades do desejo e justamente o desejo como falta, comoPlato o definia, ou o desejo como sofrimento, para falar comoSchopenhauer e Buda. O que a esperana? um desejo que serefere ao que no temos (uma falta), que ignoramos se foi ou sersatisfeito, enfim cuja satisfao no depende de ns (Felicidade,Desesperadamente, p. 58). Donde a definio clssica e sinttica:esperardesejarsemgozar,semsaber,sempoder.

    S esperamos o que no temos, e por isso mesmo somos tantomenos felizes quando mais esperamos ser felizes. Estamosconstantementeseparadosdafelicidadepelaprpriaesperanaqueabusca.Apartir domomentoemqueesperamosa felicidade (Comoeu seria feliz se), no podemos escapar da decepo o queWoody Allen resume numa frmula: Como eu seria feliz se fossefeliz!(Felicidade,Desesperadamente,p.37).

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    LembremsedoquedizacanodeGeraldoVandr,PraNoDizerQue No Falei de Flores: Quem sabe faz a hora, no esperaacontecer.Poisquemsabeepode,agequemignoraenopodequeesperae reza.Quemesperanogoza: temee sofre.Apalavraesperana,quecarregaaesperaemseuventre,indicaosuficienteoerroemqueincorremosquandoesperamosserfelizes.Afelicidadeno questo de espera,mas sim de ao, criao, inveno. Novemde graa, demo beijada,mas precisa ser construda e tem

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    quemdigaquenoconstruopassveldesererguidaass.Dondea importncia fundamental do amor e da amizade: impossvel serfelizsozinho.

    Osbio,pois,noesperanada:vivenopresente, impulsionadopelafora alegre de seu desejo, preferindo sempre a ao espera, ainterveno ativa reza, o amor carncia, sem temores nemdesencantos.ComosintetizaSponville:

    Comoesperardesejarsemsaber,sempoder,semgozar,osbionoesperanada.Noqueele saiba tudo (ningumsabe tudo),nemquepossatudo(elenoDeus),nemmesmoqueelesejasprazer(osbio,comoqualquerum,podeterumadordedente),masporqueelecessoudedesejaroutracoisaalmdoquesabe,oudoquepode,oudoquegoza.Elenodesejamaisqueoreal,dequefazparte,eesse desejo, sempre satisfeito j que o real, por definio, nuncafalta: o real nunca est ausente , esse desejo pois, sempresatisfeito, ento uma alegria plena, que no carece de nada. oquesechamafelicidade.tambmoquesechamaamor.(F.D.,p.76)

    A receita para a infelicidade justamente sonhar uma vidaradicalmente diferente do que aquela que realmente vivemos. Osinfelizes no cessam de projetar no futuro uma utopia pessoal queinsatisfaz com o presente que se tem o real que nunca est altura do sonho. Por exemplo: aquele que sonha em ganhar 100milhesnamegasena,etemesperanadequeissorepresentariaumencontromarcado com a felicidade perptua, no estaria na iluso,apostando suas fichas em algo de improvvel, condenandose frustrao perene dos perdedores crnicos na loteria? Ao invs dalargartudonasmosdasorte,noseriamelhorarregaarosbraosepsmosobraparaaconstruoeinvenodafelicidade,aindaquesobrestriesoramentrias?

    OSTESOUROSDEDENTRO

    Eisumadascontrovrsiasqueopeospensadoresquandootemaafelicidade:aintensidadedanfasequedeveserdadaaoselementosditos exteriores ou objetivos na determinao concreta de umbemestar subjetivo durvel. O prncipe Sidarta Gautama, bemsabido, abandonou o luxo do palcio e todos os confortos da vidaprincipesca,optandocomospsporumaexistnciadebuscadordesabedoria, nmade e frugal, que declara atravs de sua atitude queas riquezas exteriores importam bem menos quase nada! em

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    comparaoaostesourosdedentro.

    A atitude do Buda simboliza a muito comum recomendao dedesprendimento e desapego, como se feliz fosse aquele que sabedesprenderse dos vnculos entristecedores e dos desejosinsuportveis (pois insaciveis) de glria, riqueza e poder. Sob onomedeascetismoessefenmenoque,comoNietzschebemviu,comumamuitoscredosreligiosos,etranscendemesmoodomniodas religies, institudas ou msticas, deixando sua marca indelveltambm em algumas filosofias pretensamente seculares(Schopenhauer, Cioran) podemos abarcar as doutrinas quedesprezamas exterioridades.Digamos,esquematicamente,quehumarixaentreascticosversussensualistas.

    Um dos elementos mais interessantes no budismo seu pontodepartida: o sofrimento, indubitavelmente real e concreto, que acondio humana comporta, e isso pelo simples fato de sermosmortais e passveis de adoecimento, inapelavelmente destinados tumba, seja pela via do envelhecimento ou pela precoce doena ouacidente fatal.Adoutrinabdicanasceparaserremdioparamalesconcretos Buda fisiologista e psicoterapeuta! que serve comocaminho a ser percorrido no processo de superao da ignornciasamsrica.Umateraputicadavontade,pois, renovadorados fluxosenergticoexistenciais.

    A proposta bdica vencer a tirania dos desejos brutos e cegos,fazendocomquereinesobreelesumasbiaconscincianirvnica.Opontodepartidadabuscabdicaadescobertadadordeexistireavontade de viver menos mal: desta base de angstia, poderamosdizer, nasce a rvore Bodhi. A semente da rvore debaixo da qualSidartaatingea Iluminaoprecisou,paragerminareerguerseemgalhos, folhas, frutos e flores, do influxo indispensvel de esterco,chuva,minhocaselgrimas

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    data:text/htmlcharset=utf8,%3Cheader%20class%3D%22pageheader%22%20style%3D%22display%3A%20block%3B%20lineheight%3A%2022px 10/12

    EmfigurascomoThoreau,GandhiePepeMujicaencontramosoelogiode uma unio entre sabedoria e frugalidade, que tambmfundamentalnobudismo:maisvaleumacabanademadeirasbeirasdo lago de Walden, habitada por um sbio escritor, do que umamanso luxuosa em metrpolis poluda e cheia de apartheids,habitadaporummilionrioignoramus.

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    A riqueza, claro, permite gozar de certos prazeres sensveisrefinados (vinhos caros, carros de luxo, viagens a ilhas tropicais debeleza exuberante, o que seja), mas nunca se pode afirmar comcerteza que o bilionrio mais feliz que o pobreto h prncipes ereisquesesuicidamouagemcomopsicopatashomicidas(aspginasde Shakespeare esto deles repletas), e h mendigos e ciganosdespossudos, iluminados,queparecemabenoadosporuma intensaalegriadeviver.

    OIluminado,porm,umararidadeestatsticaamultitudevasta,ignara e sofrente. Para citar Eduardo Giannetti, no raro que agentesintaqueaconscinciapesa.Emcasosextremos,otormentodavidacientedesiadquiretal foraqueoanimalhumanorefleteecontemplacomamarganostalgiaaperdadesuainocnciaanimal.Oque nos aconteceu? De onde a sina de um viver cindido e aflito,expectante do inalcanvel e mngua de explicaes? (Felicidade,pg.143)

    Se no gera grande controvrsia afirmar que a felicidade afinalidadesupremaqueindivduosecoletividadesperseguem,acoisamudaquandosaltamosparaaconclusodequeodinheiroomeiosupremo para alcanla. Neste ponto, multiplicamse aqueles queafirmam, por experincia ou raciocnio, que dinheiro no comprafelicidade (ainda que te leve para sofrer em Paris). A cano deMcCartney sintetiza bem o argumento: money cant buy me love.Apesar das lorotas dos publicitrios, preciso sublinhar que afelicidade no um item venda em shopping centers esupermercados.

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    Para conquistar a felicidade, que ele concebia como tranquilidade

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    (eutymia), Sneca recomendava a parcimnia, a frugalidade, umavida retirada, uma cama que no seja adornada de modoexagerado, roupasquesejamcaseirasebaratas, comidacomumquesejaencontradaemqualquerlugar,quenosejapesadanemaobolso nem ao corpo (Da Tranquilidade da Alma, L&PM, p. 3637) em suma, recomenda que no vivamos uma vida de atribuladasperseguiesaoouro,aopoder, fama,atudoaquiloqueacendeainveja alheia e provocadistrbiosnaplacidezdaalma. amaneiraesticadeconceberavidafeliz,equetemcertassimilaridadescoma doutrina epicurista da ataraxia, ou pazdeesprito, com algumasdiferenas importantes: Epicuro e seu genial discpulo romanoLucrcio acreditavam que eram tambm essencial felicidade oconvvio fecundo e mutuamente recompensador entre os amigosseletosquefrequentamoJardim.

    Dito isto, podemos apontar ainda que os filsofos podem serdiferenciados em relao valorizao da sociabilidade como meioparaumavidafeliz.Nofaltaramnahistriaaquelesquesupuserampossvel um isolamento bemaventurado, uma feliz autosuficincia,simbolizada pelo faquir hindu que medita, sereno e imperturbvel,quase inteiramentefechadoaocontatohumano.Emcontraposio,oepicurismo,revividonosltimostemposporautorescomoJeanMarieGuyau eMichel Onfray, julga a amizade um elemento indispensvelda vida feliz. Bertrand Russell tambm defendia a necessidade deeliminaroegocentrismo,ofechamentoemsimesmoenaspaixespessoais(ABBAGNANO,DicionriodeFilosofia,p.507).

    Acontrovrsiaope,portanto,osdefensoresdeumcertoascetismoantisocialqueenxergaafelicidadecomobuscaestritamentepessoalqueles que concebemna como inconquistvel quando desvinculadadas relaes intersubjetivas. De um lado, a contemplao solitriabeatfica,deoutro,asdelciasdaalteridadefecunda.

    Ser mesmo preciso escolher, ou podemos surfar entre estes doisplos?

    EduardoCarlideMoraesfilsofoejornalistaecriadordossitesDepredandooOrelhoeACasadeVidro